O governo do Brasil, liderado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou nesta segunda-feira (28) um pacote de medidas contra Israel, em retaliação ao que classifica como crimes de guerra, violações “intoleráveis” dos direitos humanos e indícios “críveis” de genocídio contra a população palestina na Faixa de Gaza. Entenda na TVT News.
A ofensiva diplomática, jurídica, comercial e política foi detalhada pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, durante debates na sede da ONU, em Nova York.
“Gaza é onde casas, hospitais, escolas e locais de culto jazem em ruínas; onde mulheres e crianças são massacradas; onde jornalistas e trabalhadores humanitários são pegos no fogo cruzado. É também onde a essência da nossa humanidade está sendo enterrada”, declarou o chanceler, em um dos trechos mais contundentes de sua fala.
Medidas assinadas pelo Brasil
Entre as ações concretas já anunciadas, o Brasil vai:
- Ingressar oficialmente na ação apresentada pela África do Sul na Corte Internacional de Justiça (CIJ), que acusa Israel de genocídio com base na Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio.
- Investigar e impor controle rigoroso sobre produtos importados de assentamentos ilegais israelenses na Cisjordânia.
- Bloquear exportações brasileiras de produtos de defesa para Israel, reforçando decisão anterior que já havia barrado, por exemplo, a aquisição de 36 obuseiros Atmos pelas Forças Armadas brasileiras.
- Apoiar a criação de uma missão internacional de verificação liderada pela ONU, nos moldes do Comitê Especial contra o Apartheid, para monitorar o cumprimento do direito internacional.
- Oferecer suporte técnico à Autoridade Palestina, em áreas estratégicas de construção institucional.
- Assumir a presidência da Comissão Consultiva da UNRWA, a agência da ONU para refugiados palestinos.
- Reforçar a distinção entre críticas legítimas às ações do governo de Israel e o antissemitismo, em linha com as recomendações dos Relatores Especiais da ONU.
O Itamaraty também reafirmou a decisão de retirar o embaixador brasileiro de Tel-Aviv e recusar a acreditação de um novo embaixador indicado por Benjamin Netanyahu. A tendência, segundo o governo, é manter a relação bilateral no “nível mínimo possível”.
“Provação dos palestinos é o teste moral do nosso tempo”
Durante a sessão no plenário da ONU, Mauro Vieira voltou a defender o reconhecimento do Estado da Palestina como uma “obrigação moral” da comunidade internacional. Disse que a realidade vivida pelo povo palestino é marcada por “ocupação, discriminação sistemática, crimes de guerra, crimes contra a humanidade e, potencialmente, genocídio”.
Vieira citou imagens de crianças desnutridas e mortes em filas de distribuição de comida como exemplos dos horrores vividos em Gaza. Também denunciou “níveis sem precedentes” de violência por parte de colonos israelenses na Cisjordânia, mencionando o espancamento até a morte de um jovem palestino, o incêndio da Igreja de São Jorge e a profanação de um cemitério bizantino.
“Esses não são incidentes isolados, mas uma estratégia sistemática de desapropriação e punição coletiva”, declarou. “A provação dos palestinos é o teste moral mais urgente do nosso tempo. Ela desafia nosso compromisso com o direito internacional e a dignidade humana.”
Amorim defende endurecimento, mas sem rompimento
Assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, o ex-chanceler Celso Amorim afirmou que o Brasil deve adotar medidas severas no campo comercial, mas descartou o rompimento total das relações diplomáticas com Israel. Ele também cogitou a suspensão do acordo de livre comércio entre o Mercosul e Israel, apontando que o tratado não deveria permitir a venda de produtos oriundos de territórios ocupados ilegalmente — ainda que, segundo ele, a classificação técnica desses produtos seja “complexa” e mereça “análise mais rigorosa”.
Contexto
As decisões brasileiras ocorrem em meio à crescente pressão global sobre Israel, após mais de nove meses de genocídio contra civis. Estima-se que mais de 80 mil palestinos tenham morrido desde o início da ofensiva israelense, com a maioria das vítimas sendo mulheres e crianças.
No âmbito das Nações Unidas, há uma série de apelos por cessar-fogo e investigações independentes sobre crimes cometidos por ambos os lados do conflito. Com sua postura, o Brasil busca se posicionar de forma mais ativa na defesa do direito internacional humanitário e dos direitos humanos no Oriente Médio.