Elizabeth Teixeira, líder camponesa da Paraíba e protagonista do documentário Cabra Marcado para Morrer, dirigido por Eduardo Coutinho e lançado em 1984, completa 100 anos neste 13 de fevereiro. Veja em TVT News a história dessa mulher que, como a Eunice Paiva de Ainda Estou Aqui, enfrentou a violência.
Elizabeth, uma mulher de luta
O filme Ainda Estou Aqui, aclamado pelo público e premiado internacionalmente, trouxe à tona a história de Eunice Paiva, uma mulher forte que, após perder o marido durante a ditadura militar, lutou incansavelmente não apenas pelo reconhecimento do crime pelo Estado, mas também pelos direitos humanos das populações mais oprimidas pelo regime.
No entanto, outra produção cinematográfica, realizada ainda durante o período ditatorial, também retratou a trajetória de uma grande mulher: Elizabeth Teixeira, líder camponesa da Paraíba e protagonista do documentário Cabra Marcado para Morrer, dirigido por Eduardo Coutinho e lançado em 1984.

A vida e a luta de Elizabeth Teixeira
Nascida em Sapé, na zona da mata paraibana, Elizabeth Teixeira cresceu em uma família de comerciantes com condições de vida relativamente confortáveis. No entanto, decidiu abandonar esse conforto para viver ao lado de João Pedro Teixeira, um trabalhador rural. Com ele, teve 11 filhos e descobriu os desafios da vida no campo, marcada por dificuldades e desigualdades.
Na década de 1950, movimentos camponeses por reforma agrária ganhavam força no Brasil. João Pedro, após buscar trabalho em outras regiões sem sucesso, retornou a Sapé e fundou a Liga Camponesa de Sapé no final daquela década. Sua liderança logo chamou a atenção não apenas dos trabalhadores rurais, mas também dos latifundiários, que viam na organização uma ameaça aos seus interesses.
Em 1962, João Pedro foi assassinado a tiros por pistoleiros contratados por proprietários de terras da região, ao retornar de uma viagem a João Pessoa. Sua morte marcou o início de uma nova fase na vida de Elizabeth, que decidiu assumir o legado do marido. Ela tomou a frente da Liga Camponesa, ampliando a participação de mulheres na luta por direitos e enfrentando lideranças locais. Sua atuação a levou a ser presa repetidas vezes, enquanto sua família sofria as consequências de sua militância.
Em meio a esse cenário, sua filha mais velha, Marluce Teixeira, cometeu suicídio por envenenamento enquanto Elizabeth estava encarcerada. Com o golpe militar de 1964, a situação se agravou: sua casa foi incendiada, e ela passou meses presa em um quartel do Exército. Após ser solta, ameaçada de morte, foi orientada por companheiros a se exilar no Recife.

No entanto, mesmo longe de casa, Elizabeth não encontrou paz. Localizada pela polícia em Pernambuco, conseguiu fugir e se refugiou no Rio Grande do Norte. Durante anos, viveu na clandestinidade, sob um nome falso, sem poder levar consigo todos os filhos. Apenas um deles a acompanhou, enquanto os outros foram deixados aos cuidados de familiares, que os trataram como “mercadorias”, entregando-os a parentes dispostos a adotá-los.
O filme que marcou a história
Antes de deixar a Paraíba, Elizabeth foi procurada pelo Centro de Cultura Popular da UNE e pelo Movimento de Cultura Popular de Pernambuco, que planejavam produzir um filme sobre a história de João Pedro Teixeira. Sob a direção de Eduardo Coutinho, as filmagens de Cabra Marcado para Morrer começaram em 1964, com uma reconstituição ficcional dos eventos que levaram ao assassinato de João Pedro. No entanto, o golpe militar interrompeu o projeto.
Dezessete anos depois, em 1981, Coutinho retomou o documentário, agora com um novo enfoque: a história de Elizabeth e dos demais integrantes da Liga Camponesa. Ao rever as imagens do passado, Elizabeth refletiu diante das câmeras sobre sua motivação para continuar lutando pela reforma agrária, mesmo após tantas perdas e perseguições.
Após anos na clandestinidade, Elizabeth retornou à Paraíba e hoje vive em João Pessoa com uma de suas filhas. Aos 100 anos, completados recentemente, ela mantém a mesma altivez e o desejo de ver um país mais justo, como sonhava seu marido antes do golpe militar. Sua trajetória é um testemunho de resistência e coragem, marcada não pela morte, mas pela vida e pelo reconhecimento histórico.

Para celebrar seu centenário, diversos movimentos populares organizaram homenagens. Além disso, o observatório De Olho Nos Ruralistas produziu, em 2023, um documentário sobre sua vida, disponível em seu canal no YouTube. Elizabeth Teixeira é, sem dúvida, uma mulher marcada para viver e inspirar gerações.