Milei diz que “mandou prender” Cristina Kirchner

Milei foi denunciado criminalmente por abuso de autoridade após admitir que ordenou a prisão da ex-presidenta Cristina Fernández de Kirchner
milei-vai-retirar-argentina-da-oms-anuncia-porta-voz-argentinos-criticam-oms-por-quarentena-na-pandemia-foto-jorge-william-g20-tvt-news
“Sou o primeiro presidente que tomou a decisão de que ela fosse presa”, afirmou Milei Foto: Jorge William/G20

O presidente da Argentina, Javier Milei, foi denunciado criminalmente por abuso de autoridade após admitir, em rede nacional, que ordenou a prisão da ex-presidenta Cristina Fernández de Kirchner. Trata-se de um episódio ditatorial na Argentina, que evidencia uma Justiça corrompida pela extrema direita. Entenda na TVT News.

A declaração, feita durante entrevista ao jornalista Luis Majul no canal LN+, acendeu o alerta sobre a independência do Judiciário argentino e gerou uma onda de críticas de juristas, políticos e analistas.

“Sou o primeiro presidente que tomou a decisão de que ela fosse presa”, afirmou Milei, ao comentar sobre denúncias contra o deputado José Luis Espert, acusado de ligações com o narcotraficante Fred Machado. A frase, dita ao justificar que estaria sendo alvo de uma “operação de vingança” da oposição, implicou uma confissão pública de uso político do sistema judicial para perseguir adversários.

Milei contra a lei

O advogado de Cristina Kirchner, Gregorio Dalbón, moveu uma denúncia penal com base no artigo 248 do Código Penal argentino, que prevê punição a agentes públicos que ordenem atos contrários à Constituição ou às leis. Para Dalbón, a declaração de Milei “não é uma opinião política: é a admissão de um ato de poder ilegal, uma decisão manifesta contrária à ordem constitucional e à independência do Poder Judiciário”.

Dalbón também citou o artigo 366, inciso b, do Código Processual Penal Federal da Argentina, que autoriza a revisão de sentenças judiciais quando se comprova influência externa no processo. “Se um chefe de Estado reconhece ter influenciado em um processo judicial, torna-se evidente a ilegitimidade da prova e da sentença, mesmo que já tenha transitado em julgado”, afirmou o advogado.

O jurista foi além: “Essa denúncia não busca apenas punir um crime, mas defender o Estado de Direito e a separação dos poderes, diante de um presidente que, publicamente, se arroga o direito de encarcerar uma dirigente opositora”. Segundo Dalbón, as palavras de Milei evidenciam que “o lawfare existiu, que a perseguição foi política, e que ele a endossa”. “Confessou que a Justiça não é independente. Confessou que a prisão de Cristina foi política. Confessou que o poder segue usando o Código Penal como arma. E essa confissão, em qualquer país sério, bastaria para iniciar um processo de impeachment contra o presidente.”

Durante a entrevista, o jornalista Majul ainda tentou contornar a gravidade do comentário: “Mas o senhor não interfere com a Justiça…”, disse, interrompendo o presidente, que já havia se comprometido com a declaração polêmica.

A repercussão política foi imediata. O ex-embaixador e candidato a deputado Ricardo Alfonsín cobrou explicações: “Milei deve explicar o que ele poderia ter feito para que a presidenta fosse ou não presa. Que artigo da Constituição lhe confere essa competência?”, questionou. Para ele, o mais alarmante é que “a sociedade já acredita que a Justiça não é independente da política, mas nunca antes um presidente foi tão explícito”.

O prefeito de Lomas de Zamora, Federico Otermín, também reagiu. Para ele, a fala de Milei é “gravíssima” e evidencia “a decisão deliberada de usar o poder contra a principal dirigente da oposição”, além de mostrar como “este governo está colocando em risco a democracia e as instituições”.

“Milei é um homem quebrado”

O episódio se soma a um contexto político tenso, em que denúncias de corrupção, crise econômica e instabilidade institucional desenham um cenário caótico às vésperas das eleições legislativas. Em editorial no programa La Mañana, o jornalista Víctor Hugo Morales afirmou que o governo Milei chega a outubro de 2025 “sem nada a oferecer”.

“O tipo que supostamente dirige o capítulo está falhado. É um homem quebrado, um pobre tipo que provoca lástima por ele e por nós”, disparou o jornalista. Em sua análise, o presidente comanda um governo “mendigo”, que clama por ajuda aos Estados Unidos enquanto encobre seus escândalos com shows e distrações.

Segundo Morales, o entorno do presidente é composto por “narcos, capitães de uma nave offshore, vendedores de bônus, embusteiros de criptomoedas e delirantes que desprezam as pessoas com deficiência”. E completou: “Os vencedores do sistema perderam o controle. Milei foi demais. A primavera é uma paleta de opacidades, uma canção triste, um título que já não pode nos enganar”.

A denúncia de Dalbón agora abre um novo capítulo de tensão institucional na Argentina. Com a oposição fortalecida por declarações que reforçam o uso político do Judiciário, cresce a pressão para que o Congresso examine a conduta do presidente. “Só nos resta um dia dos noventa que faltam”, escreveu Morales, encerrando seu editorial. “E ele tem nome. Chama-se vinte e seis.”

Assuntos Relacionados