A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de manter a taxa básica de juros da economia, a Selic, em 15% ao ano provocou reações de entidades sindicais e empresariais. Entre elas, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) apresentou críticas à política monetária do órgão que, segundo a entidade, penaliza diretamente os trabalhadores e favorece o setor financeiro. Entenda na TVT News.
“Juros altos (Selic) mantêm o país no topo do ranking mundial de juros reais e penalizam a população, que paga mais caro pelo crédito, consome menos e vê as empresas reduzirem investimentos e empregos,” afirmou Juvandia Moreira, presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e vice-presidenta da CUT.
A reunião do Copom ocorreu ontem (17), e, ao anunciar a manutenção da taxa, o colegiado justificou a decisão com base na “moderação no crescimento” da economia doméstica, na inflação ainda acima da meta e nas incertezas do cenário internacional, especialmente relacionadas à política econômica dos Estados Unidos.
Selic alta e ineficaz
A CUT contesta a eficácia da Selic alta como instrumento de combate à inflação brasileira. Para Juvandia, os juros elevados não atuam sobre os reais vetores da inflação nacional e acabam por estrangular a economia popular.
“O Banco Central diz que precisa manter a taxa de juros alta para controlar a inflação, mas isso não é verdade para os tipos de inflação que enfrentamos no Brasil,” explicou a dirigente.
Segundo ela, manter os juros elevados não reduz o preço da comida, do gás ou da conta de luz, mas sim inibe o consumo, freia o crédito e aumenta o desemprego, gerando um ciclo vicioso que penaliza a população mais pobre.
Financiamentos impossíveis
Para o secretário de Assuntos Socioeconômicos da Contraf-CUT, Walcir Previtale, a política de juros altos representa um obstáculo concreto à vida dos brasileiros. Financiamentos de carro ou casa, por exemplo, tornam-se inviáveis para grande parte da população.
“Um financiamento de casa ou carro se torna quase proibitivo, enquanto estimular o consumo das famílias e do setor produtivo com crédito a juros justos é o caminho para controlar a inflação sem penalizar o povo,” afirma Previtale.
Ele também alerta que o endividamento das famílias aumentou de forma crítica nos últimos anos, impulsionado pelas taxas bancárias que acompanham a Selic. Para ele, a atual política monetária prioriza o rentismo em detrimento do bem-estar social.
Frenagem do crescimento e custos ao Estado
A CUT ressalta que o Brasil já demonstrou, em outros períodos, ser possível crescer com inflação sob controle e juros mais baixos, como nos primeiros anos dos governos petistas, quando houve aumento do emprego formal e da renda.
“Os juros altos desestimulam investimentos, consumo e geração de empregos. O Brasil poderia criar muito mais vagas de qualidade e com salários melhores, se não fosse essa política do Banco Central,” completa Juvandia.
O impacto da Selic alta também recai sobre as contas públicas. Segundo estimativa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), apenas a manutenção da Selic em 15% representará um gasto adicional de R$ 12,2 bilhões para o governo federal no ano.
Nos últimos 12 meses, o país desembolsou R$ 928,4 bilhões com juros da dívida pública, valor que representa mais de cinco vezes o orçamento da Educação e três vezes o da Saúde, segundo dados compilados pelo Dieese.
“É por isso que a classe trabalhadora, organizada pelo movimento sindical, se manifesta continuamente contra a política de juros altos do Banco Central,” reforça Previtale.
Outras vozes
Enquanto a Confederação Nacional da Indústria (CNI) chamou a decisão do Copom de “injustificada” e alertou para uma postura “excessivamente conservadora”, a FecomercioSP apoiou a medida, argumentando que a inflação de serviços permanece alta e que a demanda segue aquecida.
“Não existe crescimento sustentável com juros estratosféricos (…). Já passou do momento de uma política monetária mais favorável,” criticou Ricardo Alban, presidente da CNI.
A Força Sindical, em nota nas redes sociais, também se manifestou contra a decisão do Copom, afirmando que ela representa “submissão aos especuladores” e prejudica o setor produtivo e as campanhas salariais do segundo semestre.
Enquanto isso nos EUA
Enquanto isso, a decisão do Federal Reservem na mesma data, de cortar os juros em 0,25 ponto percentual é um sinal de que a autoridade monetária norte-americana começa a mudar sua postura diante do esfriamento da economia dos Estados Unidos.
Com a inflação caminhando para o centro da meta e dados mais fracos do mercado de trabalho e da atividade industrial, o Fed opta por iniciar um novo ciclo de flexibilização monetária, embora de forma cautelosa. A escolha de um corte modesto, apesar da pressão por medidas mais agressivas, como propôs Stephen Miran, reflete a tentativa de calibrar o alívio econômico sem reacender pressões inflacionárias.
No cenário internacional, essa mudança de direção pode gerar uma reacomodação dos fluxos de capitais, beneficiando países emergentes como o Brasil. Com juros mais baixos nos Estados Unidos, o diferencial de retorno entre os títulos americanos e os de economias em desenvolvimento tende a aumentar, o que atrai investidores para mercados como o brasileiro, em busca de maior rentabilidade. Isso pode provocar uma valorização do real, facilitar a queda da inflação importada e reduzir pressões cambiais sobre a economia nacional.
Além disso, o recuo nos juros americanos abre espaço para que o Banco Central brasileiro adote uma política monetária mais ousada no futuro próximo. Analistas apontam que a manutenção da Selic em 15% ao ano, apesar da desaceleração da inflação e da atividade econômica no Brasil, estaria parcialmente ligada ao ambiente externo.
Agora, com o Fed sinalizando um ciclo de cortes, a justificativa para manter os juros brasileiros tão altos perde força. Essa mudança pode alimentar o debate político e econômico sobre o papel e a autonomia do Banco Central no país, em um momento em que o custo social dos juros elevados se torna cada vez mais evidente.