Milei isolado: Senado argentino impõe derrotas ao ultraliberal

O governo do presidente argentino Javier Milei sofreu duas derrotas no Senado sobre o financiamento de universidades e da Saúde infantil
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: “O ‘não há dinheiro’ era uma desculpa. Agora está claro que é uma questão de prioridades", disse senadora opositora de Milei. Foto: Wiki Communs/Reprodução

O governo do presidente argentino Javier Milei sofreu nesta quarta-feira (2) duas derrotas no Senado, que rejeitou por ampla maioria os vetos presidenciais às leis que garantem o financiamento das universidades públicas e a declaração de emergência em pediatria, incluindo proteção ao Hospital Garrahan. Ambas as medidas agora se tornam leis automaticamente, obrigando o Executivo a promulgá-las. Entenda na TVT News.

A votação escancarou a fragilidade política do oficialismo libertário no Congresso: foram 58 votos a 7 contra o veto ao financiamento universitário e 59 votos a 7 contra o veto à emergência pediátrica. A rejeição exige maioria qualificada de dois terços dos senadores presentes, índice amplamente superado.

A sessão também foi marcada por duras críticas à política econômica do governo, denúncias sobre a militarização do país sem aval do Congresso, e o aprofundamento do escândalo envolvendo José Luis Espert, presidente da Comissão de Orçamento da Câmara e aliado de Milei, citado por ligações com o narcotráfico.

Governo Milei frágil

O governo Milei, que conta com uma base extremamente reduzida no Parlamento, ficou novamente isolado. Apenas os cinco senadores libertários votaram com o Executivo, acompanhados por Carmen Álvarez Rivero (PRO-Córdoba) e Francisco Paoltroni (Formosa). Três senadores da antiga aliança Juntos por el Cambio se abstiveram, Alfredo de Angeli, Martín Goerling e Victoria Huala, numa movimentação vista como alinhada ao ex-presidente Mauricio Macri, que voltou a dialogar com Milei.

Analistas veem nas derrotas no Senado um retrato da opção do governo por romper pontes com potenciais aliados, numa estratégia que agora cobra seu preço. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos pressionam o governo argentino por maior estabilidade institucional, como condição para um novo apoio financeiro internacional.

Números expõem Milei

Durante os debates, senadores da oposição desmentiram a retórica oficial do “não há dinheiro”. O senador Wado de Pedro (Unión por la Patria) afirmou que o orçamento enviado por Milei às universidades prevê 4,9 bilhões de pesos, enquanto os reitores estimam a necessidade real em 7,3 bilhões. De Pedro denunciou ainda que o governo abriu mão de US$ 1,5 bilhão em impostos para sete exportadoras de grãos, valor suficiente para financiar a educação de milhões de argentinos.

Já o senador Martín Lousteau, da UCR, ironizou: “Gastaram US$ 1,7 bilhão em três dias para tentar atrair dólares das cerealeiras. Isso pagaria 12 anos de orçamento do Hospital Garrahan. Mas dizem que não há dinheiro”.

A senadora Guadalupe Tagliaferri, do PRO, também criticou o governo: “O ‘não há dinheiro’ era uma desculpa. Agora está claro que é uma questão de prioridades. A verba apareceu não para os aposentados ou pessoas com deficiência — mas por causa da eleição”.

Conflito entre Poderes

O governo já havia promulgado a Emergência em Deficiência, mas decidiu suspender sua aplicação alegando ausência de fontes de financiamento, argumento rebatido por Lousteau, que lembrou que outros projetos do Executivo, como o Regime Penal Juvenil, autorizam o Gabinete a remanejar recursos.

A postura do governo acirrou a tensão entre os Poderes. O Senado aprovou por 54 votos a rejeição ao Decreto 681/25, que promulga a Emergência em Deficiência mas adia sua implementação. O líder da bancada Unión por la Patria, José Mayans, criticou duramente: “O que corresponderia aqui é uma moção de censura ao chefe de Gabinete. O governo não respeita a divisão de poderes”.

Apesar das críticas, a oposição ainda não possui votos suficientes para derrubar o chefe de Gabinete, mas promete manter a pressão política.

Soberania

A sessão também discutiu o decreto de Milei que autorizou o ingresso de tropas dos EUA e o envio de militares argentinos ao Chile sem aval do Congresso, o que, segundo a senadora María Eugenia Duré (Unidad Ciudadana), fere a Constituição. A oposição pediu a anulação do decreto.

Outro tema polêmico foi a tentativa de privatização da Nucleoeléctrica, estatal que opera as usinas nucleares do país. A oposição denunciou que o governo quer vender 49% do sistema nuclear argentino. “Estão roubando o futuro da nossa soberania energética. O programa nuclear está paralisado e nossos cientistas estão passando fome”, acusou Mayans. A proposta para declarar a empresa “não enajenável” não obteve os dois terços exigidos, mas voltará à pauta.

Milei, escândalo e crise

Enquanto enfrentava o Congresso, o governo também foi abalado por novas denúncias contra José Luis Espert, deputado e principal candidato da coligação La Libertad Avanza na província de Buenos Aires, acusado de ligações com o narcotráfico. Apesar das suspeitas, Espert segue presidindo a Comissão de Orçamento e Fazenda, órgão central na tramitação da Lei Orçamentária de 2026.

A combinação de crise política, isolamento legislativo, escândalos e confrontos com o Congresso acende alertas internacionais. Em meio a um cenário de incerteza, o risco país subiu a 1.264 pontos, enquanto o dólar permaneceu estável e os mercados oscilaram ao sabor das decisões dos Estados Unidos.

Com a promulgação obrigatória das novas leis e um Congresso cada vez mais hostil, Milei enfrenta o momento mais delicado de seu governo, em plena véspera das eleições de meio mandato e sob o olhar atento de aliados internacionais e adversários internos.

Com informações do portal Página12

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