Nesta sexta-feira (28), completam-se exatamente 50 anos da morte do escritor Erico Lopes Verissimo — um dos nomes mais decisivos da literatura brasileira do século 20 e verdadeiro marco na consolidação do romance moderno no país. Sua obra atravessa gerações e continua viva, refletida em exposições, homenagens e na presença constante de seus livros nas prateleiras de bibliotecas, escolas e lares Brasil afora. Leia em TVT News.
Nascido em 17 de dezembro de 1905, em Cruz Alta (Rio Grande do Sul), Verissimo cresceu em uma família que perdeu bens e prestígio, o que o levou a abandonar os estudos para trabalhar — primeiro como balconista em armazém e farmácia, depois no Banco Nacional do Comércio. Lentamente, a paixão pelos livros e pelas letras se impôs. Ainda jovem, lia autores brasileiros e estrangeiros clássicos, e mantinha uma “revista” improvisada onde desenhava e escrevia pequenas notas.
Em 1930, decidiu migrar para Porto Alegre para viver da escrita — uma decisão que mudaria o rumo da literatura brasileira. Chegou à capital gaúcha num momento de efervescência cultural e literária. Foi contratado pela revista “Revista do Globo”, onde logo se tornaria editor, abrindo caminho para uma carreira de sucesso.
Em 1932, publicou sua primeira obra — a coletânea de contos Fantoches — mas foi com o romance Clarissa, lançado em 1933, que Verissimo conquistou os primeiros leitores de modo contundente. O livro, que retrata a vida de uma jovem que sai do interior para viver na capital, dialogava com o crescente protagonismo da classe média urbana — o “novo Brasil” que nascia.
Nos anos seguintes, ele publicaria outros títulos importantes: Caminhos Cruzados, Música ao Longe, Um Lugar ao Sol, entre outros — romances que ajudaram a moldar aquela que pode ser chamada de “fase urbana” de sua carreira.
Já em 1938, publicou Olhai os Lírios do Campo, que representou sua consagração definitiva. O sucesso foi imediato — tanto de crítica quanto de público — e o romance seria traduzido para diversos idiomas, estabelecendo Verissimo como um dos mais populares autores brasileiros.

“O Tempo e o Vento”: a obra-monumento
Se suas primeiras obras exploravam a vida urbana e as transformações da classe média, a partir de 1949 Verissimo inaugurou sua fase mais ambiciosa: a histórica. Começou a publicar O Tempo e o Vento, uma saga em três partes — “O Continente”, “O Retrato” e “O Arquipélago” — que atravessa gerações e narra a formação do Rio Grande do Sul, refletindo lutas, amor, política, migrações, disputas e transformações sociais.
Essa trilogia é considerada uma das maiores realizações da literatura brasileira. Sua densidade histórica e humana, a amplitude de personagens e contextos, e a capacidade de captar a alma de um povo fizeram de Verissimo um autor capaz de projetar o Sul do Brasil no mapa literário nacional — e internacional.
Fases tardias: política, fantasia e memória
Nos anos 1960 e início dos 1970, Verissimo continuou a expandir sua obra. Em 1965, lançou O Senhor Embaixador, ganhador do prêmio mais importante do país, o Prêmio Jabuti, como melhor romance — e obra emblemática de crítica política e geopolítica latino-americana.
Em 1971 publicou Incidente em Antares, um romance inovador que mistura realismo e fantasia: em uma greve de coveiros na fictícia cidade de Antares, corpos enterrados retornam para protestar — uma metáfora potente sobre injustiça, poder e memória.
Além disso, trabalhou em sua autobiografia — a série Solo de Clarineta — cujo primeiro volume saiu em 1973. No momento de sua morte, em 1975, ele reconhecidamente trabalhava no segundo volume da obra.
Legado além dos livros de Erico Verissimo
Ao longo de sua carreira, Verissimo foi amplamente premiado e reconhecido — não apenas no Brasil, mas no exterior. Ele recebeu o prestigiado Prêmio Machado de Assis já em 1934, por Música ao Longe, e depois novamente em 1954, pela totalidade de sua obra. Em 1944, ganhou o título de Doutor Honoris Causa do Mills College, na Califórnia.
Suas obras foram traduzidas para dezenas de idiomas — do alemão ao japonês, do russo ao italiano — e chegaram a leitores em diversos continentes. A força de sua prosa, a amplitude de seus temas e a empatia com personagens que atravessam a vida comum fizeram de Verissimo um nome indispensável da literatura universal.
Na cidade de Porto Alegre, o Memorial Erico Verissimo (MEV), instalado no Espaço Força e Luz, abriu, em 2025, uma nova exposição com material mediativo, organizada para aproximar o público — de jovens a idosos — da vida e da obra do escritor, marcando também os 120 anos de nascimento do escritor. São manuscritos, documentos, correspondências e objetos que revelam os bastidores de suas criações.
Verissimo conquistou um grande feito: conseguiu falar de transformações sociais, de classe média, de sonhos, de ambições e de conflitos — com leveza, elegância, humanidade. Em seus romances, o Brasil se revela em construção, em mudança de mãos, em disputa por identidade, mobilidade social, raízes e caminhos. Isso fez com que suas histórias permanecessem universais, atravessando décadas, mesmo após 50 anos de sua morte.
Além disso, sua heterogeneidade — romances urbanos, históricos, sociais, políticos, fantásticos — garante que leitores diferentes encontrem nos livros dele ecos de suas vivências, dúvidas e anseios. São narrativas capazes de emocionar pela densidade dos personagens, pela honestidade das escolhas, pela coragem de retratar a realidade.
