O conclave que se iniciou após a morte do Papa Francisco teve como resultado a eleição do cardeal Robert Francis Prevost como o novo líder da Igreja Católica. Escolhendo o nome Leão XIV, o primeiro papa nascido nos Estados Unidos promete um papado de sensibilidade pastoral adquirida em suas décadas de trabalho missionário na América Latina. Mas seu perfil também levanta questionamentos importantes sobre os rumos que a Igreja tomará em temas polêmicos como direitos LGBTQIA+, aborto e imigração. Entenda na TVT News.
O Papa das duas pátrias
Nascido em Chicago em 1955 e ordenado sacerdote na Ordem de Santo Agostinho, Prevost atuou como missionário no Peru nos anos 1980. Lá, ganhou fluência em espanhol e compreensão das tensões sociais e religiosas que marcam a América Latina, onde a fé se entrelaça com pobreza, injustiça e espiritualidade popular.
Foi essa vivência que lhe valeu o apelido de “pastor de duas pátrias”. Ainda que nascido no coração dos EUA, Prevost sempre manteve um olhar para o Sul Global. Como bispo de Chiclayo, destacou-se pelo contato direto com comunidades marginalizadas e por uma abordagem pastoral marcada pela escuta.
Da missão à cúpula
Desde 2023, Prevost ocupava o estratégico cargo de prefeito do Dicastério para os Bispos, órgão responsável por avaliar e nomear novos bispos no mundo inteiro. Foi um dos papéis mais influentes sob o pontificado de Francisco, e lhe proporcionou conhecimento profundo da maquinaria vaticana, além de dar visibilidade internacional à sua liderança.
Apesar disso, sua atuação nesse posto também gerou críticas. Em particular, sua participação em processos de investigação de abuso clerical foi vista como tecnicamente correta, mas pouco transparente ou sensível às vítimas. Esse aspecto deve ser observado com atenção por movimentos que exigem mais responsabilidade institucional da Igreja.
Temas polêmicos e o Papa
Apesar de ser considerado mais progressista dentro do espectro norte-americano do episcopado católico, Prevost mantém posições conservadoras em diversas áreas sensíveis.
LGBTQIA+
Em 2012, Prevost lamentou publicamente o que chamou de “banalização cultural” da homossexualidade, criticando “estilos de vida alternativos” e os modelos de “família não tradicionais”. Embora não adote o tom agressivo de setores mais reacionários, suas declarações e atitudes foram interpretadas como pouco acolhedoras por grupos católicos LGBTQIA+ e por teólogos que defendem maior inclusão.
Na prática, ele tem se mostrado alinhado com a postura tradicional da Igreja: acolher as pessoas, mas rejeitar condutas consideradas “incompatíveis” com a doutrina. A depender de como será seu discurso como papa, Leão XIV pode ampliar ou limitar o espaço de acolhimento pastoral aberto por Francisco.
Aborto
Sobre o aborto, Prevost é um defensor da linha ortodoxa tradicional, contrário a qualquer flexibilização. Como prefeito do Dicastério, incentivou a nomeação de bispos que compartilham da defesa intransigente da vida “desde a concepção até a morte natural”. Essa postura deve se manter inalterada sob seu pontificado.
Imigração
Aqui, no entanto, reside uma de suas posturas mais sensíveis e engajadas. Sua experiência com comunidades migrantes na América Latina moldou um olhar pastoral empático. Prevost defendeu, inclusive nos EUA, o acolhimento de migrantes, a crítica à criminalização da imigração e a necessidade de estruturas sociais e políticas mais humanas. Essa postura alinha-se diretamente com o legado de Francisco e pode ganhar mais centralidade sob Leão XIV.
Desafios à frente
Como primeiro papa norte-americano da história, Leão XIV carrega sobre os ombros uma ambivalência geopolítica. A tradição do Vaticano sempre evitou papas dos EUA para não associar a Igreja à superpotência global. Sua eleição rompe essa cautela histórica — e será observado com atenção redobrada, especialmente em temas como política externa, economia global e conflitos culturais.
Além disso, terá de lidar com uma Igreja polarizada, entre vozes que exigem reformas estruturais (inclusão de mulheres, revisão do celibato, maior sinodalidade) e forças conservadoras que querem restaurar uma autoridade doutrinária rígida.
Papa Leão XIV
Papa Leão XIV é, ao mesmo tempo, institucional e pastoral, firme e contemplativo, latino-americano por experiência e norte-americano por origem. Seu pontificado começa com esperanças e tensões: uma liderança espiritual que terá de provar se é capaz de dialogar com o mundo sem abrir mão de princípios, mas também sem sacrificar pessoas reais em nome de abstrações dogmáticas.
Como ele mesmo disse: “O bispo é chamado a caminhar com seu povo e a sofrer com ele.” Resta ver se, como papa, Leão XIV caminhará ao lado de todos os seus fiéis — inclusive daqueles que, até hoje, se sentiram fora da Igreja.