Brasília – A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Anistia, que pretende livrar Jair Bolsonaro e aliados das punições pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, tornou-se um dos principais pontos de tensão entre os Poderes. Leia em TVT News.
Senado seria barreira contra anistia
Enquanto setores da Câmara dos Deputados pressionam pela aprovação do texto, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), se coloca frontalmente contra a medida e articula uma alternativa que exclui o ex-presidente e os organizadores do ataque às instituições. Paralelamente, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já formam maioria para considerar a proposta inconstitucional, caso avance no Congresso.
Na Câmara, a proposta ganhou fôlego em meio ao julgamento de Bolsonaro no STF, que começou nesta semana. Como revelou o blog de Andreia Sadi, do g1, líderes bolsonaristas buscam acelerar a tramitação para criar um contraponto político às acusações contra o ex-presidente. A articulação se intensificou com a promessa do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de apoiar uma anistia ampla caso seja eleito presidente em 2026. Esse gesto ampliou a pressão de sua base sobre a cúpula do Congresso.
No entanto, no Senado, o movimento enfrenta uma barreira clara. Alcolumbre afirmou em entrevista à Folha de S. Paulo que rejeita uma anistia geral: “Eu vou votar o texto alternativo. É isso que eu quero votar no Senado. Eu vou fazer esse texto, eu vou apresentar”, disse. Ao Valor Econômico, reforçou que sua proposta pretende distinguir a responsabilidade de quem financiou e organizou o golpe da dos que participaram como massa de manobra. “Não é justo colocar no mesmo patamar quem liderou e quem foi induzido”, declarou. Segundo O Globo, a ideia é reduzir penas ou permitir benefícios penais apenas para réus de menor envolvimento, sem qualquer perdão a Bolsonaro ou a generais que atuaram como articuladores da intentona.
STF antecipa reação
Enquanto isso, no Judiciário, ministros já se movimentam para barrar uma eventual aprovação da anistia. Reportagem de O Globo mostrou que integrantes do STF consideram a medida uma afronta direta à Constituição e à própria cláusula pétrea que protege o Estado Democrático de Direito. Em coluna de Mônica Bergamo na Folha, foi revelado que a Corte já possui maioria consolidada para declarar inconstitucional qualquer tentativa de indulto ou anistia a Bolsonaro. “Não haverá anistia nem indulto para crimes contra a democracia”, resumiu um magistrado ouvido sob reserva.
O Congresso em Foco detalhou que, mesmo que a PEC seja aprovada nas duas Casas, dificilmente resistirá ao controle de constitucionalidade. Isso porque o STF já firmou entendimento no caso do indulto concedido por Bolsonaro ao ex-deputado Daniel Silveira, quando a Corte considerou que houve “desvio de finalidade”. A leitura predominante é de que a anistia a crimes de golpe de Estado não pode ser admitida sob nenhum pretexto.
A BBC Brasil acrescenta que ministros vêm alertando parlamentares em conversas reservadas sobre o desgaste institucional que o país sofreria com a aprovação de uma medida considerada inaceitável pelo tribunal. O temor é que a anistia seja interpretada como licença para futuros atentados contra a democracia.
Caminhos no Congresso
Apesar da resistência do Senado e da sinalização do STF, deputados bolsonaristas seguem empenhados em colocar a proposta em votação. A estratégia, segundo parlamentares ouvidos pelo g1, é aproveitar o clima de polarização em torno do julgamento de Bolsonaro para empurrar o tema ao plenário. A aposta é de que, mesmo com chance de derrota jurídica, a PEC funcione como instrumento de mobilização da base radicalizada.
Alcolumbre, contudo, parece disposto a frear esse movimento. Sua articulação busca uma saída intermediária, que evite tensionar ainda mais a relação entre Congresso e Judiciário e, ao mesmo tempo, sinalize a setores da oposição que não haverá uma “caça às bruxas” indiscriminada. “O Senado não será conivente com um perdão coletivo a quem atentou contra a democracia”, declarou o senador ao Valor.
O cenário revela um impasse: de um lado, a pressão política da Câmara e do bolsonarismo para aprovar uma anistia ampla; de outro, a posição institucional do Senado e do STF contra a medida. Caso a PEC avance, a tendência é que seja derrubada judicialmente, abrindo nova crise entre os Poderes. Enquanto isso, a estratégia de Alcolumbre pode ganhar corpo como tentativa de costurar uma solução que delimite responsabilidades sem comprometer o Estado Democrático de Direito.
No balanço geral, a PEC da Anistia parece ter poucas chances de prosperar na forma defendida pelo bolsonarismo. Entre a rejeição explícita do Senado e a previsão de inconstitucionalidade pelo STF, a iniciativa enfrenta um caminho estreito e turbulento, servindo mais como instrumento político de mobilização do que como proposta viável no cenário atual.