A deflagração da Operação Poço de Lobato, nesta quinta-feira (27), pela Receita Federal, recolocou no centro do debate público a urgência da aprovação da Lei do Devedor Contumaz — projeto que cria instrumentos para combater empresas que estruturam dívidas bilionárias como modelo de negócio. A ação tem como principal alvo o Grupo Fit, antigo Refit, responsável pela operação da refinaria de Manguinhos, no Rio de Janeiro, e investigado por um megaesquema de sonegação fiscal que pode ter causado um rombo superior a R$ 26 bilhões aos cofres públicos. Leia mais em TVT News.
A operação mobilizou auditores, policiais e membros do Ministério Público para cumprir dezenas de mandados de busca e apreensão em quatro estados. De acordo com as investigações, o grupo mantinha uma engrenagem ilícita sofisticada, combinando sonegação, ocultação de patrimônio, operações internacionais e uso de offshores para movimentação financeira em larga escala — muito acima do padrão dos crimes tributários comuns. Segundo a Receita, cerca de 250 milhões de litros de combustíveis foram apreendidos e já estão sob custódia da Petrobras, aguardando o processo administrativo que pode resultar em perdimento e leilão do produto.
Em meio ao avanço das investigações, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), afirmou que o caso evidencia o tamanho do problema e reforça a necessidade de o Congresso aprovar ainda este ano a Lei do Devedor Contumaz, que já passou pelo Senado e está parada na Câmara dos Deputados. “Se a lei for sancionada ainda este ano, entraremos em 2026 mais fortes para enfrentar o crime econômico”, declarou a jornalistas, ao comentar os desdobramentos da operação.
Haddad destacou que o projeto é resultado de três anos de trabalho técnico e político, e que o texto foi aprimorado para resguardar contribuintes regulares. Para o ministro, é fundamental separar os empresários que atuam dentro das regras daqueles que usam a inadimplência deliberada como estratégia comercial. “É um apelo que eu deixo aqui pela enésima vez, é um trabalho que nós estamos fazendo há 3 anos, nós aperfeiçoamos o texto, nós incluímos na lei do devedor quanto mais uma série de benefícios para o bom contribuinte, justamente para separar o joio do trigo”, enfatizou.
A proposta define critérios objetivos para identificar o devedor contumaz e prevê mecanismos que permitem restringir a atuação de empresas que reiteradamente deixam de pagar tributos devidos, causando desequilíbrio concorrencial e alimentando esquemas fraudulentos. “O projeto visa proteger 99% dos contribuintes, criar critérios para identificar o devedor reincidente, restringir empresas que usam inadimplência como modelo de negócio e reforçar o combate à concorrência desleal”, explicou Haddad.
Para o ministro, o modelo de fraude no setor de combustíveis se tornou um dos principais vetores de financiamento do crime organizado no país, extrapolando o campo econômico. “A droga deixou de ser o único e talvez deixou de ser o mais importante bem que gera recursos para o crime organizado. Especialistas apontam especificamente a área de combustíveis como aquela que deve inspirar as maiores atenções”, afirmou.
Segundo ele, ignorar esse tipo de atuação criminosa é permitir que estruturas bilionárias continuem irrigando organizações que se valem de braços econômicos para financiar redes ilegais diversas. Haddad foi enfático: “Se você não asfixiar financeiramente as organizações criminosas, você vai ter uma reposição de mão de obra barata na base e você não vai dar conta do problema. Você precisa atuar também por cima, também pelo andar de cima. Porque é o andar de cima que irriga com bilhões as atividades criminosas. Não estamos falando de milhões, estamos falando de bilhões de reais.”
A Operação Poço de Lobato, inspirada no nome do primeiro poço de petróleo perfurado no Brasil, reforça não apenas a magnitude das irregularidades atribuídas ao Grupo Fit, mas também a fragilidade do arcabouço regulatório atual — que, sem a Lei do Devedor Contumaz, ainda permite que empresas reincidentes se mantenham ativas, mesmo acumulando dívidas impagáveis e burlando o fisco com estruturas empresariais complexas.
A pressão sobre o Congresso aumenta em meio à repercussão da operação. Analistas apontam que, em casos como o da Refit, o modus operandi envolve sucessão de empresas, uso de laranjas, reestruturações simuladas e um emaranhado societário criado para dificultar a fiscalização. A legislação atual, fragmentada e pouco específica, permite que os órgãos de controle atuem apenas de forma reativa, sempre correndo atrás de prejuízos fiscais que se acumulam por anos.
Já a Lei do Devedor Contumaz, ao estabelecer parâmetros claros para caracterização do infrator e prever sanções mais rápidas, se apresenta como ferramenta essencial para interromper ciclos de fraude. Além disso, ao proteger contribuintes que cumprem suas obrigações, busca evitar que empresas idôneas sejam prejudicadas pela concorrência predatória de grupos que sonegam sistematicamente.
Com a Operação Poço de Lobato revelando um esquema de proporções inéditas, o governo federal intensifica a cobrança para que a Câmara vote o texto ainda em 2025. Para Haddad, cada dia sem a lei significa manter brechas que alimentam estruturas criminosas. E, como demonstraram os acontecimentos desta quinta-feira, os impactos vão muito além da arrecadação tributária: atingem diretamente a segurança econômica e fortalecem redes ilegais que se alimentam da fragilidade do sistema fiscal brasileiro.
Com informações da Agência Brasil
