Nubank: a máscara caiu?

Nubank anuncia mudanças significativas no modelo de trabalho, com mais dias presenciais
nubank-a-mascara-caiu-tvt-news
O caso do Nubank é um retrato do tempo em que vivemos: corporações que se dizem modernas, mas reproduzem velhas práticas de poder. Foto: Reprodução

Por Neiva Ribeiro

Artigo da Presidenta do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região para a TVT News

Nubank: juros altos para crédito

O Nubank nasceu com o discurso da inovação e da modernidade, orgulhando-se de dar autonomia aos seus funcionários e facilidade aos seus clientes. Construiu um império com 107 milhões de clientes e faturamento de R$ 60,7 bilhões somente no segundo trimestre deste ano. A Nu Holdings, controladora do banco, é hoje a segunda maior empresa brasileira por valor de mercado, logo atrás da Petrobras, com capitalização em torno de US$ 79,2 bilhões.

Na teoria, o marketing do Nubank se apresenta como o de uma instituição que “simplifica a vida financeira das pessoas”, refletindo um modelo de negócios “focado no cliente e no uso da tecnologia para construir uma plataforma eficiente e de baixo custo”.

Mas, na prática, os números contam outra história: o crédito rotativo está em 13,38% ao mês e o crédito parcelado em 8,74% ao mês. Operações desse tipo são amplamente criticadas por gerar a temida “bola de neve” da dívida — justamente o tipo de armadilha que diz combater.

Outro episódio que evidencia a estratégia de crescimento e consolidação de poder do Nubank foi a aproximação com o ex-presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. A relação reforça o quanto a instituição financeira busca ampliar sua influência junto aos principais formuladores de política econômica do país.

Após deixar o comando do BC, Campos Neto passou a estreitar laços com o setor que antes deveria regular, o que acende o alerta sobre os limites éticos entre o público e o privado. Essa aproximação simboliza a lógica de um mercado que se retroalimenta: enquanto o Nubank expande sua presença e lucros, mantém portas abertas com quem, até pouco tempo atrás, tinha o papel de fiscalizá-lo.

Nubank vende imagem de inovação, mas não dialoga com trabalhadores

Na quinta-feira (6), o Nubank anunciou mudanças significativas no modelo de trabalho. A partir de 1º de julho de 2026, passará a adotar o regime presencial em dois dias da semana. Já em 1º de janeiro de 2027, a exigência será ampliada para três dias presenciais por semana — medida que deve atingir cerca de 70% do quadro de funcionários.

O anúncio foi feito em uma reunião que reuniu cerca de 7 mil dos 9,5 mil funcionários da companhia — a maioria deles conectados remotamente, via Zoom. Muitos reagiram com surpresa e descontentamento diante da mudança. Afinal, foram contratados para o regime remoto.

O resultado? Doze pessoas foram demitidas. Bastaram algumas críticas internas para que o banco “inovador” mostrasse sua verdadeira face: a da exigência de hierarquia e disciplina.

Uma instituição financeira que se apresenta como “não banco”, totalmente digital, sem uma única agência física, agora impõe o trabalho presencial. Uma empresa que prega liberdade, diversidade e espaço para a contestação, mas pune contestadores com demissão por “falta grave”.

Mas, afinal, o que é o Nubank? As contradições ficaram expostas. Vendem a imagem de inovação, mas não dialogam com seus próprios funcionários — tampouco com o movimento sindical.

O Sindicato foi pego de surpresa, assim como os trabalhadores, com o anúncio repentino do Nubank sobre o fim do modelo 100% remoto. A decisão foi comunicada sem um diálogo prévio, contrariando a cultura de transparência e autonomia que a empresa sempre afirmou valorizar. O Sindicato considera que mudanças dessa magnitude exigem escuta, planejamento e respeito à vida das pessoas envolvidas, especialmente àquelas que reorganizaram suas rotinas, moradias e famílias em função do regime remoto.

Na prática, a mensagem é clara: quem não quiser se adaptar, que saia — uma postura bem diferente da filosofia que a empresa sempre vendeu.

As primeiras reações dos trabalhadores foram de indignação. O Sindicato espera que, a partir de agora, o Nubank esteja disposto a ouvir as reivindicações que serão apresentadas nas mesas de negociação. Aliás, esse processo deveria ter começado justamente assim: com diálogo, escuta e respeito à representação sindical, garantindo uma negociação coletiva verdadeiramente democrática. A live do Nubank e os acontecimentos que se seguiram revelam o quanto é urgente retomar esse caminho, baseado na transparência e na valorização dos trabalhadores.

O episódio expõe uma contradição profunda entre o discurso e a prática. Empresas que se apresentam como inovadoras e humanas precisam entender que a verdadeira modernidade está no diálogo e no respeito aos trabalhadores. Nenhuma tecnologia substitui a escuta e a valorização das pessoas. O Sindicato dos Bancários de São Paulo seguirá exigindo respeito, transparência e negociação para garantir que direitos e dignidade não sejam atropelados pelo marketing corporativo.

O caso do Nubank é um retrato do tempo em que vivemos: corporações que se dizem modernas, mas reproduzem velhas práticas de poder. A inovação real não está na cor roxa, nos slogans ou nos aplicativos, mas na capacidade de construir relações justas, humanas e coletivas. Quando o lucro fala mais alto que a escuta, o futuro prometido se desmancha — e a máscara cai.

Sobre a autora

neiva-ribeiro-presidente-do-sindicato-dos-bancarios-tvt-news
Neiva Ribeiro, presidente do Sindicato dos Bancários

Neiva Ribeiro é a atual presidenta do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região. É formada em Letras pela Universidade Guarulhos, pós-graduada em Gestão Pública pela Fesp-SP, e em Gestão Universitária pela Unisal. É funcionária do Bradesco desde 1989. Ingressou na direção do Sindicato em 2000.

Foi diretora-geral da Faculdade 28 de Agosto de Ensino e Pesquisa, secretária de Formação e secretária-geral da entidade. 

Leia outros artigos de Neiva Ribeiro

Assuntos Relacionados