Justiça condena Prefeitura de São Paulo a pagar R$ 24,8 milhões por não garantir aborto legal a vítimas de estupro

Justiça condena Prefeitura de São Paulo a pagar R$ 24,8 milhões por não garantir aborto legal a vítimas de estupro, conforme previsto em lei
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Ricardo Nunes (MDB) ignorou, durante 497 dias, uma determinação que obrigava o município a garantir o acesso ao aborto legal para mulheres vítimas de estupro Foto: Cepers

A Justiça de São Paulo condenou a Prefeitura da capital a pagar uma multa de R$ 24,8 milhões por descumprir decisão judicial que determinava a retomada do serviço de aborto legal no Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha, na Zona Norte. A sentença é da juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, e foi publicada nesta semana. Entenda na TVT News.

Segundo a magistrada, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) ignorou, durante 497 dias, uma determinação que obrigava o município a garantir o acesso ao procedimento para mulheres vítimas de estupro, seja reabrindo o serviço na maternidade, seja encaminhando as pacientes para outras unidades públicas. A multa foi fixada em R$ 50 mil por dia de descumprimento.

“O valor da multa diária é compatível com a gravidade da situação, tem como finalidade garantir a efetividade da jurisdição e a proteção dos direitos fundamentais”, afirmou Casoretti na decisão.

A juíza destacou ainda que a Prefeitura adotou uma “conduta omissiva” diante das ordens judiciais e demonstrou “desobediência institucional reiterada com nítido desprezo pelos direitos fundamentais, como a saúde e a dignidade das mulheres vítimas de violência sexual”.

A condenação é resultado de uma ação civil pública movida pela deputada federal Luciene Cavalcante, pelo deputado estadual Carlos Giannazi e pelo vereador Celso Giannazi, ambos do Psol.

Prefeitura diz que vai recorrer

Em nota, a Prefeitura de São Paulo afirmou que recorrerá da decisão “assim que for intimada” e defendeu que “as decisões técnicas feitas por médicos e profissionais da saúde devem prevalecer sobre questões ideológicas”.

Nos autos, a gestão de Nunes também alegou que a multa seria “excessiva” e que não teve direito à ampla defesa, argumentando que a ação não identificou nominalmente as pacientes que teriam sido prejudicadas — constando apenas as iniciais dos nomes e sobrenomes.

A magistrada rejeitou todos os argumentos apresentados pela administração municipal.

“Deveria o município, que detém o monopólio dos registros de atendimento, ter feito uma verificação em seus próprios registros com base nas datas e unidades informadas e comprovado, com dados concretos, que os procedimentos foram efetivamente realizados ou reagendados”, escreveu Casoretti. “Sua insistência em descumprir a ordem judicial não pode ser justificada pela falta de dados que ele próprio tem o dever legal e constitucional de proteger”, acrescentou.

Aborto necessário e humanitário

Em parecer emitido em 24 de setembro, o Ministério Público de São Paulo também se manifestou favoravelmente à aplicação da multa. O promotor de Justiça Arthur Pinto Filho apontou que o município deixou de prestar assistência a pelo menos oito vítimas de violência sexual, que procuraram unidades de saúde da capital e tiveram o acesso ao aborto legal negado.

De acordo com o Ministério Público, parte dessas mulheres precisou viajar para outros estados em busca de atendimento, o que reforçou a gravidade da omissão por parte da Prefeitura.

A sentença ainda cabe recurso ao Tribunal de Justiça. Enquanto isso, o caso reacende o debate sobre a efetividade do direito ao aborto legal no Brasil, garantido em casos de estupro, risco de vida à gestante e anencefalia fetal, conforme previsto no Código Penal e reafirmado por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).

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