Na noite de terça-feira (16), a Câmara dos Deputados aprovou, em segundo turno, a chamada PEC da Blindagem, que altera regras para responsabilização criminal de parlamentares. A proposta impede que deputados e senadores sejam investigados ou julgados em novos processos criminais sem autorização do Congresso e dificulta até mesmo prisões em flagrante, inclusive em casos de crimes inafiançáveis. O texto recebeu 344 votos favoráveis e 133 contrários. Leia em TVT News.
Em entrevista ao Jornal TVT News Primeira Edição, a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) classificou a votação como “uma vergonha especial na história do Congresso Nacional” e ressaltou que a medida vai na contramão do interesse da população.
Segundo a parlamentar, enquanto a Câmara se debruça sobre propostas que blindam políticos, duas pautas de impacto direto na vida dos brasileiros seguem paradas: a medida provisória que prevê isenção na conta de luz para cerca de 60 milhões de pessoas e o projeto que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda para rendimentos de até R$ 5 mil. “Estamos falando de pautas progressivas, que beneficiam 90% da população, mas que vêm sendo ignoradas e obstruídas há meses pela extrema direita e pelo centrão”, criticou.
Sâmia também destacou que a aprovação da PEC se soma à ofensiva em torno da chamada PEC da Anistia, que busca reverter decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e livrar de punições Jair Bolsonaro e outros condenados pela tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023. “O retrato do Congresso é esse: para o povo, obstrução; para salvar criminosos, urgência e prioridade”, afirmou.
A deputada chamou atenção ainda para o retorno do voto secreto em decisões sobre abertura de processos contra parlamentares. Para ela, trata-se de um mecanismo de ocultação que dificulta o acompanhamento da sociedade. “O voto secreto foi abolido justamente porque impede transparência. É usado para salvar colegas em casos escandalosos. Foi assim com o caso de Chiquinho Brazão, acusado de ser mandante do assassinato de Marielle Franco, que não teve a cassação votada em plenário por falta de segurança no resultado”, lembrou.
Outro ponto criticado por Sâmia foi a possibilidade de que crimes inafiançáveis, como estupro, assassinato, exploração sexual de crianças, racismo e tráfico de drogas, só resultem em prisão em flagrante com autorização do Congresso. “É um absurdo completo. O projeto fala por si só: até em crimes hediondos, a palavra final será dos próprios parlamentares, por voto secreto”, disse.
Sobre a tramitação no Senado, a deputada mencionou articulações políticas que podem ligar a PEC da Blindagem a negociações sobre a anistia aos golpistas. Segundo ela, líderes da Casa têm sinalizado que não há votos suficientes para aprovar o texto, mas há tentativas de costurar um acordo para reduzir penas dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. “Tudo isso faz parte de um bolo de negociação, um plano B, que envolve blindagem parlamentar e anistia paralela. O objetivo é sempre proteger os responsáveis pelo golpe”, avaliou.
Sâmia lembrou, no entanto, que a pressão popular e a resistência no plenário renderam uma vitória parcial da oposição: a retirada do voto secreto na autorização para abertura de processos judiciais contra parlamentares. “Foi uma derrota grande para o centrão e para a extrema direita. Só conseguimos porque esticamos a sessão até de madrugada, com obstrução firme e com o apoio da mobilização nas redes sociais. O recado é que vale a pena manter coerência, coragem e apostar na mobilização do povo”, concluiu.
Para a deputada, a manobra política em torno da PEC da Blindagem e da Anistia tem como pano de fundo as eleições de 2026. “Eles sabem que o STF vai derrubar uma anistia inconstitucional, mas precisam do discurso de perseguição para angariar votos. Enquanto isso, o que interessa ao povo brasileiro segue sendo ignorado. Esse é o recado triste do Congresso Nacional”, finalizou.