Um ataque deixou ao menos dez indígenas dos povos Guarani e Kaiowá feridos, no último dia 3 de agosto, em Douradina (MS). O fato ocorreu durante um processo de retomada na Terra Indígena (TI) Panambi-Lagoa Rica, já delimitada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), em 2011. Em nota, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) afirmou que o Ministério da Justiça e Segurança Pública foi acionado para dar explicações sobre a ausência da Força Nacional no momento do ataque para garantir a segurança e evitar novos conflitos.
Violências contra os povos indígenas foram um dos motes para a elaboração do relatório Território, Ambiente e Saúde dos Povos Indígenas – Vidas e Políticas Públicas em Contínuo Estado de Emergência, lançado recentemente pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), por meio do Grupo Temático Saúde e Ambiente.
O documento descreve o contexto de crise ecológica sofrida por esses povos, a partir de reflexões sobre as ligações entre território, ambiente e saúde. O texto também aponta caminhos para superar dificuldades e desafios, além de propor dez ações de enfrentamento. Lideranças indígenas e especialistas compuseram o coletivo de pesquisadores que elaboraram a publicação. Um dos coordenadores do relatório é o professor-pesquisador da Escola Politécnica de Saúde (EPSJV/Fiocruz), Alexandre Pessoa, que também coordenada o GT Saúde e Ambiente da Abrasco. A professora-pesquisadora da EPSJV/Fiocruz, Ana Claudia Vasconcellos, também participou da produção de um dos textos – Garimpos, mercúrio e a contaminação das veias dos corpos-territórios.
Para Alexandre, a atual crise ecológica é gerada pela emergência climática e pelos impactos e danos socioambientais e à saúde, causados pelas atividades extrativistas, pelo agronegócio e pela mineração. “Isso precisa ser revertido. Os grandes temas de saúde e ambiente envolvem as populações do campo, da floresta e das águas, os povos e comunidades tradicionais, e evidenciamos os povos indígenas e seus territórios nesse relatório”, ressaltou. Ele também acrescentou que a experiência dos autores, que fazem trabalhos em diversas comunidades indígenas pelo país, e os estudos à luz da determinação social da saúde permitiram destacar que, na defesa da saúde indígena, não se separa os territórios e os corpos hídricos dos corpos indígenas.
Esse é exatamente um dos pontos de destaque da publicação: a conservação da biodiversidade está intrinsicamente ligada aos povos indígenas e às comunidades locais. Segundo o documento, esses povos têm um profundo conhecimento e relação com a terra, e suas práticas tradicionais de manejo ambiental são importantes para a preservação dos biomas e da sociobiodiversidade.
Segundo Alexandre, a ecologia política é um campo interdisciplinar de conhecimento que possibilita revelar os circuitos capitalistas produtores de destruição ecológica e de processos de saúde-doença. “A imersão neste trabalho evidenciou que a proteção dos povos indígenas requer a atuação, não somente do Ministério da Saúde, mas uma forte e contínua atuação interministerial e de todas as instâncias do poder público, no sentido de enfrentarmos verdadeiros ‘ecossistemas do crime’ ”, frisou.
Dentre as dez ações de enfrentamento, o relatório aponta as necessidades de garantia da atenção diferenciada à saúde para todos os indígenas; de promoção de políticas públicas que respeitem os direitos desses povos; de priorização do Programa Nacional de Saneamento Indígena; e de demarcação de terras indígenas sem o Marco Temporal. “A celeridade para a demarcação de terras indígenas e o enfrentamento do Marco Temporal são estratégicos e improrrogáveis. O futuro é indígena!”, concluiu Alexandre.