Julgamento de Bolsonaro reacende ameaça de novas sanções dos EUA

O temor é que Trump anuncie novas penalidades comerciais em tempo real, conforme STF julga ex-presidente por tentativa de golpe
Ao impor tarifaço, Trump alegou suposta "perseguição" a Bolsonaro. Alan Santos/PR

O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, que começa nesta terça-feira (2) no Supremo Tribunal Federal (STF), acontece sob a sombra de uma escalada nas tensões diplomáticas com os Estados Unidos. O governo Lula considera “provável” que a gestão de Donald Trump faça novas sanções econômicas ao Brasil. Leia em TVT News.

Governo avalia é provável virem novas sanções dos EUA

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva avalia como “provável” que a gestão de Donald Trump, reeleito no ano passado, aprove o início do processo para impor novas sanções econômicas ao Brasil. O movimento seria uma continuação do tarifaço anunciado em agosto, que atingiu setores estratégicos da indústria nacional.

Segundo interlocutores do Planalto, o cenário de “sanções em tempo real” é levado em consideração, já que a Casa Branca acompanha com atenção o julgamento e pode anunciar medidas punitivas caso a Corte avance para a condenação de Bolsonaro. A leitura é que Trump, aliado histórico do ex-presidente brasileiro, considera o processo no STF uma perseguição política.

Bolsonaro responde por incitar e organizar a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, quando seus apoiadores invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília. O processo deve se estender por semanas, com transmissão pública e ampla repercussão internacional. De acordo com o Brasil de Fato, diplomatas norte-americanos já sinalizaram que qualquer decisão judicial contrária ao ex-presidente será acompanhada de respostas políticas imediatas.

Para o governo Lula, o risco não é apenas econômico. O temor é que as sanções sejam utilizadas por Trump como instrumento de pressão em negociações multilaterais, em especial na Organização Mundial do Comércio (OMC) e em fóruns climáticos. O Brasil busca ampliar acordos de exportação de commodities agrícolas, mas pode enfrentar barreiras adicionais se a escalada tarifária se confirmar.

O tarifaço de agosto já trouxe consequências severas. A sobretaxa de 25% sobre o aço brasileiro, por exemplo, afetou diretamente a indústria siderúrgica, que exporta grande parte da produção para os EUA. Produtos do setor químico, papel e celulose e têxteis também foram atingidos, aumentando a pressão sobre empresários e trabalhadores.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) estima que as medidas podem retirar até R$ 20 bilhões da economia brasileira neste semestre. “Se houver um segundo pacote, o impacto será ainda mais devastador, principalmente em regiões altamente dependentes da exportação”, afirmou um dirigente empresarial ao UOL.

Diante do cenário, Lula e o Itamaraty articulam uma ofensiva diplomática. O governo pretende acionar parceiros estratégicos da União Europeia, China e países latino-americanos para denunciar o caráter “politicamente motivado” das sanções de Trump. Fontes do Planalto destacam que o Brasil vai recorrer a instâncias multilaterais para tentar barrar o endurecimento tarifário.

Ao mesmo tempo, ministros avaliam estratégias para blindar a economia nacional. Entre elas, o fortalecimento do mercado interno, linhas emergenciais de crédito para empresas exportadoras e incentivos à diversificação de destinos comerciais.

Bolsonaro como fator de instabilidade

Especialistas citados pela BBC lembram que o julgamento de Bolsonaro transforma o ex-presidente em um vetor de instabilidade não apenas na política brasileira, mas também nas relações exteriores. A proximidade entre Bolsonaro e Trump, construída durante o mandato do republicano entre 2017 e 2021, agora ressurge como ponto de atrito entre Brasília e Washington.

Para analistas, a eventual condenação pode ser explorada por Trump para reforçar sua narrativa de perseguição a aliados conservadores. Isso explicaria o risco de medidas punitivas imediatas, em linha com a estratégia de “solidariedade internacional à direita radical”.

O Planalto, contudo, aposta que a repercussão global de um endurecimento de Trump contra o Brasil possa gerar resistência até mesmo entre parceiros tradicionais dos EUA. Líderes da União Europeia, por exemplo, já manifestaram preocupação com a ofensiva tarifária de agosto e podem se contrapor a um novo pacote.

Ainda assim, o clima é de cautela. O julgamento de Bolsonaro no STF deve dominar o noticiário internacional, e cada passo do processo poderá influenciar diretamente o ritmo da diplomacia e da economia brasileira. Para o governo Lula, o desafio será administrar simultaneamente a delicada situação política interna e a crescente pressão externa, em um momento em que a agenda econômica busca retomada do crescimento e reindustrialização.

Se a Casa Branca confirmar novas sanções, o Brasil entrará em um período de incerteza ainda maior, no qual o futuro de Bolsonaro e o destino de setores inteiros da economia nacional estarão entrelaçados no mesmo tabuleiro de disputas políticas globais.

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