A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta terça-feira, para condenar nove réus do chamado núcleo 3 da trama golpista, que envolve os chamados kids pretos, articulada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). Entenda na TVT News.
Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), esse núcleo dos kids pretos era responsável pelas ações “mais severas e violentas” do plano criminoso, incluindo o projeto de assassinar autoridades, entre elas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o vice Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes.
O grupo é composto por dez acusados: nove militares das Forças Armadas e um agente da Polícia Federal. Sete deles foram condenados por cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Outros dois foram condenados por incitação ao crime e associação criminosa.
Apenas um réu, o general da reserva Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, teve voto pela absolvição, por falta de provas. É a primeira vez que o relator, ministro Alexandre de Moraes, vota pela absolvição de um acusado na série de julgamentos relativos à trama golpista.
O voto de Moraes foi acompanhado pelos ministros Cristiano Zanin e Cármen Lúcia, formando maioria na Turma. Ainda falta o voto do ministro Flávio Dino, presidente do colegiado. Após a conclusão do julgamento, serão definidas as penas individuais.
Kids pretos e demais condenados
Pelos cinco crimes apontados pela PGR, foram condenados:
- Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército
- Fabrício Moreira de Bastos, coronel do Exército
- Hélio Ferreira Lima, tenente-coronel do Exército
- Rafael Martins de Oliveira, tenente-coronel do Exército
- Rodrigo Bezerra de Azevedo, tenente-coronel do Exército
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, tenente-coronel do Exército
- Wladimir Matos Soares, agente da Polícia Federal
Por incitação ao crime e associação criminosa, também foram condenados:
- Márcio Nunes de Resende Jr., coronel do Exército
- Ronald Ferreira de Araújo Jr., tenente-coronel do Exército
Organização planejou assassinatos
A denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirma que os réus atuaram para pressionar autoridades militares a aderirem a um golpe que manteria Bolsonaro no poder, mesmo após sua derrota nas urnas em 2022. O núcleo 3, segundo a PGR, elaborou o plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa o monitoramento, a prisão e a execução de Lula, Alckmin e Moraes.
O esquema, diz Gonet, recebeu aval de Bolsonaro. O documento da minuta golpista teria sido impresso dentro do Palácio do Planalto.
“As investigações escancaram a disposição homicida e brutal da organização criminosa”, afirmou o procurador-geral. “Os denunciados aderiram aos propósitos ilícitos da organização criminosa e contribuíram para os eventos penalmente relevantes”, acrescentou.
O voto de Moraes
No início do voto, Moraes destacou que o STF já reconheceu a existência dos crimes no julgamento de outros núcleos e dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023. A tarefa, portanto, era estabelecer a autoria de cada acusado.
O relator exibiu mensagens trocadas entre os réus nas quais discutem fraudar a legitimidade do processo eleitoral, disseminar notícias falsas sobre urnas eletrônicas e incitar ações violentas. Sobre o tenente-coronel Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, Moraes disse: “Está claro pelas provas dos autos que a intenção do réu era atuar com base em notícias falsas […] de modo a corroborar a narrativa criminosa da organização criminosa”.
Moraes também mostrou dados de geolocalização que indicam que militares do grupo monitoraram endereços ligados a autoridades, inclusive sua própria residência e o prédio do STF. “Existem fartas provas de que os réus Hélio Ferreira Lima e Rafael Martins de Oliveira participaram do ato executivo de monitoramento de autoridades”, afirmou.
O relator apontou ainda o alinhamento direto entre o núcleo 3 e o núcleo central do plano, sob orientação do ex-ajudante de ordens da Presidência, Mauro Cid, que delatou o esquema. A cooptação de militares especializados — especialmente aqueles ligados a Cid — tinha como objetivo apoiar e executar o intento golpista, segundo Moraes.
Plano para assassinar autoridades
Moraes reiterou que o grupo tinha acesso a armas de alto calibre, munições perfurantes e explosivos. A PF analisou documentos e mensagens que comprovam a preparação para os crimes. Segundo o relator, o assassinato das autoridades só não avançou porque o grupo não conseguiu adesão do Comandante do Exército, etapa considerada fundamental para deflagrar uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) que abriria caminho para um estado de exceção.
“O plano previa farta munição perfurante de fuzil 762, 556, bombas […] e está comprovado que houve planejamento e ato executório. Só não se consumou por circunstâncias alheias à vontade”, disse Moraes.
