O mercado de trabalho dos Estados Unidos (EUA) deu novos sinais de fragilidade nesta sexta-feira (5), com a divulgação dos números de agosto pelo Departamento de Estatísticas do Trabalho (BLS, na sigla em inglês). A taxa de desemprego subiu para 4,3%, o maior patamar desde 2021, enquanto a criação de postos de trabalho foi bem inferior às expectativas do mercado. Além disso, revisões para baixo nos meses anteriores revelaram que, em junho, o emprego encolheu pela primeira vez desde 2020, durante a pandemia. O cenário reforça a percepção de estagnação da maior economia do mundo.
Em agosto, foram criados apenas 22 mil empregos formais, muito abaixo das estimativas que giravam em torno de 150 mil. O resultado se soma às revisões que mostraram que os números anteriores estavam inflados. A revelação de que houve retração em junho foi considerada simbólica, pois interrompeu um ciclo de crescimento contínuo que vinha sendo sustentado desde a retomada pós-Covid-19.
O novo relatório ganhou contornos ainda mais dramáticos porque ocorre após a crise política provocada pela demissão da comissária do BLS, Erika McEntarfer, no mês passado. A exoneração, ordenada pelo presidente Donald Trump, foi um episódio sem precedentes e representou um ataque direto à autonomia do órgão responsável pelas estatísticas oficiais. Trump alegou, sem apresentar provas, que os dados de julho teriam sido “manipulados” para prejudicar sua administração. A decisão abalou a credibilidade institucional e passou a ser interpretada por analistas como um prenúncio de turbulências maiores no mercado de trabalho.
A reação imediata ao relatório foi paradoxal. Apesar do sinal de fraqueza da economia, as bolsas de valores ao redor do mundo registraram altas. Em Wall Street, os principais índices fecharam no azul, enquanto na Europa e na Ásia também houve ganhos. No Brasil, o Ibovespa avançou impulsionado por ações de commodities e bancos. O motivo da euforia foi a interpretação de que o Federal Reserve (Fed), banco central americano, pode ser obrigado a cortar juros já nas próximas reuniões para tentar reaquecer a economia. Juros mais baixos favorecem ativos de risco e tendem a atrair capital para países emergentes.
Para especialistas, porém, a preocupação de fundo não pode ser ignorada. A desaceleração no ritmo de contratações está se espalhando por setores estratégicos. Serviços e tecnologia, que vinham sustentando parte do dinamismo, perderam força. Já a indústria e a construção civil acumularam perdas, reflexo de custos mais altos e de uma demanda em queda. Como a taxa de participação da força de trabalho permaneceu estável, a alta no desemprego reflete de fato a menor capacidade da economia em absorver trabalhadores.
Entre as causas apontadas para o enfraquecimento do mercado de trabalho, está o tarifaço imposto por Trump desde o ano passado, com sobretaxas sobre importações vindas de países como China, México e Brasil. A medida, vendida como mecanismo para “proteger empregos americanos”, acabou elevando preços de insumos, pressionando a inflação e corroendo a competitividade das empresas nacionais. O resultado foi uma redução nos investimentos produtivos e na demanda por trabalhadores, exatamente o oposto do que o governo prometia.
O cenário é agravado pelo efeito retardado da política monetária. O Fed manteve juros altos por longo período para tentar domar a inflação, e agora a restrição de crédito começa a se refletir no consumo das famílias e na capacidade de investimento das empresas. Endividados, os lares americanos estão gastando menos, enquanto companhias seguram contratações e ampliam demissões.
A sequência de fatos — desde a demissão de McEntarfer até os números decepcionantes de agosto — revela uma economia que pode estar entrando numa fase de estagnação mais profunda. Economistas lembram que, embora o desemprego ainda esteja em patamar relativamente baixo em termos históricos, a reversão da tendência positiva é um alerta claro. “Não se trata apenas de uma oscilação pontual. Estamos diante de sinais de que a economia americana perdeu fôlego estrutural”, avaliou um pesquisador ouvido pela imprensa internacional.
O relatório do BLS escancara, portanto, não só a fragilidade do mercado de trabalho, mas também a instabilidade política em torno da condução da economia nos Estados Unidos. Ao colocar em xeque a credibilidade das estatísticas oficiais e insistir em políticas tarifárias que ampliam custos e alimentam a inflação, Trump pode estar pavimentando o caminho para uma crise mais profunda.