A família do senegalês Ngange Mbaye, morto pela PM de São Paulo, segue aguardando a liberação do corpo para tentar o translado para o seu país natal. O vendedor ambulante levou um tiro da PM ao tentar defender a mercadoria de uma colega, na sexta-feira (11), durante uma operação no Brás, na região central da capital. Leia mais sobre a violência policial em São Paulo com a TVT News.
Os comerciantes ainda estão assustados com o que aconteceu na sexta. De acordo com a repórter Girrana Rodrigues, no jornal TVT News Primeira Edição desta segunda (14), o Brás amanheceu de luto. Na esquina da Rua Joaquim Nabuco, onde ocorreu o conflito de ambulantes, o dia amanheceu com reforço no policiamento.
Depois de ser baleado em frente a uma loja de calçados, ele foi carregado uns metros à frente, onde seu corpo foi deixado. Comerciantes relatam que após o corpo ser deixado na calçada, a ambulância demorou cerca de 30 minutos até chegar para socorrê-lo. Ele sangrava muito.
Muitos comerciantes estão com medo de falar sobre o ocorrido, apesar da indignação. Os agentes faziam parte da Operação Delegada, que permite a policiais militares ajudarem na fiscalização da prefeitura contra o comércio ambulante ilegal.
Os comerciantes também relataram que não foi a primeira vez que Mbaye teve a mercadoria tomada. Só em dezembro, foram três apreensões. Ele também já havia sofrido um ferimento na cabeça, por parte dos policiais. Por conta disso, estava bastante indignado pela atuação dos policiais. Ele deixa sua mulher, grávida de sete meses.
PM que mata
O comentarista Eduardo Castro critica a atuação da Polícia Militar na gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos). Segundo Castro, em governos anteriores não era dito “a polícia vai lá e vai matar, como temos ouvido”.
“Eles devem estar sempre sob o mais rígido regulamento, justamente porque têm o direito legal de usar a força. E tendo o aval para usar a força, esse uso precisa ser muito contido e muito medido”, disse. Me lembro, nesses trinta anos que venho acompanhando, a gente já viu as secretarias de segurança e governos de Estado dizendo que a polícia vai ser dura, rígida, mas não me lembro de nenhum, como este governo atual, dizer que a vai matar. É o que a gente tem ouvido. Depois que o gênio saiu da garrafa, tem como botar de volta?”, questiona o comentarista.
Para Benedito Mariano, ex-ouvidor da Polícia Militar do Estado de São Paulo, a Segurança Pública de São Paulo se agrava por envolvimento com o crime organizado, além do aumento sistemático da letalidade policial. Ele cita o abusos cometidos principalmente durante a Operação Escudo e Operação Verão, ambas no litoral paulista, que culminaram com 84 mortos pela PM.
“Diria que é a maior na Segurança Pública de São Paulo nas últimas décadas, esse envolvimento de policiais com o crime organizado. Somado a isso, o aumento sistemático da letalidade policial. Em algumas ações, temos imagens em que efetivamente as vítimas não estavam envolvidas em delitos. Não houve mortes em razão do confronto com policiais. Então é muito preocupante”, disse.
Para ele, é preciso denunciar internacionalmente os casos de abuso da policia paulista. “É fundamental as entidades da sociedade civil encaminharem essas situações à OAE, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, apesar do governador dizer que podem na ONU ou na Liga da Justiça, que ele não está nem aí, nós temos que procurar os organismos internacionais e denunciar essa política desastrosa que vem sendo realizada no maior estado do país”.
Perseguição aos ambulantes
Benedito Barbosa, coordenador da Central dos Movimentos Populares, explica que abordagem com ambulantes se tornaram mais violentos nos últimos anos na cidade de São Paulo.
“No centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, havia um fórum dos trabalhadores ambulantes que fazia esse acompanhamento desde 2014. E esse processo de pressão sobre os esses trabalhadores é permanente e cotidiano. Com a criação da Operação Delegada, que eles autodenominam como de combate ao comércio ambulante na cidade de São Paulo, feito a partir de um convênio com a prefeitura, em 2009, ainda na gestão do então prefeito Gilberto Kassab. De lá para cá, esse processo de violência contra trabalhadores ambulantes por parte da Polícia Militar foi se acirrando ao longo dos anos. Então não é um caso isolado, é um processo que vem acontecendo sistematicamente na cidade de São Paulo. Os casos de violência são permanentes”.
Casos de violência policial aumento em São Paulo e a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) constantemente afirma que não compactua com a violência e que irá afastar os responsáveis durante investigação, critica a comentarista Laura Capriglione.
“De fato, a gente está cansado de ouvir a mesma ladainha. Cada vez que a polícia comete uma violência, o policial é afastado até a apuração das devidas circunstâncias. Ou esse outro fhavão que diz “não compactuamos com desvios de função”. E a imprensa engole. A assessoria de imprensa da PM não está tendo trabalho nenhum, vamos combinar. No entanto a gente está vendo o aumento da letalidade policial exponencialmente. Ao mesmo tempo estamos vendo um aumento da morte de policiais também. Ou seja, a equação está toda errada.”
Segundo Benedito Mariano, ex-ouvidor da Polícia Militar do Estado de São Paulo, é comum que policiais afastados da força após casos de violência contra civis sejam reincorporados rapidamente. Mariano denuncia que em São Paulo, 45% oficiais já foram afastados por não pactuarem com o uso de câmeras corporais na Operação Escudo.
“Eu acompanhava, na corregedoria, para efetivamente saber se o policial estava afastado para o serviço administrativo. Porque muitas vezes se fala que ele está afastado, mas na semana que vem está em atividade comum. Então tem que acompanhar”, ressalta o ex-corregedor.
“Agora, é bom lembrar que, nessa gestão, quase 45% dos oficiais coroneis, última patente da PM, foram afastados pelo governo. Nunca ocorreu isso em São Paulo. Foram afastados porque não pactuavam, por exemplo, com a Operação Escudo sem usar câmeras corporais. Então há uma política em São Paulo, de valorizar uma ação mais repressiva do que uma ação de policiamento preventivo”.