Ministério lança pesquisa “Respeite Meu Terreiro”

Estudo inédito mapeia violências sofridas por comunidades de matriz africana e orienta formulação de políticas públicas de proteção; lançamento ocorreu nesse domingo (23)
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"Não são estatísticas frias, são vidas violadas, são casas sagradas feridas". Foto: Raul Lansky/MDHC

O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) anunciou, nesse domingo (23), o lançamento do resultado da pesquisa “Respeite Meu Terreiro”, durante o Seminário Nacional da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro), realizado em Brasília (DF). O estudo tem como objetivo mapear e identificar as violências sofridas pelos povos de matriz africana, além de orientar a formulação de políticas públicas de proteção. Leia em TVT News.

A cerimônia contou com a presença da ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, do secretário nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, Alexandre da Silva, além de lideranças tradicionais e representantes de instituições parceiras.

Saberes e ancestralidade

Durante o evento, a ministra Macaé Evaristo destacou a relevância do estudo para a produção de políticas públicas baseadas em evidências e fundamentadas nos saberes ancestrais. “Esses números não são estatísticas frias, são vidas violadas, são casas sagradas feridas pelo racismo religioso. Produzir dados é produzir política, e essa é a única forma de produzir transformação ao lado de quem constrói saber ancestral”, afirmou.

Ela também reforçou que o enfrentamento ao racismo religioso é responsabilidade do Estado. “Não existe saúde em um país que autoriza o racismo religioso. Os povos de matriz africana sempre cuidaram do Brasil, e agora o Brasil precisa aprender e cuidar dos povos de matriz africana”, ressaltou.

A gestora nacional da Renafro, Mãe Nilce, também destacou que envelhecer nas tradições afro-brasileiras é patrimônio espiritual e político. “O envelhecimento dentro das religiões de matriz africana não pode ser visto apenas como declínio, mas como processo de acumulação de axé, de sabedoria ritual, de liderança espiritual e de guardiã de memórias vivas”, explicou.

Ela reforçou a importância da proteção à população idosa de terreiro. “Nossos anciãos são bibliotecas em movimento. Por isso, cuidar deles é zelar pela própria continuidade da tradição”, finalizou.

Dados do estudo

Com cooperação institucional com o MDHC, a pesquisa “Respeite o meu Terreiro”, realizada pela Renafro, em parceria com a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), o Ilê Omolu Oxum, além do apoio da Defensoria Pública da União e do Instituto Raça e Igualdade, contou com a participação de terreiros de todas as regiões do país, com ampla diversidade de tradições.

O material reúne análises sobre impactos na saúde física e emocional; dados sobre racismo religioso offline e online; perfil de agressores e ambientes de violência; indicadores regionais; sugestões de enfrentamento apresentadas pelas próprias lideranças; e orientações para denúncia e responsabilização.

Segundo o estudo divulgado, 77% dos terreiros entrevistados sofreram racismo religioso, e 74% das pessoas relataram ameaças ou destruição de casas sagradas. Apenas 26% conseguiram registrar boletim de ocorrência, indicando obstáculos persistentes no acesso à justiça.

A pesquisa apresenta ainda que:

  • 97% sabem o que é racismo religioso;
  • 80% dos integrantes já sofreram atos discriminatórios;
  • 52% sofreram racismo religioso na internet;
  • Ambientes digitais mais recorrentes: Facebook, Instagram, YouTube, TikTok e X (87%);
  • Principais agressores citados: evangélicos (59%), servidores públicos (10%), vizinhos (8%), usuários de redes sociais (6%).

Envelhecimento negro

Ainda no evento, o secretário nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, Alexandre da Silva, compôs o painel “Envelhecer na perspectiva da matriz africana no Brasil”, ao lado de representantes da Renafro e de órgãos, como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Em sua fala, Alexandre da Silva destacou a centralidade dos mais velhos na filosofia das religiões de matriz africana. “O mais velho da casa não é o que tem mais idade, mas sim é o que chegou primeiro, é quem tem mais experiência. Logo, esse saber das religiões de matriz africana pode transformar a forma como o Brasil enfrenta o idadismo”, explicou.

O secretário também refletiu sobre o impacto cumulativo do racismo na saúde da população negra. “Não envelhecer sendo uma pessoa negra — e ainda mais praticante de uma religião que sofre racismo — é morrer um pouquinho a cada vez que se sai de casa. Mas esse coletivo em que estamos hoje é uma grande estratégia para mudar esse cenário”, completou.

Agenda plural

A programação do seminário continua ao longo desta segunda-feira (24), com atividades dedicadas à formulação de estratégias para o enfrentamento ao racismo religioso, políticas de cuidado e valorização dos saberes tradicionais.

Conforme a agenda oficial, o encerramento contará com a participação da ministra Macaé Evaristo na Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, nesta terça-feira (25), em Brasília, reforçando o compromisso do MDHC com justiça racial, memória, reparação e protagonismo das mulheres negras.

Via MDHC

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