Bolsonaro vai ficar na Papuda? Ou na PF, como Lula? Entenda as diferenças

Lula cumpriu pena de 580 dias na sede da PF de Curitiba, vítima de uma prisão ilegal. Sobre Bolsonaro, condenação deve ser definitiva
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Presídio da Papuda, em Brasília, pode ser o próximo lar de Jair Bolsonaro. Foto: Wikicommons

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cumpriu pena de 580 dias na sede da Polícia Federal de Curitiba, em 2018, vítima de uma prisão ilegal. Agora, Jair Bolsonaro pode ser preso definitivamente na semana que vem por tentativa de golpe de Estado e outros crimes. As diferenças entre os dois processos são muitas tanto do ponto de vista jurídico quanto político. Lula ficou detido na sede da Polícia Federal de Curitiba; Bolsonaro, pode ir para o presídio da Papuda, em Brasília, ou para a PF da capital. Entenda na TVT News.

Bolsonaro: prisão definitiva e sem direito a recurso

No caso de Jair Bolsonaro, o cenário é completamente diferente. O ex-presidente é réu no STF por tentativa de golpe de Estado e conspiração contra as instituições democráticas, com base em ampla documentação, vídeos e depoimentos de aliados. O julgamento do “núcleo 1 do golpe” começa em 2 de setembro na 1ª Turma do Supremo, e deve envolver crimes como abolição violenta do Estado Democrático de Direito e associação criminosa.

Caso seja condenado, a prisão será após o trânsito em julgado de uma decisão da mais alta corte do país, que é a única instância possível para autoridades com foro privilegiado. Isso significa que não há mais recurso possível. Será uma prisão definitiva, legal e respaldada por decisão colegiada.

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Bolsonaro, já de tornozeleira, tenta se explicar para a imprensa. Foto Antônio Cruz / Agência Brasil

Onde Bolsonaro pode ser preso: Papuda ou sede da PF

Ministros do STF e autoridades da segurança pública avaliam dois locais possíveis para cumprir a eventual prisão:

  1. Centro Penitenciário da Papuda, em Brasília, onde há precedentes de autoridades com direito a sala especial, como ocorreu com Fernando Collor, preso em 2024.
  2. Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal, que já mantém uma cela preparada preventivamente para Bolsonaro, com estrutura semelhante à que foi usada por Lula.

Ambas as opções obedecem ao princípio da individualização da pena, considerando o status de ex-presidente e a necessidade de preservar sua integridade física. No entanto, há um componente político e estratégico: a permanência em unidade militar está descartada, pois poderia reativar movimentos de apoio extremista e acampamentos nas imediações de quartéis, como os que precederam os atos golpistas de 8 de janeiro.

O STF entende que manter Bolsonaro em um quartel, mesmo por razões de segurança, colocaria em risco a estabilidade institucional. A Papuda, por outro lado, enfrenta grave superlotação. Já a sede da PF é mais controlada, menos exposta e garantiria um tratamento similar ao dado a Lula, sem beneficiar nem punir indevidamente o ex-presidente.

Prisão preventiva, prisão em segunda instância e prisão definitiva

Há três tipos centrais de prisão que se aplicam em casos penais como os de Lula e Bolsonaro:

  • Prisão preventiva: medida cautelar, decretada antes da condenação, usada para evitar fuga, obstrução de Justiça ou risco à ordem pública. É temporária, depende de fundamentação concreta. Bolsonaro pode ser alvo desse tipo de prisão, caso o STF entenda que ele representa risco à investigação ou à ordem institucional.
  • Prisão após condenação em segunda instância (como ocorreu com Lula): foi aplicada com base em jurisprudência hoje superada. Não havia ainda decisão definitiva, e o caso ainda poderia ser revertido pelos tribunais superiores. O STF declarou essa forma de execução da pena como inconstitucional em 2019.
  • Prisão após trânsito em julgado no STF (caso Bolsonaro): é o fim do processo penal. Não há mais recurso, e a pena deve ser cumprida imediatamente. Como o STF é a instância máxima, uma condenação ali é definitiva e obrigatória.

Lula: prisão antecipada e ilegal, anulada anos depois

A prisão de Lula foi decretada por Sergio Moro em abril de 2018, após condenação no caso do triplex do Guarujá. A sentença havia sido confirmada em segunda instância pelo TRF-4. À época, a jurisprudência do STF permitia prisão após condenação em segunda instância, mesmo sem o trânsito em julgado, ou seja, mesmo com possibilidade de recurso aos tribunais superiores.

Mais tarde, essa jurisprudência foi revista, e o Supremo voltou a considerar que ninguém pode ser preso antes do fim do processo, exceto em casos de prisão preventiva. E, além disso, o STF anulou as condenações de Lula com base em dois fundamentos:

  1. Incompetência territorial da 13ª Vara de Curitiba: não era o juiz natural para julgar os casos, já que os fatos imputados não tinham relação com a Petrobras;
  2. Parcialidade de Sergio Moro, comprovada por diálogos vazados e pela condução atípica do processo, com atuação conluiada com a acusação, especialmente com o procurador Deltan Dallagnol.

Lula foi encaminhado à sede da Polícia Federal em Curitiba, uma decisão política, tomada por Moro, com a justificativa de “preservar a dignidade do cargo” e evitar riscos à integridade física do ex-presidente. A cela era, na prática, uma sala improvisada, individual, com cama, banheiro e TV. Moro optou por não colocá-lo em uma penitenciária comum, o que seria imprudente e perigoso, dado o perfil e a projeção do preso.

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Depois de 580 dias preso, Lula foi inocentado e, livre, concorreu e ganhou o terceiro mandato como presidente do Brasil. Lula subiu a rampa de braços com o povo brasileiro. Foto: Ricardo Stuckert

A exceção da prisão de ex-presidentes

Prisões de ex-presidentes são, por definição, procedimentos excepcionais. A Constituição prevê alguns cuidados específicos, como direito a cela especial ou prisão domiciliar por questões de saúde ou idade, como foi o caso de Collor, transferido para casa por ter Parkinson e 76 anos.

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Ex-presidente Collor foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Bolsonaro tem 70 anos e enfrenta problemas de saúde recorrentes, esofagite, gastrite, infecções pulmonares e crises de soluço que geram vômitos. A defesa pode usar esses elementos para pedir prisão domiciliar. No entanto, nenhum desses fatores impede a condenação, apenas pode afetar a forma de cumprimento da pena.

Justiça e o teste da democracia

A prisão de Lula foi um erro histórico, reconhecido pelo próprio STF. Usou-se a lei para fins políticos e afastou-se da imparcialidade judicial. Já a prisão de Bolsonaro, se confirmada, será o oposto: resultado de um processo regular, amplo e técnico, com base em provas públicas de que atentou contra a Constituição e o sistema eleitoral.

Mais do que punir um homem, a possível condenação de Bolsonaro será um marco: a democracia brasileira punindo quem a tentou destruir. E a comparação com o caso de Lula só reforça como o país amadureceu juridicamente, ao deixar de lado a perseguição política e reafirmar o Estado de Direito.

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