Na última sexta-feira (18), o Sistema Elétrico Nacional (SEN) de Cuba entrou em colapso, causando um apagão que deixou os moradores da Ilha às escuras nos últimos quatro dias. Foram quatro grandes falhas que se sucederam, ao mesmo tempo em que a tempestade tropical Oscar vem atingindo a região, deixando ao menos seis mortos, até o momento. Ventos fortes e chuvas intensas derrubaram postes e fios, contribuindo para o agravamento da crise energética.
Desde então, o governo cubano vem empregando esforços para restabelecer o fornecimento de energia. Ainda nesta segunda (21), a operadora da rede elétrica informou ter restaurado a eletricidade em partes da capital Havana. Agora o governo aposta na constituição de microsistemas regionais de energia, até que SEN possa voltar a operar adequadamente.
Nas províncias do oeste da ilha, incluíndo a região da capital, o restabelecimento de energia já atingiu 95% dos domicílios. No centro de Cuba, os índices de restabelecimento estão em torno de 40% a 60%. Mais a leste, há provícias com o fornecimento quase completamente restabelecido, mas no extremo-sul, a situação ainda é crítica, com apagões e fornecimento insuficiente.
De acordo com Dayron Roque Lazo, membro da Secretaria Operacional da ALBA Movimientos, educador popular do Centro Martin Luther King em Cuba e membro do Grupo de Pesquisa América Latina, Filosofia e Axiologia do Instituto de Filosofia de Havana, o agravemento do embargo dos Estados Unidos a Cuba é a principal causa da crise energética que vem assolando a Ilha nos últimos anos.
“As causas fundamentais de porque há termoelétricas fora de serviço e a falta de combustíveis estão na política de bloqueio dos EUA contra Cuba, a qual vem impedindo nos últimos anos de contar com financiamentos necessários. Não é só ter o dinheiro, mas também tê-lo a tempo para poder pagar aos fornecedores e assim fazer chegar os combustíveis há tempo nas plantas geradoras”, afirmou o secretário da ALBA Movimientos.
Trump e Biden
Em conferência de imprensa nesta quarta (22), em São Paulo, recém-chegado de Cuba, Roque Lazo anotou que a demanda energética diária da Ilha atuamente gira em torno de cerca de 3.200 Megawatts. A maior parte é fornecida por plantas termelétricas movida a combustíveis. Estes, por sua vez, chegam a Cuba em petroleiros, já que os cubanos não contam com produção petrolífera desenvolvida.
Contudo, desde o governo Donald Trump ampliou às sanções a Cuba, aumentando punições a instituições financeiras que executassem transações com os cubanos. Além disso, também ampliou restrições a entrada de viajantes estrangeiros nos Estados Unidos que tenham visitado a ilha. Juntou-se a isso, campanhas mídiaticas para desacreditar as políticas de cooperação médica que a Cuba estabelece com países ao redor do mundo, principalmente da América Latina e do Cariba.
Nesse sentido, as diretivas adotadas por Trump representaram uma guidada em relação à postura adotada por Barack Obama, que promoveu uma reaproximação e distencionamento com Cuba, principalmente após a morte do líder revolucionário Fidel Castro. Essa aproximação, no entanto, foi uma exceção, frente a décadas de isolamento promovido por mais de cinco décadas de embargo econômico. Joe Biden, por sua vez, deu prosseguimento às políticas trumpistas, em vez de promover uma volta à distenção.
Desse modo, as condições econômicas em Cuba se agravaram principalmente por conta da redução da chegada de turistas na ilha caribenha, bem como a diminuição da exportação de serviços médicos, que garantiam as divísas externas necessárias para manter o funcionamento da sociedade cubana. O cenário ainda foi agravado pela pandemia de covid-19, que atingiu a região, restringindo mais ainda o fluxo de turistas.
“Se comparar as fontes de ingresso da economia cubana, há uns cinco ou seis anos, vamos verificar que a venda de serviços profissionais, como o turismo e serviços médicos sobretudo, constitua uma das principais fontes de entrada de recursos”, afirmou Roque Lazo.
“Asfixia” e “genocídio”
Para ele, o reforço do embargo norte-americano faz parte de uma política de “asfixia e genocídio” contra o povo cubano. Ele afirma que os Estados Unidos vêm trabalhando para “torpedear” as transações financeiras da Ilha, que já não conta com a possibilidade de obter crédito junto a organismos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional, por exemplo.
Desse modo, Roque Lazo faz alusão ao Memorando Mallory, publicado pelo então subsecretário assistente de Estado para Assuntos Interamericanos, Lestor Mallory, em 6 de abril de 1960, ainda durante a presidência de Dwight D. Eisenhower. O funesto documento, desclassificado nos últimos anos, serviu como base ideológica para o embargo. Ele estabelecia que a melhor maneira para provocar uma mudança de regime na ilha seria através de medidas políticas e econômicas que capazes de levarem a fome e o desespero ao povo cubano. “A política dos Estados Unidos, desde então, está focada nessa direção”, frisou o militante político.