O atacante boliviano Miguelito Terceros, do América-MG, foi preso no último domingo (4), em Ponta Grossa (PR), durante o jogo válida pela sexta rodada da Série B do Campeonato Brasileiro. Ele é acusado de injúria racial contra o jogador Allano, do Operário-PR. Entenda em TVT News.
Aos 30 minutos do primeiro tempo, Allano procurou o árbitro Alisson Sidnei Furtado para relatar que havia sido alvo de ofensas racistas por parte de Miguelito. A partida foi paralisada conforme o protocolo antirracista, mas retomada 16 minutos depois.
A denúncia de Allano ocorreu após uma disputa de bola, quando os jogadores aguardavam um arremesso lateral. Neste momento, Miguelito virou em direção ao atacante do Operário, que partiu para cima dele junto com Jacy, também do fantasma.
De acordo com a denúncia, o jogador do América-MG teria dirigido a expressão “Preto do c***” ao atleta do Operário.
Na súmula, o árbitro afirmou que ninguém presente em campo ou na equipe de arbitragem ouviu as ofensas. Miguelito continuou jogando até ser substituído no intervalo.
Após o fim do jogo, o atacante boliviano foi preso em flagrante por injúria racial pela Polícia Civil do Paraná. Allano e o volante Jacy, que testemunhou em favor do colega, também foram levados à 13ª Subdivisão Policial de Ponta Grossa.
Nesta segunda-feira (5), o Ministério Público do Paraná determinou a soltura de Miguelito e o jogador vai responder em liberdade. Ele alega inocência.
Manifestações oficiais dos envolvidos:
O América-MG informou que está prestando assistência ao jogador Miguelito e reforçou seu “compromisso inabalável no combate ao racismo”.
“O atleta Miguel Terceros, acusado de injúria racial durante a partida do último domingo (4), contra o Operário, em Ponta Grossa, no Paraná, prestou depoimento e os esclarecimentos necessários junto à autoridade policial, negando a prática do delito, e retorna ainda hoje para Belo Horizonte.
O América confia na palavra de seu atleta e está oferecendo todo o suporte para auxiliá-lo neste caso.
O Clube reafirma seu compromisso inabalável no combate ao racismo. Esses valores são inegociáveis, e o América Futebol Clube repudia veementemente qualquer ato de preconceito e discriminação.”
Já o Operário-PR, afirma que não tolera nenhum tipo de discriminação e e está atrás de imagens para comprovar a situação.
“O Operário Ferroviário Esporte Clube repudia com veemência qualquer ato de racismo. Durante a partida de hoje (04), diante do América-MG, o nosso atleta Allano relatou ter sido vítima de ofensas racistas por parte do jogador Miguelito, da equipe adversária. O clube está buscando as imagens e demais elementos que possam confirmar os fatos e tomará todas as medidas cabíveis diante da gravidade da situação.
Reforçamos que o Operário está prestando todo o suporte necessário ao atleta Allano e seguirá firme em seu compromisso com a luta contra o racismo, dentro e fora de campo. Não vamos tolerar nenhuma forma de discriminação.”
O jogador Allano se manifestou por meio de nota nas redes sociais, dizendo que “não vai se calar”.

A Federação Boliviana de Futebol se posicionou nesta segunda-feira (5) em defesa de Miguelito. Em nota, a entidade disse que tomou conhecimento da situação e expressou o “respaldo institucional” ao jogador.
“A Federação Boliviana de Futebol informa à opinião pública que tomou conhecimento da situação legal enfrentada por nosso jogador da seleção nacional, Miguel Terceros, atualmente no Brasil, em razão de uma denúncia por supostos atos de racismo ocorridos durante uma partida válida pela Segunda Divisão do futebol brasileiro.
Desde a FBF, expressamos nosso respaldo institucional ao jogador neste momento difícil, reafirmando nossa confiança no respeito ao devido processo, ao direito à defesa e à presunção de inocência, pilares fundamentais de todo sistema de justiça.
O Eng. Fernando Costa, presidente da Federação Boliviana de Futebol, entrou em contato com a família do jogador e com seu entorno para oferecer todo o apoio e acompanhamento necessários.
Da mesma forma, entrou em contato com o representante do atleta para coordenar as ações legais cabíveis e, nas próximas horas, estabelecerá comunicação com o Consulado Boliviano no Brasil e com as autoridades competentes da Confederação Brasileira de Futebol.
Como entidade máxima do futebol boliviano, reafirmamos nosso firme compromisso com a luta contra toda forma de discriminação, racismo ou violência, tanto dentro como fora dos campos de jogo, em consonância com os princípios promovidos pela CONMEBOL, pela FIFA e por nossa regulamentação interna.
Reiteramos nosso apoio institucional ao jogador, na expectativa de que os fatos sejam esclarecidos conforme a lei.“
A CBF (Confederação Brasileira de Futebol), publicou uma nota oficial, afirmando que encaminhou a súmula da partida ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), para realizar a apuração rigorosa do caso.
“A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) reafirma seu compromisso inabalável na luta contra o racismo no futebol. Em conformidade com sua política de tolerância zero a qualquer forma de discriminação, a entidade orienta todos os árbitros a acionarem o protocolo da CBF em casos de agressões racistas, como ocorreu no último domingo (4) na partida entre Operário-PR e América-MG, pela Série B do Campeonato Brasileiro, em Ponta Grossa.
A CBF informa que já encaminhou a súmula da partida ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), órgão responsável por conduzir uma apuração rigorosa para assegurar a devida responsabilização dos envolvidos.
Reiteramos que o futebol é um espaço de respeito, inclusão e igualdade, e que ações firmes continuarão sendo tomadas para erradicar o racismo em nosso esporte. Não há espaço para o preconceito nos campos ou na sociedade.”
O que é o protocolo antirracismo da CBF?
A CBF lançou, no ano passado, o novo protocolo Antirracista para o futebol brasileiro, seguindo o modelo já existente implementado pela Fifa.
Em todos os jogos de futebol em território nacional, sempre que houver algum episódio de racismo, os jogadores poderão sinalizar diretamente ao árbitro que estão sendo alvos de abuso racista, com um gesto de cruzar os braços na frente do peito.
A partir do gesto, o árbitro será obrigado a iniciar o procedimento, que ocorre em três etapas:
Na primeira etapa, o árbitro deve interromper imediatamente a partida. Na segunda, caso o abuso continue, a partida será suspensa, com os jogadores e os dirigentes deixando o campo de jogo. Na terceira e última etapa, caso os atos permaneçam, a partida será abandonada.
O gesto foi aprovado por unanimidade no 74º Congresso da FIFA em Bangkok, na Tailândia, no início de 2024. O gesto global de braços cruzados para sinalizar abuso racista se tornou parte do protocolo do futebol quando foi implementado na Copa do Mundo Feminina Sub-20 de 2024, na Colômbia.

Etapas do protocolo:
- Jogador deve cruzar os braços na frente do peito, indicando ao árbitro o episódio;
- Árbitro deve interromper a partida e aguardar os atos encerrarem;
- Caso os atos permaneçam, jogadores e dirigentes deixarão o gramado;
- Caso os atos não encerrem, a partida será suspensa.
Qual a diferença entre racismo e injúria racial?
O que caracteriza a injúria racial são ofensas direcionadas à honra de uma pessoa específica, com base em elementos como raça, cor, etnia, religião ou origem. Em geral, está associada ao uso de palavras preconceituosas e depreciativas com a intenção de ofender individualmente.
Já o crime de racismo ocorre quando o agressor atinge um grupo ou coletivo de pessoas, discriminando uma etnia ou raça de forma geral — como impedir acesso de um grupo a estabelecimentos ou negar vagas de emprego com base na cor da pele.
Em janeiro de 2023, o presidente Lula sancionou a lei que equipara a injúria racial ao crime de racismo, tornando-a imprescritível e inafiançável. A nova norma também cria a figura da injúria racial coletiva, que ocorre quando a honra de alguém é ofendida por conta de raça ou etnia dentro de um grupo.
A medida acompanha o entendimento já adotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconhece a injúria racial como uma forma de racismo, com base no artigo 5º, XLII, da Constituição Federal.
Desta forma, ao invés de reclusão de um a três anos e multa, a punição para racismo é de prisão por dois a cinco anos. Caso o crime seja cometido por duas ou mais pessoas, a pena será dobrada.
Principais diferenças:
- Antes da nova lei:
- Injúria racial: crime afiançável e prescritível.
- Racismo: crime imprescritível e inafiançável.
- Com a nova lei:
- Ambos são imprescritíveis e inafiançáveis.
- A injúria racial passa a ter punição mais severa, com pena de dois a cinco anos de prisão.
- Se for cometida por duas ou mais pessoas, a pena pode ser dobrada.
Exemplos de injúria racial:
- Usar palavras ofensivas para atacar a cor da pele de alguém.
- Chamar alguém por termos racistas com a intenção de humilhar.
Exemplos de racismo:
- Recusar atendimento a um grupo em um restaurante.
- Negar o acesso de pessoas negras a espaços sociais ou elevadores.
- Impedir a contratação de funcionários com base em etnia.
A nova legislação representa um avanço no combate ao racismo no Brasil, fortalecendo a responsabilização penal por ofensas individuais e coletivas de cunho discriminatório.