Mausoléu de Castelo Branco será centro cultural dedicado à memória e à justiça 

Governo cearense quer resgatar a história do período da ditadura e promover reflexões sobre os anos de repressão
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Inaugurado na década de 1970, o projeto é formado pelo Palácio da Abolição, o Gabinete de Despacho, a Capela e o Monumento e Mausoléu do Presidente Castelo Branco. Foto: GLandovsky/ Creative Commons Attribution-Share Alike 4.0

Fortaleza transforma mausoléu de Castelo Branco em centro cultural dedicado à memória, à verdade e à justiça . Confira mais em TVT News.

Conjunto Palácio da Abolição, antiga sede do governo do Ceará e local onde está o mausoléu de Humberto de Alencar Castelo Branco, primeiro presidente do regime militar no Brasil (1964-1985), passará por uma transformação significativa. O espaço, que também abriga a Pinacoteca do Estado e o Museu da Imagem e do Som, será remodelado para se tornar um centro cultural dedicado à memória, à verdade e à justiça.

A iniciativa faz parte de um esforço do governo cearense para resgatar a história do período da ditadura militar e promover reflexões sobre os anos de repressão no país. 

Inaugurado na década de 1970, o projeto é formado pelo Palácio da Abolição, o Gabinete de Despacho, a Capela e o Monumento e Mausoléu do Presidente Castelo Branco. Foto: GLandovsky/ Creative Commons Attribution-Share Alike 4.0

A mudança ganhou força após a divulgação do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), em 2014, que documentou violações de direitos humanos ocorridas entre 1964 e 1988. O projeto também se insere em um contexto de retomada de investimentos na cultura após os cortes promovidos durante o governo Bolsonaro, que, em 2023, apoiou uma tentativa de golpe com participação de militares ligados ao período ditatorial. 

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Pinacoteca do Ceará: um marco no resgate histórico 

Um dos destaques desse processo de resgate cultural é a Pinacoteca do Ceará, localizada em um complexo que antes abrigava uma estação de trem do século XIX, abandonada por décadas e revitalizada como espaço cultural. Além da pinacoteca, o local conta com um mercado de alimentos e um centro de design, tornando-se um polo de arte e cultura acessível à população. 

Atualmente, a Pinacoteca exibe a exposição “Minha Vida em Dois Mundos”, que celebra a trajetória da fotógrafa Claudia Andujar. Durante a década de 1970, Andujar viveu por 14 meses com os Yanomami, povo indígena brutalmente reprimido pelos militares. A exposição reúne registros experimentais de rituais, aldeias e xamanismo, além de destacar o aspecto político de seu trabalho, interrompido à força pelas autoridades da época. 

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Claudia Andujar. Maloca dos Korihana thëri, Catrimani, da série A Casa (1974 – 1976). Foto: Pinacoteca do Ceará

Outra exposição em destaque é “Que País é Esse?”, do fotojornalista e cineasta Jorge Bodansky. A mostra retrata a destruição ambiental, os conflitos sociais e os impactos das grandes obras promovidas pelos militares na Amazônia durante os anos 1970. Com fotografias, vídeos e um diário de bordo, Bodansky expõe as ambições do regime e suas consequências devastadoras para o bioma e as comunidades locais. 

Resgate da memória e justiça 

Em entrevista ao jornal espanhol El País, o pintor e diretor geral da Pinacoteca, Rian Fontenele, destacou a importância de ampliar o acesso à cultura no Ceará, um estado com desafios socioeconômicos. “Nosso objetivo é a mediação, abrindo portas para a cultura. Somos um estado pobre. Este museu não é para artistas ou pesquisadores, é para aqueles que nunca estiveram dentro de um museu”, afirmou. 

Fontenele também ressaltou o papel dos museus como espaços de resgate da memória, capazes de questionar versões hegemônicas da história e promover reflexões sobre o presente. “O Brasil, diferentemente da Argentina, anistiou os responsáveis pela ditadura e só recentemente um general quatro estrelas foi preso pela primeira vez”, lembrou, referindo-se a um ex-ministro de Bolsonaro acusado de conspiração golpista. 

Sobre a remodelação do mausoléu de Castelo Branco, o governo do Ceará realizou uma audiência pública para ouvir propostas da sociedade civil. Participaram antropólogos, ativistas da memória, como os Aparecidos Políticos, sobreviventes da repressão, artistas e representantes de grupos indígenas e LGBT+. A ideia é que o novo espaço reflita a luta por memória, verdade e justiça, temas que devem estar presentes em cada ponto da cidade. 

O Palácio da Abolição também carrega uma história de resistência anterior à ditadura. No local, estivadores de Fortaleza se recusaram a embarcar africanos escravizados em navios, contribuindo para que o Ceará abolisse a escravidão em 1884, quatro anos antes do restante do Brasil. 

A transformação do Conjunto Palácio da Abolição em um centro cultural representa um passo importante no resgate da história e na democratização do acesso à arte no Ceará. Ao mesmo tempo, o projeto reforça a necessidade de enfrentar o passado e promover justiça, garantindo que as gerações futuras conheçam e reflitam sobre os erros e acertos da história brasileira. 

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