PGR pede condenação de Bolsonaro por tentativa de golpe

Hora do julgamento final se aproxima e pela primeira vez na história um ex-presidente pode ser condenado por golpe de Estado
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Réus respondem por golpe de Estado e mais quatro crimes. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABR

O procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet, pediu a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e dos outros setes réus no caso que julga a tentativa de golpe de Estado. O grupo faz parte do “núcleo 1”, considerado crucial na trama golpista. Saiba mais na TVT News.

O pedido foi apresentado no documento de alegações finais. Essa é a última etapa na tramitação do processo, antes do julgamento.

Jair Bolsonaro faz parte do núcleo 1 da trama golpista

Os oito réus compõem o “núcleo crucial” da tentativa de golpe, de acordo com a PGR.

  • Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin);
  • Almir Garnier (ex-comandante da Marinha);
  • Anderson Torres (ex-ministro da Justiça);
  • Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional);
  • Mauro Cid (delator e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro);
  • Jair Bolsonaro (ex-presidente da República);
  • Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa);
  • Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e vice de Bolsonaro na chapa das eleições de 2022).

Condenação de Bolsonaro é defendida pela PGR

Na manifestação, o procurador-geral descreveu o papel do ex-presidente Jair Bolsonaro na trama golpista como líder da organização criminosa e também como “maior beneficiário” das ações para tentar implantar um golpe de Estado no país em 2022.

Nas palavras de Gonet, o ex-presidente instrumentalizou o aparato estatal e operou em “esquema persistente” de ataque às instituições públicas e ao processo sucessório após o resultado das eleições presidenciais.

“Com o apoio de membros do alto escalão do governo e de setores estratégicos das Forças Armadas, mobilizou sistematicamente agentes, recursos e competências estatais, à revelia do interesse público, para propagar narrativas inverídicas, provocar a instabilidade social e defender medidas autoritárias”, disse o procurador.

A condenação de Bolsonaro e dos outros sete réus podem passar de 30 anos de prisão.

A acusação geral

Gonet ressaltou que a acusação se baseou em amplo conjunto probatório, ou seja, provas. Ele apresentou que foram considerados manuscritos, arquivos digitais, trocas de mensagens e planilhas que revelam a trama conspiratória contra as instituições democráticas.

“A organização criminosa documentou a quase totalidade das ações narradas na denúncia, por meio de gravações, manuscritos, arquivos digitais, planilhas e trocas de mensagens eletrônicas, tornando ainda mais perceptível a materialidade delitiva”, apresenta a PGR.

Segundo ele, os depoimentos e inquirições ao longo do julgamento evidenciaram envolvimento dos denunciados em uma organização criminosa com o objetivo de impedir o funcionamento dos poderes da República e depor um governo legitimamente eleito, além da depredação de prédios públicos.

“A denúncia, por isso mesmo, não pode ser analisada como narrativa de fatos isolados, mas, antes, há de ser contemplada como relato de uma sequência significativa de ações voltadas para finalidade malsã, aptas, na soma em que se integram, para provocar o resultado que a legislação penal pune”.

De acordo com a nota da PGR, Bolsonaro e aliados teriam “orquestrado as ações para garantir permanência autoritária no poder por meio de tentativas de ruptura violenta da ordem democrática”.

Na denúncia, Mauro Cid é tratado como réu colaborador, o que coloca a continuidade da delação premiada em dúvida. A PGR disse que ele contribuiu para esclarecer a estrutura da organização criminosa, entretanto também percebeu omissões relevantes — o que não deveria acontecer em um acordo de delação premiada.

A PRG, na condição de acusadora, pede que Mauro Cid receba redução de /3 da pena, mas que não seja beneficiado com o perdão judicial.

Breve cronologia dos fatos apontados pela PGR

O golpe começa a ser articulado quando membros do alto escalão do governo solicitaram que forças policiais impessam que pessoas no nordeste retornem as suas cidades para votar. “A utilização da ABIN e das forças da Polícia Rodoviária Federal para estruturar mecanismos de contenção de opositores do governo e de eleitores do adversário do então Presidente da República são momentos capitais do golpe posto em andamento.”

A PGR também ressata que os constantes ataques as integridades das urnas, das votações e nas instituições do Estado minaram a democracia e criaram terreno fértil na sociedade para a orquestração do golpe.

Ao fim do segundo turno das eleições de 2022, o Brasil se depara com as primeiras consequências diretas dos discursos corrosivos de Bolsonaro: a greve dos caminhoneiros e os acampamentos nos quartéis — cujo os financiamentos ainda estão sendo investigados. E posteriormente, os atos golpistas do dia 8 de janeiro.

“A todo momento, pela narrativa propagada, o grupo buscou a instabilidade social. Inicialmente, a revolta serviria como fator de legitimação para que fossem decretadas as medidas de exceção. O apoio popular para as medidas era forjado com a disseminação da desconfiança no processo eleitoral e da animosidade contra os poderes constituídos”, diz o documento da PGR.

Os ataques do dia 8 de janeiro foram vistos como “o anúncio da denominada ‘Festa da Selma’ foi feito com antecedência. Os convidados chegaram bem preparados, os trajes, em verde e amarelo, estavam coordenados, e as palavras de ordem, uníssonas, se referiam a ‘código fonte’, ‘intervenção federal’, ‘SOS Forças Armadas’, ‘anulação das eleições’, ‘Bolsonaro no poder’, ‘tomada de poder’.”

Na sequência, Gonet esclarece que o 8 de janeiro não era o objetivo principal do núcleo 1, mas passou a ser desejado diante da recusa das autoridades do Exército e da Aeronáutica de articular o golpe de Estado.

“O líder enaltecido pelos manifestantes era Jair Bolsonaro e a pauta defendida era fruto do seu insistente e reiterado discurso de radicalização, embasado em fantasias sobre fraudes do sistema eletrônico de votação e em injustas descrenças na lisura dos poderes constitucionais, exatamente nos mesmos moldes da narrativa construída e propagada pela organização criminosa”.

No documento, a PGR apresenta as provas que comprovam a articulação dos réus para que os atos do dia 8 de janeiro acontecessem, assim com o incentivo ao golpe.

Mauro Cid revelou em conversa com apoiador que o termo “churrasco” era um codinome para “golpe de Estado”, por isso em diversos momentos era questionado se o evento aconteceria.

“O pessoal q colaborou c a carne [pessoas do agronegócio que contribuíram financeiramente para a mobilização], estão me cobrando se vai ser feito mesmo o churrasco. Pois estão colocando em dúvida, a minha solicitação”, indagou um interlocutor.

O documento mostra que Bolsonaro, na condição de presidente em exercício, sabia e utilizava dos aparatos do Estados para que os acampamentos e os atos ocorressem sem estresse para os bolsonaristas nas ruas.

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Em uma reunião registrada em vídeo, e que se tornou peça central do processo, Bolsonaro acusou nominalmente os ministros Moraes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin

“O então Presidente sempre dava esperanças que algo fosse acontecer para convencer as Forças Armadas a concretizarem o golpe. O colaborador inclusive afirma que esse foi um dos motivos pelos quais o então presidente Jair Bolsonaro não desmobilizou as pessoas que ficavam na frente dos quartéis”, explica a PGR.

Além disso, mostra que todas as ordens partiam de Jair Bolsonaro.

Pelo o que Bolsonaro está sendo condenado?

O procurador-geral da República reforçou que Bolsonaro e os outros sete réus sejam condenados pelos seguintes crimes:

  • organização criminosa armada (art. 2º, caput, §§2º, 3º e 4º, II, da Lei n. 12.850/2013);
  • tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do Código Penal);
  • golpe de Estado (art. 359-M do CP);
  • dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima (art.163, parágrafo único, I, III e IV, do CP);
  • deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I, da Lei n. 9.605/1998).

A PGR também solicita que os denunciados Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Jair Bolsonaro, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto tenham que pagar um valor mínimo para reparação de danos, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal.

Próximos passos

Após a PGR, a defesa do tenente-coronel Mauro Cid terá 15 dias para se manifestar. Ele apresentará o documento antes dos outros réus, porque fechou acordo de colaboração premiada.

Depois, as outras defesas terão um prazo conjunto de 15 dias. Os prazos correm mesmo no recesso do Judiciário, que vai até 31 de julho, porque um dos réus, o general e ex-ministro Walter Braga Netto, está preso. Os ministros da Primeira Turma do STF analisam os documentos.

A entrega das alegações finais acontece após o fim da instrução processual penal, fase da produção de provas na Justiça. Nesse período, foram ouvidas testemunhas, réus interrogados e realizadas todas as diligências. Após o prazo das alegações, a ação pode ser julgada no STF.

Jair Bolsonaro faz parte do núcleo 1 da trama golpista

Os oito réus compõem o “núcleo crucial” da tentativa de golpe, de acordo com a PGR.

  • Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin);
  • Almir Garnier (ex-comandante da Marinha);
  • Anderson Torres (ex-ministro da Justiça);
  • Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional);
  • Mauro Cid (delator e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro);
  • Jair Bolsonaro (ex-presidente da República);
  • Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa);
  • Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e vice de Bolsonaro na chapa das eleições de 2022).

Assista a análise da condenação do Bolsonaro a partir das 10h30:

Com informações da Procuradoria Geral da República e da Agência Brasil

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