Taxação dos super-ricos viabiliza isenção do Imposto de Renda

Extrema direita e Centrão querem manter privilégio dos mais ricos, o que inviabilizaria a proposta
taxacao-dos-super-ricos-viabiliza-isencao-do-imposto-de-renda-expectativa-e-se-a-camara-se-posicionar-ao-lado-da-maioria-ou-dos-super-ricos-foto-paulo-pinto-abr-tvt-news
Expectativa é se a Câmara se posicionar: ao lado da maioria ou dos super-ricos. Foto: Paulo Pinto/ABR

A Câmara dos Deputados deve votar nesta quarta-feira (1º) o projeto do governo Lula que prevê isenção total do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil por mês. A medida, defendida pelo Ministério da Fazenda como uma das mais importantes da atual gestão, está diretamente vinculada à criação de uma alíquota mínima de 10% para contribuintes com renda mensal de R$ 100 mil — o equivalente a R$ 1,2 milhão por ano. Leia em TVT News.

O governo argumenta que a proposta é uma forma de corrigir distorções históricas do sistema tributário brasileiro, considerado um dos mais regressivos do mundo. Hoje, quem ganha salários baixos ou médios paga proporcionalmente mais impostos do que os detentores de grandes fortunas, que se beneficiam de isenções, brechas legais e da baixa taxação sobre lucros e dividendos.

Segundo pesquisa Quaest divulgada em julho, a maioria da população apoia o aumento do IR para os mais ricos. Os números mostram que a percepção de injustiça fiscal mobiliza a sociedade, que vê na reforma um caminho para reduzir desigualdades. A consulta pública reforça a posição do governo de que a tributação progressiva não é apenas uma medida econômica, mas também uma demanda social.

Outro estudo, desta vez apresentado pelo próprio Ministério da Fazenda, aponta que a introdução de uma alíquota mínima do IR para quem recebe acima de R$ 50 mil mensais poderia ampliar o número de contribuintes isentos nas faixas mais baixas. Ou seja, a taxação dos super-ricos não apenas gera arrecadação, como viabiliza a desoneração dos trabalhadores e da classe média.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem reiterado que a reforma do Imposto de Renda tem também um caráter ético. “Ela cria um constrangimento moral para os super-ricos”, declarou em entrevista recente, lembrando que o Brasil é uma das poucas grandes economias do mundo que não cobra imposto mínimo sobre altas rendas de forma efetiva. Haddad insiste que o país precisa de justiça tributária, e que a resistência em enfrentar os privilégios fiscais das elites compromete a credibilidade da política econômica.

Para reduzir a resistência de setores empresariais e da elite econômica, o governo lançou a campanha de comunicação batizada de “chá-revelação dos super-ricos”. Em tom bem-humorado, a iniciativa busca popularizar o debate sobre justiça tributária e desmistificar a ideia de que o aumento do IR para os muito ricos prejudicaria o desenvolvimento do país. A campanha destaca que o imposto não atinge a imensa maioria da população, mas apenas uma pequena parcela de contribuintes que concentram renda e patrimônio.

Apesar da mobilização popular e da narrativa do governo, a votação na Câmara está longe de ser tranquila. Movimentos populares e organizações da sociedade civil alertam para manobras do Centrão e da extrema-direita, que tentam desidratar o projeto. Um dos riscos apontados é a retirada da taxação dos super-ricos em nome de um suposto “acordo” entre líderes partidários, o que deixaria a medida sem a devida compensação fiscal.

Sem a cobrança adicional sobre altas rendas, a reforma poderia se tornar inviável ou forçar cortes em áreas estratégicas, como saúde, educação e investimentos sociais. Para a CUT e outras entidades, essa seria mais uma vitória do lobby das elites contra os interesses da maioria da população. “Não se trata apenas de números, mas de escolhas políticas sobre quem paga a conta do Estado”, afirmam as organizações.

Além disso, lideranças sindicais ressaltam que a promessa de Lula de isentar do IR quem ganha até R$ 5 mil só será possível se a taxação dos super-ricos for mantida. Sem essa contrapartida, o governo corre o risco de ver uma de suas principais bandeiras sociais esvaziada.

Nos bastidores, deputados governistas trabalham para assegurar que o texto seja aprovado sem alterações que comprometam seu núcleo. O Planalto tem articulado com partidos aliados para manter a alíquota mínima de 10% sobre rendas de R$ 100 mil mensais, considerada essencial para garantir a sustentabilidade da medida.

Economistas críticos ao modelo atual lembram que, enquanto países desenvolvidos aplicam sistemas altamente progressivos, o Brasil preserva privilégios fiscais de uma elite restrita. Essa distorção ajuda a explicar porque o país continua entre os mais desiguais do planeta, mesmo com avanços recentes em políticas sociais.

Para o governo, a votação desta quarta-feira será um teste não apenas econômico, mas também político. A reforma do IR é apresentada como peça central no esforço de consolidar as contas públicas sem sacrificar os mais pobres. Ao mesmo tempo, busca enfrentar a resistência de setores que, historicamente, têm conseguido barrar mudanças estruturais.

Se aprovada como foi enviada, a medida pode significar um marco na redistribuição tributária do Brasil, aumentando a renda disponível para milhões de trabalhadores e criando um ambiente de maior justiça social. Se desidratada, corre o risco de se tornar apenas mais uma reforma pela metade, incapaz de alterar de fato a lógica desigual que marca o sistema tributário nacional.

A expectativa agora é sobre como a Câmara dos Deputados vai se posicionar: se ao lado da maioria da população, que apoia a tributação dos super-ricos, ou se atenderá às pressões de grupos privilegiados que resistem a qualquer mudança.

Assuntos Relacionados