Lula na ONU: “Não há pacificação com impunidade”

Em discurso de abertura da Assembleia da ONU, Lula alertou para o risco de colapso do multilateralismo e o avanço global das forças autoritárias
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Em tom direto, Lula traçou um paralelo entre a crise do multilateralismo e o enfraquecimento das democracias. Foto: Ricardo Stuckert/PR

Em seu discurso de abertura da 80ª Assembleia Geral da ONU hoje (23), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um diagnóstico da atual ordem internacional, alertando para o risco de colapso do multilateralismo e para o avanço global das forças autoritárias. Entenda na TVT News.

Falando à comunidade internacional, Lula afirmou que a ONU está “em xeque” e acusou potências globais de imporem sanções unilaterais, atentarem contra a soberania de nações e promoverem uma “consolidação da desordem internacional”.

“O multilateralismo está diante de uma nova encruzilhada. Esta organização está em xeque. Assistimos a uma consolidação de desordem internacional marcada por seguidas concessões às políticas do poder”, afirmou o presidente. “Sanções arbitrárias e unilaterais estão se tornando regra.”

Em tom direto, Lula traçou um paralelo entre a crise do multilateralismo e o enfraquecimento das democracias, fenômeno que, segundo ele, tem se alastrado pelo mundo com o auxílio de milícias digitais, cultos à ignorância e ataques sistemáticos à imprensa.

Lula, anistia e pacificação

“Forças antidemocráticas tentam subjulgar instituições e sufocar liberdades. Cultuam a violência. Exaltam a ignorância. Atuam como milícias físicas e digitais. E cerceiam a imprensa”, declarou.

O presidente aproveitou a tribuna da ONU para defender a democracia brasileira diante do que classificou como ataques “sem precedentes”, e destacou como símbolo da maturidade institucional do país a recente condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe.

“Não há pacificação com impunidade. Há poucos dias, pela primeira vez em 525 anos de história, um ex-chefe de Estado foi condenado por atentar contra o Estado Democrático de Direito”, afirmou, referindo-se sem nomear Bolsonaro. “Foi investigado, indiciado e julgado. Teve amplo direito de defesa, o que ditaduras negam às suas vítimas.”

A declaração foi recebida com aplausos no plenário. Lula completou:

“Diante dos olhos do mundo, o Brasil deu um recado a todos autocratas e aqueles que os apoiam: nossa democracia e nossa soberania são inegociáveis.”

Contra guerras e desigualdade

Lula também criticou a disparidade entre os investimentos globais em guerra e os escassos recursos destinados ao combate à fome e à pobreza. “A pobreza é tão inimiga da democracia quanto o extremismo”, disse. O presidente celebrou o retorno do Brasil ao Mapa da Fome da FAO como país livre da fome em 2025, mas lembrou que ainda há 260 milhões de famintos no mundo.

“A única guerra que todos podem sair vencedores é a que travamos contra a fome e a pobreza. Esse é o objetivo da Aliança Global que lançamos no G20 e conta com apoio de 103 países”, pontuou.

Entre as propostas apresentadas, Lula defendeu a redução de gastos militares, o alívio da dívida externa dos países mais pobres, especialmente africanos, e a implementação de uma taxação mínima global sobre super-ricos, para combater a desigualdade tributária.

Soberania digital e proteção da infância

Outro ponto destacado foi a defesa de uma regulação internacional para o ambiente digital, com foco no combate à desinformação e na proteção de crianças. Lula rejeitou que essa regulação seja interpretada como censura:

“A internet não pode ser terra sem lei. Regular não é restringir liberdade de expressão. É garantir que o que já é ilegal no mundo real seja tratado assim no ambiente virtual.”

Segundo ele, o Parlamento brasileiro tem avançado nesse debate e o país promulgou recentemente uma lei específica para proteger crianças e adolescentes no ambiente digital, iniciativa citada com orgulho.

Chamado por uma nova ordem internacional

O discurso reafirma a estratégia brasileira de ocupar posição de liderança entre os países do Sul Global, promovendo uma nova arquitetura internacional mais justa, democrática e solidária, em contraposição à atual ordem dominada por poucos.

“Seguiremos como nação independente e como povo livre de qualquer tipo de tutela. Democracias sólidas vão além do ritual eleitoral. Seu vigor pressupõe redução de desigualdades, alimentação, segurança, trabalho, moradia, educação e saúde”, declarou Lula, encerrando sua fala.

A mensagem é clara: o Brasil de Lula quer ser protagonista não apenas como defensor da democracia interna, mas também como articulador de soluções multilaterais para os principais desafios globais — da fome à guerra, da desigualdade à regulação digital. Em tempos de instabilidade global, Lula se apresenta como defensor da paz, da soberania dos povos e da reforma urgente das instituições internacionais.

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