Governo brasileiro inicia processo formal contra sobretaxas impostas por Trump e articuladas com apoio da família Bolsonaro. Caso esbarra em impasse criado pelos próprios EUA no sistema de apelações da OMC desde 2019. Entenda na TVT News.
O governo brasileiro acionou formalmente, hoje (6), os mecanismos de solução de controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC) contra os Estados Unidos, em reação à imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros por Donald Trump.
A medida, considerada protecionista e discriminatória por autoridades brasileiras, atinge setores estratégicos da economia nacional e foi articulada com apoio político da família Bolsonaro, por alinhamento ideológico entre os dois políticos de extrema direita.
A solicitação de abertura de consultas foi enviada aos EUA e comunicada à OMC, marcando a primeira etapa formal de um processo contencioso. Trata-se de uma fase preliminar, com prazo de 60 dias para negociação direta entre as partes, antes que se inicie um painel de disputa. O objetivo, segundo o Itamaraty, é buscar uma solução consensual, evitando o prolongamento do litígio. No entanto, analistas alertam que o cenário é mais complexo.
EUA bloqueia a OMC
Desde 2019, os Estados Unidos bloqueiam a nomeação de juízes para o Órgão de Apelação da OMC, travando, na prática, o funcionamento do sistema de revisão de decisões, um pilar essencial do regime multilateral de comércio. Com isso, mesmo que o Brasil vença a disputa no painel inicial, os EUA podem recorrer indefinidamente, mantendo a punição em vigor sem consequência legal efetiva. Essa obstrução institucional, iniciada no primeiro governo Trump e mantida até hoje, é vista por especialistas como uma tentativa deliberada de enfraquecer o sistema multilateral de regras que antes os próprios norte-americanos ajudaram a criar.
Documentos e declarações de Trump e da família Bolsonaro, além de outras autoridades revelam que o Brasil foi especificamente incluído como alvo dos EUA por razões geopolíticas, como um ataque ao multilateralismo e à organização do Sul Global independente, sobretudo com as negociações do bloco do Brics.
O Brasil tentou por vias diplomáticas reverter as sobretaxas mas sem sucesso. Agora, a decisão de acionar a OMC marca uma mudança na postura da política externa brasileira, mais assertiva e comprometida com a defesa dos interesses nacionais e da soberania, mesmo diante de uma potência como os Estados Unidos.
A disputa ocorre em um momento de maior tensão comercial internacional e crescente questionamento da eficácia da OMC em um mundo cada vez mais marcado por medidas unilaterais e blocos econômicos regionais. Desde sua fundação, em 1995, a OMC foi o principal fórum para evitar guerras comerciais por meio da mediação de regras e sanções equilibradas. Mas o impasse gerado pelo bloqueio do seu órgão de apelação compromete essa função.
Pressão por multilateralismo
Ainda assim, diplomatas brasileiros consideram importante pressionar os EUA dentro do sistema multilateral, acumulando legitimidade política e jurídica para futuras retaliações, caso seja necessário. O Brasil já recorreu com sucesso à OMC em outros episódios, como nas disputas contra subsídios ao algodão e à cana-de-açúcar, e reforça agora seu compromisso com uma ordem internacional baseada em regras.
O caso também levanta debates sobre a herança diplomática do bolsonarismo, que abandonou uma política externa pragmática para se alinhar ideologicamente a líderes autoritários como Trump, sem retorno comercial ou estratégico tangível. A atual gestão busca reverter esse quadro, resgatando o protagonismo histórico do Brasil na OMC e em fóruns multilaterais.

Caso as consultas não resultem em acordo nos próximos 60 dias, o Brasil poderá solicitar a formação de um painel de arbitragem, que avaliará tecnicamente a legalidade das tarifas. Mesmo com o impasse no sistema de apelação, o processo servirá para documentar e isolar o comportamento abusivo dos EUA, além de consolidar alianças com outros países prejudicados por medidas similares.
Com o gesto, o Brasil envia um recado de que não aceitará passivamente medidas unilaterais que afetem sua economia, e continuará lutando pela revitalização de um sistema internacional justo, transparente e baseado em princípios do direito internacional.