X volta a funcionar no Brasil um dia após carta que denuncia ataques de Musk

Carta pede apoio pelo Brasil em defesa da democracia e contra a dominação das Big Techs
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X funcionando no Brasil? Entenda! Foto: AFP

Nesta semana foi divulgada a Carta Pública Contra o Ataque das Big Techs à Soberania Digital, texto que aponta os ataques do bilionário Elon Musk, dono do X, à soberania digital do Brasil. A denúncia foi publicada um dia antes do suposto desbloqueio da rede social no país, quase três semanas após a suspensão imposta pelo STF. Na carta, 53 intelectuais e pesquisadores, dentre eles brasileiros e estrangeiros, pedem para que “todos aqueles que defendem os valores democráticos” apoiem o país em sua busca pela soberania digital. 

A Carta Pública Contra o Ataque das Big Techs à Soberania Digital

O texto reforça que, ao ressaltar os objetivos de garantir o desenvolvimento tecnológico do Brasil — de forma que as Big Techs cumpram as leis locais e sejam responsabilizadas em caso de crimes cibernéticos —, o governo brasileiro virou alvo de ataques pelo proprietário do X, Elon Musk e a extrema-direita, que pregam uma liberdade de expressão irrestrita. 

A carta prevê que tais ataques antidemocráticos são um aviso alarmante ao Brasil e ao mundo: “países democráticos que buscam independência da dominação das Big Techs correm o risco de sofrerem interrupções em suas democracias, com algumas Big Techs apoiando movimentos e partidos de extrema-direita.

Em outro ponto, os pesquisadores denunciam o lobby feito pelas empresas de tecnologia contra o setor público e enfatiza que quando os interesses capitalistas das mesmas estão em risco, as empresas cooperam tranquilamente com governos antidemocráticos. 

Ainda segundo o texto, as ações antidemocráticas das grandes empresas de tecnologia infringem os direitos dos cidadãos brasileiros e sabotam as tentativas do Brasil de construir uma infraestrutura pública digital com governança de dados e serviços de nuvem, que possam fortalecer a soberania tecnológica do país. O manifesto solicita que o governo brasileiro não recue a frente dos ataques, permanecendo resoluto em suas decisões, e também que as nações desenvolvam princípios básicos para a regulamentação dos serviços digitais.

X voltou a funcionar no Brasil?

Em menos de um mês, o X, antigo Twitter, voltou a funcionar na manhã desta quarta-feira (18). Internautas notaram o retorno do aplicativo quando a linha do tempo da rede social voltou a atualizar com novas postagens e notificações. O suposto desbloqueio havia ocorrido apenas para alguns usuários e somente no aplicativo, mas já é possível acessar a versão para desktop. 

A Anatel informou que está investigando o desbloqueio. Já uma fonte do Supremo Tribunal Federal (STF) afirmou em nota para a agência de notícias Reuters, que a suspensão continua em vigor e que o desbloqueio se deve à “apenas uma instabilidade no bloqueio de algumas redes”. O X ainda não se manifestou sobre o caso. 

Por que o X foi bloqueado

O X foi suspenso pelo STF no Brasil após o descumprimento de decisões judiciais ligadas às investigações dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Além disso, a empresa de Elon Musk fechou seu escritório no país, contrariando o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), que obriga que as empresas que coletam dados em território nacional possuam um representante legal para responder pela companhia no Brasil. 

Confira a carta na íntegra e seus signatários:

Carta Pública Contra o Ataque das Big Techs à Soberania Digital

Nós, os abaixo-assinados, desejamos expressar nossa profunda preocupação com os ataques em andamento por parte das Big Techs e seus aliados contra a soberania digital do Brasil. A disputa do Judiciário brasileiro com Elon Musk é apenas o mais recente exemplo de um esforço mais amplo para restringir a capacidade das nações soberanas de definir uma agenda de desenvolvimento digital livre do controle de megacorporações sediadas nos Estados Unidos.

No final de agosto, o Supremo Tribunal Federal brasileiro baniu a plataforma X do ciberespaço brasileiro por não cumprir as decisões judiciais que exigiam a suspensão de contas que instigaram extremistas de direita a participar de motins e ocupar os palácios Legislativo, Judiciário e Governamental em 8 de janeiro de 2023.

Posteriormente, o presidente Lula da Silva deixou claro a intenção do governo brasileiro de buscar independência digital: diminuir a dependência do país de entidades estrangeiras para dados, capacidades de IA e infraestrutura digital, além de promover o desenvolvimento de ecossistemas tecnológicos locais. De acordo com esses objetivos, o estado brasileiro também pretende forçar as Big Techs a pagar impostos justos, cumprir as leis locais e ser responsabilizadas pelas externalidades sociais de seus modelos de negócios, que muitas vezes promovem violência e desigualdade.

Esses esforços foram recebidos com ataques do proprietário da X e de líderes de direita que reclamam sobre democracia e liberdade de expressão. Mas precisamente porque o espaço digital carece de acordos regulatórios internacionais e democraticamente decididos, grandes empresas de tecnologia operam como governantes, decidindo o que deve ser moderado e o que deve ser promovido em suas plataformas.

Além disso, a plataforma X e outras empresas começaram a se organizar, junto com seus aliados dentro e fora do país, para minar iniciativas que visam a autonomia tecnológica do Brasil. Mais do que um aviso ao Brasil, suas ações enviam uma mensagem preocupante ao mundo: que países democráticos que buscam independência da dominação das Big Tech correm o risco de sofrerem interrupções em suas democracias, com algumas Big Techs apoiando movimentos e partidos de extrema-direita.

O caso brasileiro tornou-se o principal front no conflito global em evolução entre as corporações digitais e aqueles que buscam construir um cenário digital democrático e centrado nas pessoas, focado no desenvolvimento social e econômico.

As empresas de tecnologia não apenas controlam o mundo digital, mas também fazem lobby e operam contra a capacidade do setor público de criar e manter uma agenda digital independente baseada em valores, necessidades e aspirações locais. Quando seus interesses financeiros estão em jogo, elas trabalham alegremente com governos autoritários. O que precisamos é de espaço digital suficiente para que os estados possam direcionar as tecnologias colocando as pessoas e o planeta à frente dos lucros privados ou do controle unilateral do estado.

Todos aqueles que defendem os valores democráticos devem apoiar o Brasil em sua busca pela soberania digital. Exigimos que as Big Techs cessem suas tentativas de sabotar as iniciativas do Brasil voltadas para a construção de capacidades independentes em inteligência artificial, infraestrutura pública digital, governança de dados e serviços de nuvem. Esses ataques minam não apenas os direitos dos cidadãos brasileiros, mas as aspirações mais amplas de todas as nações democráticas de alcançar a soberania tecnológica.

Também pedimos ao governo do Brasil que seja firme na implementação de sua agenda digital e denuncie as pressões contra ela. O sistema ONU e os governos ao redor do mundo devem apoiar esses esforços. Este é um momento decisivo para o mundo. Uma abordagem independente para recuperar a soberania digital e o controle sobre nossa esfera pública digital não pode esperar. Há também uma necessidade urgente de desenvolver, dentro do marco da ONU, os princípios básicos de regulamentação transnacional para o acesso e uso de serviços digitais, promovendo ecossistemas digitais que coloquem as pessoas e o planeta à frente dos lucros, para que esse campo de provas das Big Techs não se torne uma prática comum em outros territórios.

Primeiras assinaturas em ordem alfabética

Anita Gurumurthy, IT for Change

Çag rı Çavuş, SOMO

Assoc Prof. Cecilia Rikap, University College London, IIPP and CONICET

Prof. Ce dric Durand, University of Geneva

Prof. C P Chandrasekhar, IDEAs and PERI, UMass

Dr. Cory Doctorow (h.c.), author, activist, journalist.

Prof. Cristina Caffarra, University College London, CEPR Competition RPN

Prof. Daron Acemoglu, MIT Economics

David Adler, Progressive International

Ekaitz Cancela, Center for the Advancement of Infrastructural Imagination (CAII)

Assoc Prof. Edemilson Parana , LUT University

Prof. Emiliano Brancaccio, University of Sannio

Dr. Evgeny Morozov, author and producer of “The Santiago Boys” and “A Sense of Rebellion”

Assoc Prof. Francesca Bria, University College London, IIPP and Stifung Mercator

Prof. Gabriel Zucman, Paris School of Economics and UC Berkeley

Helena Martins, Federal University of Ceara

Prof. Jason Hickel, ICTA-UAB and LSE

Dr. Jathan Sadowski, Monash University

Prof. Jayati Ghosh, University of Massachusetts Amherst, Deparment of Economics

Dr. Joel Rabinovich, King’s College London

Jose Graziano da Silva, Dir Gen Instituto Fome Zero-Zero Hunger Institute, former DG of FAO-UN

Prof. Jose van Dijck, Utrecht University

Prof. Juan Martı n Gran a, CONICET and Universidad Nacional de San Martı n

Prof. Julia Cage , Sciences Po Paris, Department of Economics

Prof. Marcela Amaro, Universidad Nacional Auto noma de Me xico

Prof. Marcos Dantas, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Prof. Mariana Mazzucato, University College London, author of Mission Economy

Prof. Margarita Olivera, Institute of Economics, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Margarida Silva, SOMO

Maria Farrell, writer

Marietje Schaake, Stanford University, author of “The Tech Coup”

Prof. Martı n Becerra, CONICET and Universidad de Buenos Aires

Prof. Martı n Guzman, School of International and Public Affairs (SIPA), Columbia University

Nandini Chami, IT for Change

Dr. Niall Reddy, Wits University

Prof. Nick Couldry, London School of Economics

Dr. Nick Srnicek, King’s College London

Prof. Paola Ricaurte Quijano, Tecnolo gico de Monterrey

Prof. Paolo Gerbaudo, Universidad Complutense de Madrid

Paris Marx, Host of Tech Won’t Save Us

Prof. Phoebe Moore, University of Essex

Dr. Raffaele Giammetti, University of Cassino and Southern Lazio

Renata A vila, CEO – Open Knowledge Foundation, affiliated to CIS at CNRS France

Robin Berjon – Governance Technologist

Rodrigo Fernandez, SOMO

Prof. Sergio Amadeu da Silveira – Federal University of ABC

Prof. Shoshana Zuboff, Author “The Age of Surveillance Capitalism: The Fight for a Human Future

at the New Frontier of Power”

Sofı a Scasserra, Transnational Institute (TNI)

Prof. Stefano Lucarelli, University of Bergamo

Prof. Thomas Piketty, Paris School of Economics and EHESS

Prof. Ulises Mejias, State University of New York

Prof. Ugo Pagano, University of Siena

Prof. Wolfgang Streeck, Max Planck Institute for the Study of Societies

Yanis Varoufakis, General Secretary, MeRA25

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