Só neste ano, a Comissão de Anistia concluiu mais de 97% dos pedidos que estavam parados desde 2001. Um deles é da Sonia Estela, a Fumaça.
Fumaça foi presa em 21 de julho de 1983, durante a noite que antecederia a greve geral dos bancários, quando a classe trabalhadora de São Paulo e de outras capitais cruzou os braços em uma paralisação que durou 24 horas. Leia em TVT News.
”Nós fomos divulgar a nossa greve geral para o dia seguinte. A gente estava divulgando, passando e jogando panfleto dentro dos bancos, e mostrando que nós estávamos ali e estaríamos num próximo momento naquele lugar”, contou ela, no Jornal TVT News Primeira Edição.
Com apenas 21 anos, na época Fumaça trabalhava como datilógrafa no Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.
Foi levada ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops), onde ficou presa no subsolo, no mesmo local onde depois foram presos outros sindicalistas como Tita Dias, Augusto Campos, Luizinho Azevedo e o jornalista Julinho de Gramon.
De tanto apanhar na prisão, fumaça desenvolveu sequelas. Teve dois tumores nos rins e precisou passar por quimioterapia.
“Eu resisti. Eu resisti, e aí a gente apanha, né? Nisso, fui adoecendo em tudo. Vim de dois tumores, vim morar aqui nesse meio de mato para poder sobreviver, porque não tinha condições de pagar terapia”, relatou Fumaça, que hoje mora no bairro da Barragem, no extremo da zona sul de São Paulo.
Lá ela faz trabalho voluntário com 15 aldeias indígenas guarani, e leva ajuda com cestas básicas com o apoio do Sindicato dos Bancários de São Paulo.
“Temos roda de conversa com os guaranis e com os jerás. Eles contam as experiências deles e nós contamos a nossa. A gente se ajuda não só socialmente, mas trocando informação.”
A anistia a perseguidos políticos durante o regime militar teve papel central na redemocratização do país. A lei da anistia aprovada em 1979 permitiu o retorno de centenas de exilados políticos, a libertação de militantes presos e a proteção de opositores do regime militar.
Em um primeiro momento, a norma garantiu apenas o retorno e a reintegração dos perseguidos políticos.
Anos depois, em 1995 e 2002, novos mecanismos foram criados para ampliar a reparação, como emissão de atestados de óbito para desaparecidos políticos e a reparação financeira para vítimas da repressão.
Apesar desses avanços, a maior parte dos desaparecidos nunca teve seus corpos localizados, e os acusados de tortura jamais foram intimados a depor na Justiça. Muitas vítimas passaram anos aguardando reparação.
“Minha mãe não está hoje viva para saber que hoje eu sou anistiada. É questão de liberdade. Eu me sinto uma pessoa livre. Porque quando você vai viajar ou fazer qualquer documentação, você é obrigado a explicar por que foi preso. Você não tem liberdade. Vocês têm a liberdade de expressão porque eu puxei cadeia lá atrás Porque a gente apanhou muito, porque a gente sofreu muito. Porque a ditadura dói. Ela faz isso”, alerta Fumaça.