Pejotização: STF convoca audiência pública sobre vínculos trabalhistas

Gilmar Mendes convocou audiência após suspender todos processos sobre vínculo e pejotização no Brasil. Entenda na TVT News
stf-para-as-consequencias-danosas-da-suspensao-da-tramitacao-dos-processos-judiciais-contra-fraudes-na-pejotizacao-foto-pixabay-tvt-news
STF assume o protagonismo para definir se é legal ou fraudulenta a pejotização. Foto: Pixabay

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), marcou para o dia 10 de setembro uma audiência pública para discutir os impactos da pejotização no Brasil. A medida acompanha a decisão do ministro de suspender todos os processos judiciais em curso que tratam do tema em tribunais do país. Entenda na TVT News.

A convocação acontece no contexto do reconhecimento da repercussão geral pelo Supremo, no chamado Tema 1389, o que significa que uma decisão futura da Corte servirá como orientação obrigatória para casos semelhantes em todo o Judiciário. Com isso, o STF assume o protagonismo para definir se é legal ou fraudulenta a pejotização, contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ) em situações que deveriam configurar vínculo empregatício.

No despacho em que convoca a audiência, Gilmar Mendes propõe uma série de questões centrais para o debate, como:

  • O que se entende por pejotização;
  • A dimensão do fenômeno na economia brasileira;
  • Os impactos sobre a arrecadação tributária e o sistema previdenciário;
  • Diferenças entre a tributação de pessoas físicas e jurídicas nesse contexto;
  • E os critérios legais para caracterizar vínculo de emprego em casos de contratação via PJ.

Entidades, especialistas e interessados em participar devem se inscrever até 10 de agosto, preenchendo formulário eletrônico com dados pessoais, currículo e proposta de exposição.

Autonomia e instância revisora

A decisão de suspender os processos foi justificada pelo ministro como uma resposta ao que considera um uso recorrente do STF como instância revisora das decisões da Justiça do Trabalho. Em seu despacho, Mendes afirma que, apenas no primeiro semestre de 2024, o Supremo julgou mais de 460 reclamações relacionadas à pejotização e proferiu 1.280 decisões monocráticas sobre o assunto.

“Conforme evidenciado, o descumprimento sistemático da orientação do Supremo Tribunal Federal pela Justiça do Trabalho tem contribuído para um cenário de grande insegurança jurídica”, afirmou Mendes.

Desde 2018, quando o STF declarou inconstitucional uma súmula do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que barrava a pejotização, a Corte tem se posicionado a favor da terceirização irrestrita, inclusive de atividades-fim. A decisão abriu caminho para que empresas contratassem trabalhadores via CNPJ mesmo em funções centrais de sua operação, o que vem sendo questionado pela Justiça do Trabalho e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

Debate da pejotização

De 2020 a março de 2025, mais de 1,2 milhão de ações trabalhistas sobre pejotização foram ajuizadas, segundo dados do MPT. Para o procurador Renan Kalil, coordenador nacional de combate às fraudes nas relações de trabalho do MPT, a pejotização é, em grande parte dos casos, uma tentativa de burlar a legislação.

“Ela ocorre quando alguém quer contratar um trabalhador que deveria estar com a carteira assinada, mas opta por formalizar a relação via CNPJ, para mascarar a relação de emprego”, afirmou Kalil em entrevista à Agência Brasil.

O procurador destaca que a contratação legítima de uma pessoa jurídica deve atender a três critérios básicos: transferência real da atividade à empresa contratada, autonomia na execução do trabalho e capacidade econômica da PJ. “Em geral, as relações pejotizadas não apresentam nenhuma dessas características”, completou.

Reação de magistrados e advogados

A decisão de Gilmar Mendes provocou reações no meio jurídico trabalhista. Magistrados, procuradores e advogados promoveram manifestações em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília no dia 7 de maio, em defesa da competência da Justiça do Trabalho para julgar essas questões e contra a paralisação dos processos.

A principal preocupação dos críticos é que a suspensão e a concentração da análise no STF possam enfraquecer a proteção social do trabalho e ampliar as brechas para fraudes contratuais que retiram direitos dos trabalhadores.

Uberização também está em pauta

A discussão sobre pejotização se aproxima de outro tema de grande relevância no mundo do trabalho: a uberização. O STF já reconheceu, em 2023, a repercussão geral do Tema 1291, que trata da existência ou não de vínculo de emprego entre motoristas de aplicativos e plataformas como a Uber. Esse processo está sob relatoria do ministro Edson Fachin e segue em paralelo à discussão conduzida por Gilmar Mendes.

Julgamento ainda sem data

O caso que servirá como referência (leading case) no Supremo envolve o reconhecimento de vínculo entre um corretor de seguros franqueado e uma grande seguradora. Mas Gilmar Mendes ressaltou que a tese a ser fixada terá alcance geral, envolvendo categorias diversas como advogados associados, representantes comerciais, profissionais da saúde, artistas, entregadores e trabalhadores da área de tecnologia.

Ainda não há data definida para o julgamento do tema pelo plenário do STF. Quando ocorrer, os ministros deverão decidir, entre outros pontos, se a Justiça do Trabalho é competente para julgar essas causas, se a contratação por PJ é legal à luz da decisão sobre terceirização de atividade-fim, e a quem cabe provar a existência de fraude nas relações contratuais.

Assuntos Relacionados