“Somos África. As dificuldades e a esperança nos unem”, afirma Silvio Almeida

Durante a abertura da Conferência da Diáspora Africana nas Américas, ministros reforçaram a identidade e a luta que unem África e Brasil
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Começou hoje (29), em Salvador, a Conferência da Diáspora Africana nas Américas. Foto: Divulgação

Começou hoje (29) a Conferência da Diáspora Africana nas Américas. O evento que ocorre em Salvador pela União Africana, governo do Togo, em parceria com o Governo Federal e Governo do Estado da Bahia. A ideia é de reunir conhecimento e cultura de povos africanos e refletir sobre a Diáspora Africana, além de firmar identidade irmã entre o Brasil e a comunidade africana, através do pan-africanismo. “Somos também África. As dificuldades nos unem e a esperança também”, disse o ministro dos Direitos Humanos, o professor Silvio Almeida, durante a abertura do encontro que durará três dias.

Silvio é um dos pensadores mais relevantes do Brasil sobre a questão dos povos negros e do racismo cotidiano e estrutural. Em sua fala na abertura da Conferência, o professor lecionou de forma firme sobre os desafios dos povos irmãos africanos e americanos. Ele lembrou que o pensamento pan-africano considera, atualmente, a região da Diáspora (período da imigração forçada dos povos daquele continente por conta da agressão branca europeia) como parte da África.

“A relativamente recente anexação da região da Diáspora como a sexta região do continente africano muito nos honra”, disse Silvio. “Ela nos auxilia nessa busca pela verdade e justiça histórica em relação àqueles que hoje ainda sofrem com o racismo cotidiano e aquilo que outros, antes de mim, chamaram de racismo estrutural”, completou. Racismo estrutural que se manifesta de diferentes formas, como ele explicou. “Violência policial, falta de condições dignas de trabalho, precariedade habitacional, dificuldade de acesso a serviços básicos a quais todos têm direito (…) a chamada necropolítica.”

“Este é um evento de ressignificação, de reconfiguração da nossa noção de humanidade para que nós, filhos da diáspora, possamos fazer parte da humanidade que nos foi negada“, Silvio Almeida

Resistir e ressignificar

Então, Silvio lembrou que o evento sediado na capital baiana tem multiplos sentidos para os povos negros. “Este é um evento de ressignificação, de reconfiguração da nossa noção de humanidade para que nós, filhos da diáspora, possamos fazer parte da humanidade que nos foi negada. Negaram nossa condição humana. Portanto, este encontro é fundamental para este propósito.”

Ressignificar porque a história de violência também revela a força dos povos africanos. “São memórias sensíveis que registram períodos de desumanização e violência, mas também de resistência e luta que moldam nossa sociedade. Por meio do tráfico transatlântico, as Américas foram o maior destino de escravizados, o que fez com que a herança africana se tornasse fundamental na nossa constituição da cultura, da organização social e economia”, disse Silvio.

Então, o ministro sentenciou que toda essa produção intelectual deve servir ao propósito de trazer humanidade e dignidade. “Faz-se importante sublinhar que o resgate e cultivo desta memória não são apenas para criar repositório sentimental estático. Mas como elementos propulsores fundamentais para a transformação de nossos povos rumo à realização do direito ao desenvolvimento.”

Bandeira do pan-africanismo. Vermelho: o sangue. Preto: o povo. Verde: a terra

Vida e oportunidade

Ainda na esteira da ressignificação e luta do povo negro, falou a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Irmã de Marielle Franco, assassinada em razão de sua luta por justiça e dignidade, Anielle é exemplo de como o caminho para a ocupação de espaços de poder é árduo para vidas historicamente silenciadas.

“Se tem alguma coisa que aprendemos sendo filha de nordestina, irmã de Marielle, é o valor que a gente carrega. O que trazemos de luta, de história, ninguém tira. Se tem algo que o movimento negro sabe fazer neste país é, além de ressignificar a dor é entender aonde quer chegar. Essa é a maior grandiosidade deste momento”, disse.

Então, ela lembrou que “vidas são ceifadas e oportunidades são negadas. Mas corre sangue nas nossas veias e sabemos o tamanho da missão que carregamos. Para isso precisamos olhar para o futuro e saber o porquê de estarmos nesta missão. Missão que todos os dias nos faz levantar cedo para estarmos em um lugar que historicamente nos negam. Espaço que sabemos que precisamos construir.”

Pan-africanismo

A secretária estadual pela Promoção da Igualdade Racial da Bahia, Ângela Guimarães, foi a primeira a falar no início desta tarde. Ela antecedeu os ministros e fez uma apresentação sobre a relevância do pensamento pan-africanista, que orienta a conferência. “O pan-africanismo é muito mais do que uma corrente política ou filosófica. É a expressão concreta da nossa unidade enquanto povo, independente das fronteiras geográficas que nos separam. É a compreensão de que compartilhamos uma história comum de resistência, luta e conquista. Juntas somos mais fortes na busca por um mundo mais justo e equitativo. Somos uma alternativa viável de desenvolvimento para o Sul global. Carregamos a potência para este futuro comum.”

O Brasil, que possui a maior população afrodescendente fora da África e acumula duas décadas de políticas voltadas para a promoção da igualdade racial, foi convidado pelo Alto Comitê Ministerial da União Africana sobre a Década das Raízes Africanas e da Diáspora para sediar este encontro. “Este movimento pan-africanista tem raízes profundas que remontam ao final do século 19 com figuras emblemáticas que vislumbraram uma África livre e próspera livre das amarras do colonialismo e da exploração”, disse.

Assista à abertura do evento na íntegra

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