Setor audiovisual protesta contra PL da regulação do streaming

Proposta prevê taxa menor de contribuição para as plataformas
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Manifestação "Pega a Visão: Ato pelo VoD". Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

Cineastas, roteiristas, produtores e técnicos do audiovisual protestaram nesta segunda-feira (3) em diversas capitais em defesa do cinema brasileiro independente.  Os atos, batizados de “Pega a Visão: Ato pelo VoD”, são contra o Projeto de Lei 8.889/2017, que propõe a regulação das plataformas de streaming no Brasil.Entenda em TVT News.

As manifestações ocorreram simultaneamente em frente à sede da Ancine, no Rio de Janeiro, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, e no Cine Walter da Silveira, em Salvador.

De acordo com o movimento, o relatório do deputado federal, Dr. Luizinho (PP-RJ), sobre o projeto “representa um risco histórico de desmonte da indústria audiovisual nacional”, por contrariar o parecer técnico da Ancine e os consensos construídos com a sociedade civil, e favorecer grandes empresas estrangeiras do setor.

O relator propõe Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) máxima de 4% para o streaming e 70% do valor pode ser usado pelas próprias plataformas em projetos próprios. O texto prevê ainda cota mínima de 10% de obras nacionais nos catálogos.

A cineasta Lúcia Murat, integrante do Conselho Consultivo da Associação Brasileira de Cineastas (Abraci), classificou o projeto como uma distorção das demandas históricas da categoria. 

“Isso transforma a regulação numa espécie de ‘Lei Rouanet para os streamings’. É uma loucura — dinheiro público para companhias estrangeiras. Não pode passar”, disse, acrescentando ser uma ameaça diretamente a autonomia criativa e a sobrevivência das produtoras independentes.

A produtora Clarissa Guarilha, responsável pelo premiado filme Levante, destacou o impacto do projeto sobre a cadeia produtiva.

“Estão votando um projeto sem diálogo com quem faz o audiovisual. Isso afeta não só quem produz, mas todo mundo — quem trabalha, quem assiste, quem vive disso. O cinema independente é o que garante que nossas histórias sejam contadas por nós mesmos, sem depender de interesses de grandes corporações internacionais.”

Pesquisador do setor audiovisual, Pedro Butcher ressaltou que o texto atual não contempla as necessidades do mercado brasileiro.

“As plataformas ainda não contribuem para o desenvolvimento do setor, como todo o restante da cadeia faz. A falta de estabilidade e de financiamento ameaça o que conquistamos até aqui e pode levar a um grande retrocesso.”

São Paulo

Na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, o ato reuniu dezenas de profissionais. A cineasta Tatiana Lohmann, vice-presidente da Associação Paulista de Cineastas (Apaci), destacou que o texto “vem cheio de armadilhas e dubiedades”:

“As plataformas operam no Brasil sem transparência sobre lucros e remessas de receita. Esse PL precisa ser barrado para que possamos propor uma regulação justa”, afirmou, citando que o Brasil é o segundo segundo maior mercado da Netflix no mundo, mas que é preciso regras claras para investimento dessas plataformas. 

A cineasta Laís Bodanzky reforçou a importância de garantir 20% de obras nacionais nos catálogos das plataformas.

“Elas [plataformas] podem produzir o que quiserem com dinheiro privado, mas não têm o direito de decidir o que o Brasil tem a dizer através do audiovisual”.

Representando a Associação Brasileira de Autores Roteiristas (Abra), Paulo Marcelo destacou que a regulação do streaming é essencial para manter o ecossistema do setor equilibrado. “O importante é garantir que a Condecine abasteça o FSA [Fundo Setorial do Audiovisual] e que a cota seja de produção brasileira independente, com os direitos patrimoniais nas mãos de empresas nacionais”

A Carta-Manifesto do movimento — assinada por nomes como Anna Muylaert, Gabriel Mascaro, Laís Bodanzky, Jorge Furtado, Marieta Severo, Matheus Nachtergaele, Daniela Thomas e Joel Zito Araújo — diz que o projeto fragiliza o financiamento público, reduz a alíquota da Condecine e “coloca o futuro da produção audiovisual à mercê de empresas estrangeiras, esvaziando o papel da Ancine e do Estado brasileiro”.

Segundo nota técnica da Ancine e do Ministério da Cultura (MinC), o relatório pode provocar uma redução drástica nos recursos do FSA e abrir brechas para autodeclaração de receitas, dificultando a fiscalização. Além disso, permitiria que empresas estrangeiras criassem “produtoras nacionais” controladas no país, enfraquecendo a independência do setor.

As 12,5 mil produtoras independentes brasileiras pedem o adiamento da votação e a retomada das premissas do texto anterior, relatado pela deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que previa cota mínima de 20% de obras nacionais, Condecine de ao menos 6% e destinação prioritária dos recursos ao FSA.

O que diz o projeto

O projeto de lei prevê a cobrança da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) de serviços de streaming, como plataformas de vídeo sob demanda (VoD). A proposta pode ser votada nesta semana na Câmara dos Deputados. 

O deputado Doutor Luizinho (PP-RJ) tem dito que as alíquotas podem variar entre as plataformas de streaming e as redes sociais que compartilham vídeos.

No relatório, o parlamentar defende que o PL traz uma “proposição madura, que assegura equilíbrio entre um ambiente concorrencial justo, que estimula a livre iniciativa e a inovação tecnológica, e um ecossistema audiovisual dinâmico, que garante a soberania cultural, o desenvolvimento da produção de conteúdos brasileiros e regionais e a geração de emprego e renda no país”.

Por Agência Brasil.

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