Decreto municipal que proíbe funk é “preconceito na veia”

Proibir gênero musical fere o núcleo da Constituição, avalia especialista
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Decreto busca proibir funk em escola no Sul de Minas Gerais. Foto: Léo Salo/Divulgação

A decisão da Prefeitura de Carmo do Rio Claro, no Sul de Minas Gerais, de proibir músicas de funk nas escolas municipais, por meio de um decreto, tem gerado controvérsia jurídica e cultural. A justificativa oficial para a medida é evitar conteúdos considerados inadequados para o ambiente escolar. Contudo, especialista aponta pelo menos três aspectos fundamentais da medida que ferem a Constituição: competência legislativa, liberdade de expressão e igualdade de tratamento.

A primeira crítica reside na competência legislativa. Segundo Antonio Carlos de Freitas Jr., Mestre e Doutor em Direito Constitucional pela USP, o decreto municipal invade um campo reservado à União, que tem a atribuição de legislar sobre diretrizes e bases da educação. “Um município não pode, de forma isolada, legislar sobre questões gerais do ensino. Ele pode legislar sobre questões muito peculiares, que se refiram à organização do município. Por exemplo, se naquela região chove muito pela manhã, o horário de intervalo ou de entrada será alterado em razão dessa especificidade. Questões sobre o ensino em geral e sobre o que é bom ou não para a educação é atribuição da União”, afirma. 

A medida também é questionada por sua violação à liberdade de expressão artística, protegida pela Constituição no artigo 5º, inciso IX. Segundo Freitas Jr, a Constituição é clara em garantir a liberdade artística e cultural, além de vedar qualquer forma de censura. “Proibir o funk não é uma censura de uma música, é uma censura genérica de um gênero musical. É ainda mais grave que censura, porque ceifa a própria análise da música em concreto”.  

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Imagem da exposição “FUNK: Um grito de ousadia e liberdade”, que esteve em cartaz no Museu de Arte do Rio (MAR) em 2023. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Na avaliação do advogado, essa proibição tem como pano de fundo algo que ofende o núcleo da Constituição, que é a dignidade da pessoa humana, porque demonstra um preconceito em relação ao gênero, de fundo racial e socioeconômico. “O próprio decreto complementa que estariam proibidas outras músicas que contenham vulgaridades morais, sexualização e incitação a crimes, ou seja, ele está pressupondo que todo e qualquer funk têm esses elementos. É preconceito na veia – ligado a um gênero musical e a uma cultura de subúrbio – que ofende diretamente a dignidade da pessoa humana”.   

O caso ganha ainda mais relevância diante da recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que tem reforçado a proteção de direitos fundamentais em situações semelhantes. Freitas Jr. cita como exemplo a decisão na ADPF 457, que declarou inconstitucional uma lei municipal que proibia materiais sobre ideologia de gênero nas escolas. “O STF já mostrou que medidas que extrapolam a competência municipal e afrontam princípios constitucionais têm alta probabilidade de serem invalidadas. O mesmo deve ocorrer aqui, considerando os paralelos entre os casos”, argumenta.

À medida que decisões como essa proliferam em diferentes municípios, fica o alerta para os riscos de fragmentação das políticas públicas e para a necessidade de harmonizar as ações locais com os princípios constitucionais. No caso específico do funk, o debate transcende o âmbito jurídico, tocando em questões culturais e sociais que refletem a diversidade e os desafios de uma sociedade plural.

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Dia da Consciência Negra: o que pensam as militantes do movimento negro 

Voz da consciência negra, a jornalista, professora de capoeira e militante contra o machismo nas escolas de samba, Lyllian Bragança, defende fortalecimento da identidade afro-brasileira na luta por igualdade e justiça.  

Em entrevista exclusiva à TVT News, a jornalista reflete sobre desafios das mulheres negras no Brasil e a necessidade de engajamento constante para futuro mais igualitário. 

  • Vídeo: veja a entrevista completa com Lyllian Bragança

Lyllian Bragança conversou com a reportagem da TVT News sobre a importância do Dia da Consciência Negra e quais são os caminhos para ampliar a visibilidade da data e aumentar o debate sobre as conquistas e a luta histórica da população negra no Brasil.  

Durante um bate-papo profundo e inspirador, Lyllian destacou a relevância do 20 de novembro e enfatizou o papel essencial das mulheres negras na luta por igualdade e justiça. Para ela, a consciência negra não deve ser limitada ao 20 de novembro, mas fazer parte de um movimento contínuo de educação, resistência e fortalecimento da identidade afro-brasileira. 

Consciência negra e a história silenciada 

Lyllian disse acreditar que a verdadeira conscientização negra precisa passar por um debate profundo sobre a branquitude e o projeto de poder estabelecido no Brasil, onde a história do povo negro foi, e ainda é, apagada e silenciada.  

 

“A nossa história não foi contada como deveria. A Lei 10.639, que propõe a inclusão da história da África e dos negros no currículo escolar, ainda é pouco trabalhada nas escolas. Existem iniciativas, mas é um caminho longo para que todos entendam a importância de resgatar nossa verdadeira história”, afirmou.

Ela destacou que a própria compreensão sobre a identidade negra começou na escola de samba, aos 17 anos, um lugar, segundo ela, no qual se reconectou com suas raízes. “Foi no samba, no Candomblé e na capoeira que pude entender quem eu sou e o que significa ser uma mulher preta no Brasil”, revela Lyllian. 

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No samba, na capoeira e no Candomblé eu descobri quem sou. Foto: Silmara Luz

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