O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu nesta segunda-feira (22) na sede das Nações Unidas, em Nova York, o reconhecimento imediato do Estado Palestino. Lula acusou a comunidade internacional de inação diante da “limpeza étnica em tempo real” cometida por Israel em Gaza. O pronunciamento ocorreu durante a Conferência Internacional para a Solução Pacífica da Questão da Palestina, realizada paralelamente à 80ª Assembleia Geral da ONU. Saiba mais na TVT News.
Em seu discurso, Lula afirmou que o conflito no Oriente Médio tornou-se o “símbolo maior dos obstáculos enfrentados pelo multilateralismo” e criticou duramente o uso do direito de veto no Conselho de Segurança. Segundo ele, a “tirania do veto” inviabiliza decisões e sabota a própria razão de ser da ONU.
O presidente brasileiro reiterou que os fundamentos de um Estado vêm sendo “sistematicamente solapados” no caso palestino. “O direito de defesa não autoriza a matança indiscriminada de civis”, disse, ao condenar simultaneamente os ataques terroristas do Hamas e a resposta militar israelense.
Lula citou dados da ONU sobre a destruição de 90% dos lares em Gaza, o uso da fome como arma de guerra e o número de mais de 50 mil crianças mortas ou mutiladas. Para ele, trata-se de “extermínio do povo palestino e do aniquilamento de seu sonho de nação”.
Além das críticas, o presidente defendeu a adoção de medidas práticas: reforço no controle da importação de produtos de assentamentos ilegais e manutenção da suspensão da exportação de material de defesa para a região. Também demonstrou apoio à criação de um órgão específico da ONU, inspirado no comitê anti-apartheid, para supervisionar a questão palestina.
Lula recordou ainda que a partilha da Palestina, aprovada há 78 anos em uma sessão presidida pelo brasileiro Oswaldo Aranha, previa dois Estados soberanos. “Só um se concretizou. Efetivar o Estado palestino é uma questão de justiça e de reconstrução da credibilidade da ONU”, disse.
Leia o discurso de Lula na íntegra
Cumprimento o presidente Emmanuel Macron e primeiro-ministro Mohammed bin Salman por liderarem este importante processo.
A questão da Palestina surgiu no momento em que a Assembleia Geral adotou o chamado Plano de Partilha, há 78 anos.
A sessão em que ele foi aprovado foi presidida pelo brasileiro Oswaldo Aranha.
Naquela ocasião, nasceu a perspectiva de dois Estados. Mas só um se materializou.
O conflito entre Israel e Palestina é símbolo maior dos obstáculos enfrentados pelo multilateralismo.
Ele mostra como a tirania do veto sabota a própria razão de ser da ONU, de evitar que atrocidades como as que motivaram sua fundação se repitam.
Também vai contra sua vocação universal, bloqueando a admissão, como membro pleno, de um Estado cuja criação deriva da autoridade da própria Assembleia Geral.
Um Estado se assenta sobre três pilares: o território, a população e o governo.
Todos têm sido sistematicamente solapados no caso palestino.
Como falar em território diante de uma ocupação ilegal que cresce a cada novo assentamento?
Como manter uma população diante da limpeza étnica a que assistimos em tempo real?
E como construir um governo sem empoderar a Autoridade Palestina?
Como apontou a Comissão de Inquérito sobre os Territórios Palestinos Ocupados, não há palavra mais apropriada para descrever o que está ocorrendo em Gaza do que genocídio.
Por isso, o Brasil decidiu tornar-se parte do caso apresentado pela África do Sul à Corte Internacional de Justiça.
Os atos terroristas cometidos pelo Hamas são inaceitáveis. O Brasil foi enfático ao condená-los.
Mas o direito de defesa não autoriza a matança indiscriminada de civis.
Nada justifica tirar a vida ou mutilar mais de cinquenta mil crianças.
Nada justifica destruir 90% dos lares palestinos.
Nada justifica usar a fome como arma de guerra, nem alvejar pessoas famintas em busca de ajuda.
Meio milhão de palestinos não têm comida suficiente, mais do que a população de Miami ou Tel Aviv.
A fome não aflige apenas o corpo. Ela estilhaça a alma.
O que está acontecendo em Gaza não é só o extermínio do povo palestino, mas uma tentativa de aniquilamento de seu sonho de nação.
Tanto Israel, quanto a Palestina têm o direito de existir.
Trabalhar para efetivar o Estado palestino é corrigir uma assimetria que compromete o diálogo e obstrui a paz.
Saudamos os países que reconheceram a Palestina, como o Brasil fez em 2010. Já somos a imensa maioria dos 193 membros da ONU.
O Brasil se compromete a reforçar o controle sobre importações de assentamentos ilegais na Cisjordânia e manter suspensas as exportações de material de defesa, inclusive de uso dual, que possam ser usadas em crimes contra a humanidade e genocídio.
Diante da omissão do Conselho de Segurança, a Assembleia Geral precisa exercer sua responsabilidade.
Apoiamos a criação de um órgão inspirado no Comitê Especial contra o Apartheid, que teve papel central no fim do regime de segregação racial sul-africano.
Assegurar o direito de autodeterminação da Palestina é um ato de justiça e um passo essencial para restituir a força do multilateralismo e recobrar nosso sentido coletivo de humanidade.
Obrigado.