EUA retiram Moraes da lista de sanções da Lei Magnitsky

Medida, que também se estende à esposa do ministro, é resultado da aproximação diplomática com os Estados Unidos promovida pelo governo Lula
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Após suspenção das tarifas, caem sanções contra Moraes. Foto: Luiz Silveira/STF

A decisão do governo dos Estados Unidos de retirar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e sua esposa, Viviane Barci de Moraes, da lista de sancionados pela Lei Magnitsky marca uma inflexão relevante nas relações bilaterais entre Brasília e Washington. O anúncio, confirmado nesta quinta-feira (12), ocorre seis meses após a imposição das sanções, decretadas em junho sob acusação de supostas violações de direitos humanos por parte do ministro no contexto de decisões contra extremistas ligados ao bolsonarismo. Saiba mais em TVT News.

A reversão do quadro, agora formalizada, é resultado direto do processo de reaproximação diplomática entre Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente norte-americano, Donald Trump, que vem redesenhando a agenda bilateral desde outubro, quando foi concluído o acordo para suspender medidas punitivas contra o Brasil.

A retirada dos nomes do casal foi publicada pelo Departamento do Tesouro e representa o fim das restrições financeiras impostas desde a inclusão de Moraes na chamada Global Magnitsky Human Rights Accountability Act. Ao entrar na lista, o ministro ficou sujeito ao bloqueio de eventuais ativos em território norte-americano e teve proibidas quaisquer transações com cidadãos ou empresas dos EUA. No caso de Viviane, que havia sido sancionada dias depois, as acusações se ancoravam na tese de que ela teria se beneficiado indiretamente das decisões tomadas pelo ministro no âmbito das investigações sobre ataques à democracia.

Segundo a imprensa norte-americana e brasileira, o recuo do governo Trump se apoiou em dois pilares: a mudança de orientação da política externa dos Estados Unidos em relação ao Brasil e a avaliação interna de que a inclusão do ministro havia sido precipitada, impulsionada por pressões políticas de grupos alinhados à extrema direita internacional. A reversão atende, portanto, a uma reconfiguração estratégica maior, que envolve a tentativa de reconstrução de canais institucionais com o governo Lula, considerado essencial para os interesses dos EUA na América do Sul.

Lula Trump Moraes Magnitsky
Com encontros e telefonemas, Lula vem pavimentando nova relação com os EUA. Foto: Ricardo Stuckert/PR

No Itamaraty, a retirada das sanções foi tratada como consequência direta do diálogo retomado nos últimos meses. A chancelaria brasileira intensificou esforços desde que Trump assumiu um tom mais pragmático com Brasília após o encontro bilateral de outubro. Na ocasião, Lula e Trump firmaram compromissos que incluíram a revisão de medidas punitivas e a criação de um grupo de trabalho para reposicionar temas sensíveis da relação bilateral. Esse movimento já havia resultado na suspensão de tarifas e sanções econômicas aplicadas no início do governo Trump; agora, alcança também o terreno institucional e judicial.

Em Washington, porta-vozes do Tesouro afirmaram que a revisão das sanções se deu após “análise aprofundada de informações complementares”, sem detalhar o conteúdo das justificativas. A decisão foi interpretada por analistas como um gesto inequívoco de deferência ao governo brasileiro, especialmente considerando a pressão exercida por parlamentares republicanos próximos ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que defendiam a manutenção das sanções. Para esses setores, Moraes simbolizaria uma alegada perseguição ao bolsonarismo; já para o governo norte-americano, prevaleceu a lógica estratégica.

O gesto também tem impacto interno no Brasil. Desde que as sanções foram aplicadas, o governo Lula e o STF reagiram com firmeza, classificando a decisão como indevida, unilateral e baseada em informações distorcidas. A inclusão de um ministro do Supremo em uma lista de punições internacionais foi tratada como afronta à soberania brasileira e gatilho para um raro alinhamento entre Executivo e Judiciário. Com a retirada, auxiliares de Lula avaliam que se encerra um capítulo de tensão que havia potencial para provocar danos duradouros na relação entre os dois países.

Além disso, a decisão norte-americana ocorre em meio a um contexto de ofensiva coordenada do STF e das instituições brasileiras contra redes golpistas e campanhas de desinformação que culminaram nos ataques de 8 de janeiro de 2023. Moraes tem desempenhado papel central nesses processos, conduzindo investigações contra articuladores e financiadores da tentativa de ruptura institucional. As sanções haviam sido comemoradas por figuras da extrema direita brasileira e internacional como uma vitória política, na tentativa de deslegitimar as ações do Supremo.

A reversão dessas punições, contudo, enfraquece essa narrativa. Também reforça o posicionamento internacional do STF, que buscou apoio de entidades e cortes estrangeiras desde o episódio. A normalização do relacionamento com Washington tende a reduzir ruídos futuros e contribui para estabilizar a interlocução institucional.

Ainda que o governo Trump não tenha explicitado a relação entre a retirada das sanções e a recente reaproximação diplomática com Lula, fontes consultadas pela imprensa brasileira afirmam que o processo de revisão foi acelerado após conversas diretas entre chanceleres e assessores de alto escalão. A Casa Branca reconhece o peso geopolítico do Brasil e vê na cooperação com Lula um instrumento para contrabalançar influências adversárias na região, especialmente no contexto de disputas entre EUA e China.

O impacto político da decisão também se estende ao cenário doméstico norte-americano. Trump, que busca ampliar sua base internacional de apoio e apresentar uma imagem de estadista capaz de reordenar alianças, utiliza o gesto como sinal de flexibilidade e pragmatismo, diferenciando-se do discurso mais agressivo adotado nos primeiros meses de seu governo.

Para o governo Lula, a retirada das sanções representa vitória diplomática e simbólica. É, ao mesmo tempo, um reconhecimento tácito da legitimidade das ações do STF e da necessidade de diálogo institucional entre as duas democracias. O episódio consolida a retomada do relacionamento bilateral em novos termos e sinaliza que a política externa brasileira recupera capacidade de articulação mesmo diante de um cenário internacional polarizado.

Eduardo Bolsonaro lamenta

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) recebeu com ‘pesar’ a notícia de que o governo dos Estados Unidos retiraram as sanções contra Moraes. Em uma nota postada no X, antigo Twitter, o deputado disse que a sociedade brasileira perdeu uma “janela de oportunidade” para “enfrentar seus próprios problemas estruturais”. Segundo ele, “a falta de coesão interna e o insuficiente apoio às iniciativas conduzidas no exterior contribuíram para o agravamento da situação atual”.

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