O movimento antivacina, que durante anos esteve restrito a grupos negacionistas, ganhou projeção ao alcançar o núcleo do governo Donald Trump. O Secretário de Saúde do governo, Robert F. Kennedy Jr., crítico histórico da imunização, tem promovido mudanças profundas, gerando apreensão entre especialistas, médicos e famílias. Confira mais em TVT News.

Kennedy, que relaciona vacinas ao autismo sem apresentar dados científicos confiáveis, assumiu o cargo no início do ano e rapidamente passou a imprimir sua marca. Em poucos meses, exonerou a diretora do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), Susan Monarez, que classificava as novas diretrizes como “anticientíficas e imprudentes”. Também reformulou o Comitê Consultivo de Vacinas, demitindo 17 integrantes e substituindo-os por aliados alinhados ao negacionismo. Muitos dos novos membros não tinham experiência técnica, o que, segundo críticos, explica a falta de clareza e a proliferação de estudos especulativos no órgão.
Estados Republicanos abraçam o negacionismo
As consequências dessas decisões se refletem nos estados governados por republicanos. Na Flórida, o governador Ron DeSantis anunciou que em 90 dias será suspensa a exigência de vacinas escolares contra hepatite B, catapora, influenza e pneumococos. No Texas, sob comando de Greg Abbott, uma lei já havia eliminado, em 2023, a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19. No Idaho, legisladores aprovaram recentemente a chamada “revisão da liberdade médica”, que, na prática, proíbe exigências de imunização em empresas e escolas.
Mais de uma dúzia de estados já apresentou projetos semelhantes, alguns mirando especificamente as vacinas de mRNA, usadas durante a pandemia. Essa tendência preocupa organizações médicas, que alertam para uma possível reversão de décadas de avanços no controle de doenças infecciosas.

A preocupação é confirmada pelos números. Em 2025, os Estados Unidos registraram 1.277 casos de sarampo — o maior número em mais de três décadas — segundo a Universidade Johns Hopkins. Mais de 60% ocorreram no Texas, epicentro da resistência às políticas de imunização.
Apesar da ofensiva política, a maioria da população se mostra contrária a flexibilizar a vacinação. Pesquisa da organização de saúde KFF revela que 80% dos pais norte-americanos defendem a obrigatoriedade das vacinas em escolas públicas, sinalizando que o discurso antivacina, embora barulhento, não tem apoio incondicional da sociedade.
Disputa interna no CDC
Esse embate ficou evidente na mais recente reunião do Comitê Consultivo de Vacinas, em Atlanta. O encontro, que deveria definir diretrizes sobre imunização infantil, foi marcado por dois dias de debates caóticos, acusações de censura, insultos e pressões de ativistas antivacina.

Decisões foram tomadas e revertidas em tempo recorde. A votação sobre a vacina contra hepatite B em recém-nascidos foi adiada indefinidamente. Quanto à cobertura contra sarampo, caxumba, rubéola e catapora, o comitê chegou a aprovar a manutenção pelo programa federal, mas voltou atrás, em um recuo inédito.
Alguns integrantes chegaram a sugerir que a aplicação fosse adiada para crianças de dois a três meses de idade. Especialistas alertaram que essa mudança deixaria recém-nascidos vulneráveis, já que até 16% das gestantes não têm registro de testagem para hepatite B.
Ao final, o comitê rejeitou a imunização de crianças menores de quatro anos, citando risco de convulsões.
A decisão foi recebida como vitória por Kennedy Jr., que já havia cortado quase US$ 500 milhões em projetos de vacinas de mRNA e reduzido protocolos contra a Covid-19, eliminando doses de rotina para crianças e gestantes. A expectativa é que a suspensão completa da vacinação contra o coronavírus seja o próximo passo.
Entre médicos, pesquisadores e pais, cresce o temor de que os EUA estejam abrindo caminho para o retorno de surtos de doenças antes controladas. Para muitos especialistas, a cruzada antivacina promovida pelo governo Trump representa não apenas um retrocesso científico, mas também um risco concreto à saúde pública.