O Brasil chega à COP30, que começa no próximo dia 11 de novembro em Belém (PA), com uma proposta ambiciosa: colocar a taxonomia sustentável no centro da nova economia verde global. O termo pode soar técnico, mas seu impacto promete ser prático. Trata-se de um instrumento que, nas palavras do governo, funcionará como um “dicionário da sustentabilidade”, definindo com base científica e social o que pode (ou não) ser considerado sustentável. Entenda na TVT News.
Desenvolvida sob coordenação do Ministério da Fazenda, a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB) reúne critérios para classificar atividades econômicas, projetos e ativos financeiros alinhados às metas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, redução de desigualdades de gênero e raça e proteção ambiental. O decreto que instituirá a TSB será publicado nas próximas semanas, e sua adesão será voluntária, mas o governo acredita que ela se tornará referência tanto para o setor público quanto para o privado.
“Esperamos que seja um farol para atrair investimentos e incentivar empresas a adotarem práticas mais sustentáveis e inclusivas. É um marco para o desenvolvimento econômico e ambiental do país”, afirmou Cristina Reis, subsecretária de Finanças Sustentáveis do Ministério da Fazenda, em entrevista exclusiva.
Transformar a economia
A taxonomia define de forma clara e objetiva quais atividades e produtos realmente contribuem para o desenvolvimento sustentável. A ideia é acabar com a multiplicidade de critérios e evitar práticas de greenwashing, quando empresas se promovem como sustentáveis sem de fato adotar medidas reais.
Segundo Cristina Reis, mais de R$ 400 bilhões em títulos privados com rótulo “verde” circulam hoje no mercado brasileiro, mas cada um segue um padrão diferente. “Estamos propondo uma ferramenta para aproximar esses padrões e unificar a metodologia de avaliação. Eu diria que trata-se de uma abordagem ESG (Ambiental, Social e Governança) oficial, nítida e padronizada”, explicou.
Essa padronização pode ter efeitos diretos na vida das pessoas e das empresas. “A implementação da taxonomia vai orientar as empresas sobre como relatar, verificar e monitorar suas informações de sustentabilidade”, diz Reis. Para atender aos critérios, elas terão de adotar rotas tecnológicas mais limpas, reduzir emissões e promover equidade racial e de gênero em toda a cadeia produtiva.
O sistema financeiro, por sua vez, poderá oferecer incentivos mais vantajosos para produtos e projetos sustentáveis, criando um ciclo de investimento, inovação e geração de empregos de alta qualidade.
O caminho até Belém
A construção da TSB começou há mais de um ano e envolveu sociedade civil, órgãos reguladores, universidades e especialistas internacionais. O texto passou por consulta pública de quase cinco meses, recebendo mais de cinco mil contribuições. Em setembro de 2025, foi aprovado pelo comitê interinstitucional que coordena o Plano de Transformação Ecológica, um dos pilares da agenda climática brasileira.
O secretário de Política Econômica da Fazenda, Guilherme Mello, define a taxonomia como “um dos pilares fundamentais para aproveitar as oportunidades da economia sustentável”. Ele lembra que o governo está construindo um ecossistema de instrumentos verdes, como o mercado de carbono regulado, o Fundo Clima, o Eco Invest Brasil e os títulos soberanos sustentáveis.
A taxonomia será a base técnica e classificatória para todas essas políticas. “Ela define critérios para instrumentos como os Títulos Públicos Sustentáveis, o Eco Invest e as compras públicas. É estruturante: orienta tanto o setor público quanto o privado, como um farol da sustentabilidade”, disse Cristina Reis.
Super Taxonomia: o Brasil quer liderar a integração global
Na COP30, o Brasil levará o debate a um novo patamar com a proposta da Super Taxonomia, uma interoperabilidade global entre taxonomias nacionais. O objetivo é criar um sistema que permita comparar o nível de sustentabilidade de produtos e investimentos entre países, respeitando a soberania e as prioridades locais, mas garantindo transparência e parâmetros mínimos universais.
“A meta é facilitar a comparação entre taxonomias, valorizando suas diferenças e permitindo fluxos de financiamento mais eficientes e transparentes entre países”, explicou Cristina Reis.
A proposta brasileira defende o uso de salvaguardas internacionais, de direitos humanos, meio ambiente e biodiversidade — e atenção especial às micro, pequenas e médias empresas, para que a transição verde seja justa.
O tema foi debatido pela primeira vez entre os BRICS, em maio deste ano, e encontrou forte engajamento dos países parceiros. A expectativa é que a proposta entre na pauta oficial da COP30, especialmente nas discussões do Artigo 2.1(c) do Acordo de Paris, que trata do alinhamento dos fluxos financeiros à transição climática.
Investimento e empregos verdes
A interoperabilidade entre taxonomias, segundo Reis, “cria um ambiente de confiança que facilita o fluxo de capitais e parcerias para além das fronteiras”. Na prática, isso pode abrir novos mercados de trabalho e investimento em energia limpa, agricultura sustentável e bioeconomia, setores estratégicos para a Amazônia e para o Brasil.
“Ao estabelecer mecanismos de comparação e interoperabilidade, conectamos sustentabilidade a empregos de alta qualidade, capazes de gerar prosperidade”, afirmou a subsecretária.
Para investidores estrangeiros, o avanço brasileiro tem sido observado com entusiasmo. A União Europeia e a Alemanha já manifestaram apoio técnico e político à TSB, destacando o potencial do país como líder da transição verde global.
“O Brasil é um parceiro estratégico e tem um profundo compromisso com a Agenda 2030. A Taxonomia Sustentável Brasileira é uma ferramenta essencial para orientar atividades sustentáveis do ponto de vista ambiental e social”, declarou Petra Schmidt, chefe de Cooperação para Desenvolvimento Sustentável da Embaixada da Alemanha.
O que muda para o cidadão comum
Embora pareça um tema distante, a taxonomia pode afetar diretamente a vida das pessoas. Produtos, empresas e investimentos rotulados como “verdes” deverão seguir critérios objetivos, o que reduz o risco de engano e aumenta a transparência nas escolhas de consumo. Além disso, os novos investimentos estimulados pela taxonomia devem gerar empregos voltados à economia de baixo carbono, com foco em inovação, tecnologia e inclusão social.
Em outras palavras, a taxonomia ajuda a organizar o futuro do trabalho e da economia, direcionando recursos para atividades sustentáveis e deixando para trás práticas que degradam o ambiente e perpetuam desigualdades.
Paradigma verde
Mais do que uma norma técnica, a taxonomia é vista pelo governo como um instrumento de transformação. “Ela conecta sustentabilidade, inclusão e desenvolvimento econômico. É o tipo de política pública que ajuda o Brasil a cumprir sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) e ainda gera oportunidades para a população”, resume Cristina Reis.
A COP30, que será realizada pela primeira vez em território amazônico, promete ser o palco dessa nova ambição. O Brasil quer liderar um pacto global por uma economia sustentável, inclusiva e transparente, uma economia que fala, enfim, a mesma língua: a da sustentabilidade.
Resumo da Taxonomia Sustentável
A Taxonomia Sustentável Brasileira é um sistema que classifica quais atividades econômicas são sustentáveis. É um catálogo que identifica e define, com base científica e de forma objetiva, atividades econômicas, ativos e projetos que contribuem para objetivos ambientais, econômicos e sociais estabelecidos pela sociedade brasileira.
Conforme a definição da Associação Internacional de Mercado de Capitais (ICMA, 2021), a taxonomia estabelece critérios e indicadores que permitem avaliar se uma atividade promove a sustentabilidade e a transição para uma economia verde.
Por que a Taxonomia é importante?
A ferramenta orienta investidores e empresas na escolha de investimentos que realmente beneficiem o planeta e a sociedade, reduzindo os riscos do chamado “greenwashing” – prática em que empresas alegam adotar medidas sustentáveis, mas não as implementam de fato.
Uma taxonomia funciona como um instrumento estratégico para mobilizar e redirecionar fluxos de capital para investimentos essenciais no combate à crise climática.
Além disso, a Taxonomia Sustentável Brasileira:
- Ajuda o Brasil a cumprir seus compromissos internacionais de redução das emissões de gases de efeito estufa.
- Evita barreiras ambientais para exportações e investimentos internacionais ao dialogar com taxonomias de outros países.
- Responde aos desafios ambientais e sociais do país, alinhando-se a objetivos e planos prioritários nacionais.
Com esse sistema, o Brasil fortalece sua liderança na transição para uma economia sustentável, garantindo mais transparência e credibilidade no mercado financeiro verde.
A Taxonomia Sustentável do Brasil apresenta três objetivos estratégicos:
- Mobilizar e reorientar o financiamento e os investimentos públicos e privados para atividades econômicas com impactos ambientais, climáticos e sociais positivos, visando o desenvolvimento sustentável, inclusivo e regenerativo;
- Promover o adensamento tecnológico voltado à sustentabilidade ambiental, climática, social e econômica, com elevação de produtividade e competitividade da economia brasileira em bases sustentáveis;
- Criar as bases para produção de informações confiáveis dos fluxos das finanças sustentáveis ao estimular a transparência, a integridade e visão de longo prazo para a atividade econômica e financeira.
Dessa forma, busca-se induzir a ação coordenada entre os diversos agentes econômicos e criar mecanismos para o monitoramento deste esforço, de modo a efetivar a plena estratégia de transformação da economia.
Ademais, é válido destacar também, os objetivos climáticos e sociais que serão abordados pela taxonomia brasileira. Entre eles:
Objetivos ambientais e climáticos:
1. Mitigação da mudança do clima
2. Adaptação às mudanças climáticas
3. Proteção e restauração da biodiversidade e ecossistemas
4. Uso sustentável do solo e conservação, manejo e uso sustentável das florestas
5. Uso sustentável e proteção de recursos hídricos e marinhos
6. Transição para economia circular
7. Prevenção e controle de contaminação
Objetivos econômicos-sociais:
8. Geração de trabalho decente e elevação da renda
9. Reduzir desigualdade socioeconômicas, considerando aspectos raciais e de gênero
10. Reduzir desigualdades regionais e territoriais do país
11. Promover a qualidade de vida, com garantia de direitos e ampliação do acesso a serviços sociais básicos
Tais objetivos são essenciais para impulsionar uma economia mais verde e equilibrada, promovendo o desenvolvimento sustentável e o bem-estar da sociedade.
