ONGs em São Paulo recebem emendas de Tarcísio sem transparência

Entidades beneficiadas por deputados estaduais não divulgam como gastam recursos públicos
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Emendas liberadas por Tarcísio de Freitas teriam beneficiado mais de mil organizações em 2024. Créditos: Governo do Estado de São Paulo

Um levantamento realizado pela Folha de S.Paulo revelou que ONGs e entidades privadas que receberam emendas parlamentares indicadas por deputados estaduais de São Paulo e pagas pelo governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) em 2024 não divulgam à população como utilizam esses recursos.

A falta de transparência ocorre mesmo após o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), ter suspendido repasses federais a 13 organizações por descumprirem exigências de prestação de contas. Veja mais em TVT News.

No total, mais de mil entidades receberam verbas públicas em 2024 por meio de emendas impositivas — escolhidas por deputados e obrigatoriamente repassadas pelo estado. O valor chega a R$ 318 milhões, o equivalente a 38% do total das emendas destinadas a prefeituras, órgãos estaduais e organizações privadas, segundo dados da Secretaria Estadual de Governo, comandada por Gilberto Kassab (PSD).

Folha analisou as 20 instituições mais beneficiadas, que concentraram 22% dos repasses, e constatou que nenhuma delas segue os parâmetros de transparência determinados por Dino. Apesar de a decisão do ministro se referir a emendas federais, especialistas defendem que o mesmo padrão deveria ser aplicado em âmbito estadual.

Falta de transparência

Embora a maioria das entidades possua páginas de transparência em seus sites, apenas três das 20 analisadas informam o total de recursos recebidos de emendas em 2024. O Instituto Paulo Kobayashi, maior beneficiário, recebeu R$ 1 milhão em emendas do deputado Altair Moraes (Republicanos), mas a informação não consta em sua página.

A Confederação Brasileira de Artes Marciais, segunda maior beneficiada, com 5,5 milhões, informou que efetivamente captou R$ 800 mil e tem até 31 de março para prestar contas.

Festival de música Mega Help, promovido pelo Instituto Paulo Kobayashi com R$ 1 milhão em emendas estaduais – @institutopaulokobayashi no Instagram – 21.set.2024

Governo defende processo

Questionado, o governo de Tarcísio afirmou que o processo de repasse de emendas é transparente, mas não comentou a falta de informações nos sites das ONGs. A gestão destacou que as entidades precisam cumprir exigências legais, como apresentar planos de trabalho e prestar contas, auditadas pelo Tribunal de Contas do Estado.

No entanto, especialistas criticam a falta de alinhamento entre as práticas estaduais e as determinações do STF. Élida Graziane, procuradora do Ministério Público de Contas de São Paulo, argumenta que decisões do Supremo em ações de caráter universal, como as ADIs (Ações Diretas de Inconstitucionalidade), devem ser seguidas por todos os entes da federação. Ela também cita a Lei de Acesso à Informação, que obriga entidades privadas sem fins lucrativos a divulgar a parcela de recursos públicos recebidos e sua destinação.

Marco regulatório desrespeitado

José Antônio Moroni, do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), lembra que o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, de 2014, já prevê a obrigatoriedade de transparência no uso de recursos públicos. Segundo ele, as emendas parlamentares têm “fugido completamente” dessa legislação, já que, na prática, são as próprias entidades que elaboram os projetos e buscam apoio dos deputados, em vez de o poder público definir as prioridades.

Respostas das entidades

O Instituto Paulo Kobayashi afirmou, em nota, que está “adequando o site para aperfeiçoar a transparência” e destacou sua “conduta ilibada” na execução de projetos. A Confederação Brasileira de Artes Marciais disse que segue processos rigorosos para a aplicação dos recursos. Já a Santa Casa de Cosmópolis garantiu que está dentro do prazo legal para prestar contas.

Enquanto isso, a discussão sobre a transparência no uso de recursos públicos continua, com críticas à gestão Tarcísio e ao modelo de emendas impositivas, que, segundo especialistas, carece de maior fiscalização e alinhamento com as normas federais.

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