Faltando pouco menos de um ano para a Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP30, que acontecerá em Belém (PA), o Brasil encara um paradoxo: mesmo sendo o anfitrião do maior evento global sobre clima, a maioria da população brasileira ainda desconhece o significado da conferência. De acordo com pesquisa do Instituto Ideia em parceria com o LaClima, 71% dos brasileiros não sabem o que é a COP30. O cenário se agrava quando se observa que 34% da população não sabe o que são mudanças climáticas, segundo levantamento do Datafolha e da Tereos. Entenda na TVT News.
Essa desconexão entre a crise climática e o cotidiano das pessoas levanta um alerta sobre a efetividade das políticas ambientais e da mobilização social diante da emergência climática. O Pulitzer Center, organização jornalística independente que atua globalmente no fortalecimento da comunicação climática, aponta que a falta de comunicação acessível e de educação de qualidade são barreiras centrais para o engajamento da sociedade brasileira no tema.
“As mudanças climáticas ainda são tratadas como um tema distante, técnico ou institucional. Mas elas já impactam a vida de milhões de pessoas todos os dias. Tornar essa crise compreensível, concreta e mobilizadora depende de uma mudança de abordagem que passa por escutar os territórios, apoiar o jornalismo local e articular saberes em espaços educativos e públicos”, afirma Maria Darrigo, gerente do programa de educação para a América Latina do Pulitzer Center.
Narrativas locais e a COP30
É justamente nos territórios mais vulneráveis, como a Amazônia e as regiões costeiras, que se observa não só os impactos mais severos da crise climática, mas também o surgimento de resistências e soluções inovadoras conduzidas por comunidades tradicionais, povos indígenas, pescadores, educadores e trabalhadores rurais.
Ao apoiar reportagens e projetos educativos nesses locais, o Pulitzer Center tem contribuído para amplificar vozes historicamente silenciadas, transformando experiências vividas em informação acessível e estratégica. A organização viabiliza desde cartilhas comunitárias e podcasts até programas de rádio e reportagens investigativas com repercussão nacional e internacional.
“Quando as histórias são contadas por quem vive a realidade, elas ganham potência, legitimidade e mobilizam muito mais. O jornalismo, nesse contexto, é uma ponte entre mundos: conecta saberes locais às políticas públicas, aproxima quem vive nos centros urbanos dos territórios e dá visibilidade às soluções construídas fora dos grandes fóruns institucionais”, destaca Gustavo Faleiros, diretor do núcleo de investigações ambientais do Pulitzer Center.
Educação e comunicação
A atuação do Pulitzer Center no Brasil e na América Latina revela como jornalismo, comunicação e educação podem gerar engajamento real. Exemplo disso é a mostra Histórias da Amazônia, realizada no Maranhão e Pará, que levou filmes, rodas de conversa e debates para dentro da floresta, aproximando a população das discussões sobre desenvolvimento, ameaças ambientais e alternativas sustentáveis.
Outro projeto em destaque é o programa Clima no Antropoceno, que une ciência, educação e saberes tradicionais em iniciativas como os Diálogos Itinerantes Amazônia no Antropoceno e webinários interdisciplinares sobre oceano, clima e territórios. Além disso, o Pulitzer tem atuado na formação de professores e estudantes de escolas públicas, com planos de aula e concursos de redação que abordam a crise climática com base em realidades locais.
O Fundo Semear, outra frente da organização, apoia pesquisadores e professores da América Latina a desenvolverem projetos com impacto local. A maioria dessas ações se ancora em escolas e universidades públicas, buscando uma educação crítica, inclusiva e territorializada.
“Falta debate e também material didático atualizado, falta conexão com a realidade dos alunos. A educação precisa ser um campo estratégico para a transição climática, com metodologias engajadoras, baseadas em saberes múltiplos e no cotidiano dos territórios”, reforça Maria Darrigo.
A mídia e o desafio da cobertura climática
Apesar de sua relevância transversal, envolvendo saúde, energia, segurança alimentar, tecnologia e trabalho, a emergência climática ainda é tratada como um debate de nicho. Um estudo do próprio Pulitzer Center, Making Waves, mostrou que a cobertura sobre os oceanos é subestimada e desconectada de temas centrais como justiça climática, biodiversidade e políticas públicas.
Quase 90% dos jornalistas ouvidos na pesquisa consideram a atenção dada ao tema insuficiente, com matérias concentradas em eventos pontuais e ausência de vozes locais, indígenas e costeiras. A pesquisa indica ainda carência de orçamento, formação e conexão com outras agendas como fatores que limitam a produção jornalística sobre o tema.
Mesmo assim, a mídia continua sendo vista como peça-chave para a transformação, ao aproximar o público da ciência e influenciar políticas públicas.
COP30: oportunidade histórica para o Brasil
A COP30, que será realizada em novembro de 2025, marcará a primeira vez em que uma cidade da Amazônia sedia a conferência climática da ONU. Belém, capital do Pará, se tornará o epicentro das negociações globais sobre clima uma chance única de colocar os territórios no centro do debate e de reposicionar o Brasil como protagonista ambiental.
Nesse contexto, é fundamental ampliar o acesso à informação climática de qualidade, diversificar as narrativas e garantir que as vozes dos territórios e não apenas as de especialistas e chefes de Estado sejam ouvidas.
“Sem facilitar o acesso ao debate climático de qualidade e sem reconhecer os saberes que nascem dos territórios, qualquer solução climática estará incompleta”, conclui Gustavo Faleiros.
Sobre o Pulitzer Center
Fundado em 2006 nos Estados Unidos, o Pulitzer Center é uma organização jornalística sem fins lucrativos, voltada à promoção de reportagens inovadoras e de impacto sobre temas globais. Com atuação em mais de 80 países incluindo presença crescente no Brasil, América Latina, África e Sudeste Asiático, a organização acredita no jornalismo como ferramenta de mobilização social e de fortalecimento da democracia.
A COP30 representa uma chance histórica não apenas de avançar em compromissos internacionais, mas também de ressignificar a forma como o Brasil comunica e educa sobre a crise do clima. A urgência não é apenas ambiental, é também narrativa. E o tempo para agir é agora.