DeepSeek e a rasteira na OpenAI, por Renato Janine Ribeiro

"O impacto do DeepSeek não se restringe ao mercado. Ele representa uma nova fase da disputa tecnológica"
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"Não há motivo para que o Brasil continue apenas como consumidor passivo dessa revolução", afirma Renato Janine Ribeiro, em referência ao DeepSeek. Foto: IA Sensei/Adobe

Por Renato Janine Ribeiro – Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)


A DeepSeek, uma startup chinesa até então pouco conhecida, desafiou as gigantes da tecnologia ao ultrapassar o ChatGPT em downloads nas últimas semanas. O feito gerou um impacto significativo no mercado, resultando em perdas expressivas para as big techs do Vale do Silício e reacendendo a disputa entre Estados Unidos e China pelo domínio da inteligência artificial. A ascensão da DeepSeek ocorreu mesmo sob sanções norte-americanas que restringem o acesso da China a chips avançados. Diante desse cenário, surge a questão: qual o significado desse movimento para o Brasil?

O impacto do DeepSeek não se restringe ao mercado. Ele representa uma nova fase da disputa tecnológica entre Estados Unidos e China, reconfigurando a geopolítica global. O Vale do Silício, acostumado a ditar as regras do jogo, está sentindo na pele a ação do protecionismo norte-americano: a sanção de chips contra Pequim pode ter dado o estímulo que a China precisava para se tornar autossuficiente e, agora, desafiar os gigantes americanos. A DeepSeek conseguiu avançar mesmo com essas restrições, provando que a inovação não depende apenas de acesso irrestrito às melhores unidades de processamento gráfico (GPUs) do mercado, mas também de estratégia e engenhosidade.

Deepseek

A ascensão repentina da IA chinesa é um prenúncio de que os Estados Unidos podem estar perdendo terreno na liderança tecnológica, especialmente sob um cenário de disputas políticas internas e uma gestão errática da regulação tecnológica. Não à toa, figuras como Elon Musk, o Joseph Goebbels de Donald Trump, tentam conter os danos para a indústria americana com um misto de propaganda, negacionismo e lobby agressivo. Mas a verdade é que o mundo está mudando, e não apenas na China.

A lição para o Brasil é clara. Se a China conseguiu romper a barreira das big techs com limitações tecnológicas impostas pelo maior império tecnológico das últimas oito décadas, não há motivo para que o Brasil continue apenas como consumidor passivo dessa revolução. A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, já afirmou que o Brasil pretende “beber da fonte” da DeepSeek, mas essa postura precisa ir além de uma intenção genérica.

O governo Lula e o MCTI têm uma janela de oportunidade rara para investir em inteligência artificial com uma estratégia ousada e pragmática. A DeepSeek mostra que é possível e viável construir modelos eficientes a custos menores. O Brasil pode seguir esse caminho, fortalecendo seus centros de pesquisa, incentivando as startups nacionais e promovendo parcerias internacionais que permitam o desenvolvimento de tecnologias abertas, sem depender de grandes corporações que monopolizam o setor.

A hora de agir é agora. Se o Brasil perder esse momento, será condenado a continuar assistindo às próximas revoluções tecnológicas sem nunca estar entre os protagonistas. A DeepSeek nos mostrou que a criatividade, e não apenas os orçamentos bilionários, é o que define os vencedores da corrida pela inteligência artificial. Cabe ao Brasil decidir se quer estar na vanguarda dessa transformação ou seguir na sombra dos que ditam as regras.

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