21 de março é Dia contra a Discriminação Racial

Origem está relacionada ao massacre feito pelas forças do Estado na África do Sul, em Sharpeville
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No Brasil data também marca Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé. Foto: Wikimedia Commons

Dia 21 de março é considerado o Dia Internacional contra a Discriminação Racial devido ao massacre feito pelas forças do Estado na África do Sul, em Sharpeville, província de Gautung, na África do Sul, que deixou 69 pessoas assassinadas e 186 feridas. Veja mais em TVT News.

Reportagem de Girrana Rodrigues

Massacre de Sharpeville, a origem completa 65 anos

O que foi o Massacre de Shaspreville: mais de 20 mil sul africanos foram às ruas contra a Lei do Passe, que exigia que os africanos andassem com uma caderneta com informações como cor, etnia, profissão e até determinava onde eles poderiam ir. Se as pessoas negras não apresentassem o documento, eram presas pelos policiais sul-africanos. A lei funcionava como um dos principais mecanismos de controle do apartheid, uma manifestação da discriminação racial.

O plano era realizar um ato pacífico, sem o documento, para que todos fossem presos e as administrações locais ficassem com problemas por causa do número de pessoas que estariam atrás das grades. Mas, um grupo de policiais decidiu atirar contra os manifestantes, o que levou a morte de 169 e deixou 186 feridos em Sharpeville.

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Policiais agrediram pessoas negras na África do Sul. Foto: Fundação Cultural Palmares/Reprodução

Na época, o Congresso Nacional Africano (CNA) – um partido nascido da aliança entre sindicatos e movimentos – e o Partido Comunista Sul Africana (PSCA) foram proibidos. Após o massacre o CNA e o PSCA passaram a fazer parte da luta armada.

Em 1964, o grande líder do CNA, Congresso Nacional Africano, Nelson Mandela, é preso e condenado à prisão perpétua por sabotagem. Mandela só sai da prisão em 1991 aos 71 anos de idade. E em 1994 se torna o primeiro presidente negro da África do Sul, e pauta a luta contra a discriminação racial no país.


Em em memória às vítimas do massacre, em 1966, a Organização das Nações Unidas
(ONU) proclamou a data como Dia Internacional contra a Discriminação Racial.

Apartheid na África do Sul

O apartheid implementado na África do Sul, teve início em 1948 quando o Novo Partido Nacional ganhou as eleições. Apesar de serem minoria no país, os brancos criaram um regime de segregação racial que impedia, que os negros, que eram 8 milhões de pessoas, uma população quatro vezes maior do que a de brancos, fossem às urnas e transitassem por espaços que eram exclusivos para os brancos.

A discriminação racial era tão grande que até o casamento entre pessoas de diferentes etnias era proibido. As famílias foram separadas: maridos de esposas, mães de filhos. Apesar da violenta repressão, o regime só terminou em 1994.

Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé

No Brasil, desde 2023, a data celebra o Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé instituída por meio de uma lei proposta pelo deputado Vicentinho (PT-SP) e sancionada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

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No Brasil, data também marca Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé. Foto: Maria Eugenia Tita/Wiki Commons

A intenção é valorizar a importante manifestação cultural religiosa que enriquece e fortalece a diversidade de nossa sociedade. A data foi escolhida por dialogar com o marco escolhido pela ONU e estabelecer uma rede intercontinental de conscientização pelo Dia Internacional contra a Discriminação Racial.

No Brasil, o Candomblé já foi considerado crime e a prática da religião chegou a ser impedida. Em 2024, o Disque 100 registrou 2.472 denúncias de casos de intolerância religiosa. As religiões que mais sofreram intolerância foram a Umbanda e o Candomblé. Os números indicam uma alta de 66,8% em relação às denúncias de 2023.

Estado Laico e o terrorismo religioso

O termo terrorismo religioso tem sido utilizado por muitos sacerdotes e, embora para alguns pareça exagerado demonstra exatamente o que tem acontecido nas inúmeras casas de candomblé no território nacional. De norte a sul do país as casas de axé têm sido ameaçadas por vários motivos, um deles parte de locatários evangélicos que não aceitam alugar suas casas para entidades religiosas de matriz africana

Mesmo com o artigo 5º da Constituição Federal que assegura a liberdade de consciência e de crença, garantindo o livre exercício dos cultos religiosos, o processo de demonização que foi forjado pela igreja católica e, em seguida, pelas igrejas neopentecostais fundamentalistas, ainda é hoje o que mais atrapalha a continuidade e uma harmonia entre os dogmas religiosos. 

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21 de março é a junção de duas datas: Dia Internacional da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial e Dia das Religiões de Matriz Africana. Foto: Débora Britto/MZ Conteúdo

O que é o Dia da Consciência Negra

O Dia da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro e é feriado nacional no Brasil desde 2023. O Dia da Consciência Negra é uma data para refletir sobre a luta histórica e atual das negras e dos negros no Brasil contra o racismo, a discriminação e as desigualdades sociais. Instituída para honrar a memória e o legado de Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares, a data é um marco de resistência e resiliência para a população negra, e destaca a importância de valorização das contribuições culturais, sociais e políticas afro-brasileiras.

Por Girrana Rodrigues

Análise

Ajoyemi Osunleye, Presidente do Instituto Casa Herança de Oduduwa, Coordenador Internacional do Word Orisa Congress(NICO), Co fundador da The African Pride, faz relexão sobre a junção dos três acontecimentos: o Massacre de Sharpeville, o Dia Internacional da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial e o Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas.

Uma reflexão sobre a confluência do dia 21 de março: um chamado a toda a diáspora

Neste mesmo dia acontece o calendário em alusão ao Massacre de Sharpeville, o Dia Internacional da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial e o Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé. Cada uma dessas datas, embora distinta em sua essência, entrelaça-se em um tecido de memória e luta que ressoa com a necessidade urgente de justiça e reparação.

Ao recordar o Massacre de Sharpeville, sinto o peso da história, cerca de 70 mortes em uma manifestação pacífica contra o apartheid vigente na época, diante de tropas policiais. Em 1960, a brutalidade policial contra manifestantes pacíficos na África do Sul não foi apenas um ato de repressão; foi um grito de alerta que ecoou pelo mundo, sendo um ponto de virada para uma dura realidade que persistiu há mais de meio século, todavia foram necessários mais 30 anos pós-massacre para que a lei de segregação fosse abolida.

Essa tragédia não deve ser esquecida. Ela nos lembra que a luta contra a opressão e a discriminação é uma batalha que, por muito tempo, tem custado vidas e sonhos. Ao refletir sobre isso, como nigeriano que vive no Brasil, percebo que a luta por direitos iguais transcende fronteiras; é um chamado universal.

O sangue derramado destas vidas resultou em uma agenda oficial da ONU (Organização das Nações Unidas), onde temos a oportunidade de pensar nas ferramentas e estratégias para eliminar a discriminação que perdura internacionalmente, o Dia Internacional da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.

Este dia serve como um lembrete de que a discriminação racial não é um fato do passado, mas uma realidade que continua a afetar milhões de pessoas ao redor do mundo. A luta pela igualdade e pelo respeito à dignidade humana é uma tarefa que devemos abraçar coletivamente. Precisamos ser ousados na nossa defesa da justiça, confrontando preconceitos enraizados e promovendo um diálogo aberto sobre as desigualdades que persistem em nossa sociedade.

Finalmente, no Brasil, especificamente, foi sancionada no ano de 2023 a lei que tornou o 21 de março o Dia das Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé em um país de massiva população negra que carregou com seu próprio corpo a bagagem intelectual e espiritualidade dos povos do continente africano.

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Otunba Biodun Ajiboye (de azul), é Secretário Executivo e CEO do Instituto Nacional de Orientação Cultural (NICO) da Nigéria. Ajoyemi Osunleye (de branco) é Presidente do Instituto Casa Herança de Oduduwa, Coordenador Internacional do Word Orisa Congress(NICO), cofundador da The African Pride. Foto: Divulgação

Aliamos a luta antirracista e pela liberdade religiosa nesta programação. Somos chamados a discutir sobre o direito de existir, sobre o estado laico, a liberdade religiosa: sobre os povos que vieram da África, na forma de escravidão, suas formas de pensamento e organização.

Em um mundo que muitas vezes marginaliza e discrimina, é fundamental valorizar a diversidade religiosa e cultural. As religiões de matriz africana são expressões de resistência e resiliência, e seu reconhecimento é um passo crucial na luta contra a intolerância religiosa. Nesse dia, devemos celebrar não apenas as práticas espirituais, mas também a identidade e a história das comunidades afrodescendentes e o direito ao culto de todos, assegurado no país à luz da constituição cidadã.

A junção dessas três datas no dia 21 de março não é coincidência; é uma oportunidade poderosa para refletirmos sobre as interconexões entre essas temáticas e sua centralidade: a negritude, seja no Brasil, nos países africanos, nos Estados Unidos ou em outra localidade da diáspora. Cada uma dessas questões está entrelaçada com a busca por dignidade da pessoa humana.

Ajoyemi Osunleye é Presidente do Instituto Casa Herança de Oduduwa, Coordenador Internacional do Word Orisa Congress (NICO), cofundador da The African Pride

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