Conspirações, Nova Ordem Mundial (NOM), globalismo, terraplanismo, comunidade antivacina (antivax), medicamentos sem comprovação off label (cloroquina contra covid-19), apocalipse, repitilianos e criaturas. Estes temas viraram corriqueiros dentro de certos grupos – que coincidem apoiadores de correntes políticas autoritárias – nos últimos anos. Temas absurdos, que antes eram mais restritos, ganharam voz amplificada por redes sociais como o Telegram e o X (antigo Twitter). Agora, um compilado massivo de estudos que analisou mais de 27 milhões de conteúdos conspiratórios busca dar luz a estas mentiras que correm pelo esgoto da internet.
“Um destes estudos, por exemplo, é sobre terra plana; o que dizem as comunidades de terraplanismo no Telegram. Outro é sobre Nova Ordem Mundial, QAnon, um tipo de teoria da conspiração importado dos Estados Unidos. Mesmo método, mas olhando para comunidades diferentes. Tem os grupos de antivacina, tem os repitilianos que acreditam que répteis dominam o mundo. Alguns são mais nocivos, sobre saúde pública. Tem algumas comunidades abertamente nazistas que fazem releituras e atrelam esquemas de dominação mundial”, explica o autor destes materiais, o pesquisador Ergon Cugler.
Maior estudo do gênero
Cugler tem uma ampla produção acadêmica, com mais de 500 artigos, ensaios e palestras. Vinculado ao Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), é mestre pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e MBA em análise de dados pela Universidade de São Paulo (USP). O compilado dos estudos de Cugler ganhou o título de “Conspiracionismo no Brasil em Números”.
Basicamente são sete estudos publicados internacionalmente reunidos. “Tem bastante texto, gráfico, conteúdo. Então resolvi fazer um material mais visual. Dediquei uma página para resumir cada um dos sete textos. Então, trabalhamos em um material de divulgação científica, já que os estudos somam 390 páginas, é bem aprofundado. Com tranquilidade, é a maior base de informações sobre comunidades e teorias da conspiração do país. Por isso resolvi elaborar um panorâma geral sobre o que está acontecendo. Isso desde 2016. A pandemia, por exemplo, amplificou as teorias da conspiração no Brasil”, completa.
Mentiras e desinformação
Apenas no Telegram, o estudo identificou 2.2 milhões de usuários presentes em comunidades conspiratórias no Brasil. São mais de 850 canais e grupos, categorizados em 15 temas. O período do estudo compreende 100 meses. Então, Cugler começou este estudo em maio de 2016.
As categorias das teorias da conspiração são: anticiência; anti-woke e gênero; antivacinas; apocalipse; conspirações gerais; globalismo; medicamentos off label; mudanças climáticas; Nova Ordem Mundial; ocultismo e esoterismo; OVNI e universo; QAnon; repitilianos e criaturas; revisionismo e ódio; terraplanismo.
Já os temas que mais mobilizam pessoas e engajamento são: antivacinas; conspirações gerais; Nova Ordem Mundial; ocultismo e esoterismo; medicamentos off label; e terraplanismo.
Paralelos conspiratórios
Vale pontuar que existem relações entre estes grupos de mentiras. Por exemplo, aqueles que compartilham de ideias sobre ocultismo e esoterismo possuem tendência a indicar comunidades sobre medicamentos off label. São drogas como cloroquina e ivermectina, amplamente divulgadas e incentivadas contra a covid-19 pelo ex-presidente radical Jair Bolsonaro (PL).
“As comunidades de Ocultismo e Esoterismo circularam 7.367 convites para que os seus membros pudessem ingressar em comunidades de medicamentos off label. Também, tais comunidades direcionaram 2.774 convites para que os seus membros conhecessem as comunidades de Ocultismo e Esoterismo”, revela o estudo.
Então, o estudo também revela uma importante evolução destas teorias de mentiras e desinformação durante a pandemia. O aumento na disseminação destes conteúdos disparou 290%. “As comunidades brasileiras de teorias da conspiração no Telegram nos revelam uma tração a partir de 2016, a qual se intensificou em excesso durante a Pandemia da COVID-19. Esse ambiente pertinente para a disseminação
de desinformações foi alimentado por uma rede autoreferenciada e interdependente — evidenciado pelos 27 milhões de conteúdos e mais de 2,2 milhões de usuários identificados.”