Panamá desmente livre acesso dos EUA ao canal

Departamento de Estado afirmou que embarcações do governo dos EUA não pagariam mais taxas no Canal do Panamá
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Presidente do Panamá condenou relações bilaterais "com base em mentiras e falsidades". Foto: Unsplash

O governo panamenho e a Autoridade do Canal do Panamá (ACP) negaram nesta quinta-feira (6) que as embarcações do governo norte-americano poderão atravessar o canal sem pagar taxas, desmentindo informação veiculada pelo Departamento de Estado do governo Donald Trump.

O presidente do Panamá, José Raúl Mulino, classificou a afirmação dos norte-americanos como “intolerável” e uma “falsidade absoluta”.

“Tenho que rejeitar essa declaração do Departamento de Estado porque ela se baseia em uma falsidade. (…) Isso é intolerável, simplesmente intolerável. E hoje o Panamá está expressando ao mundo a minha rejeição absoluta de continuarmos a explorar as relações bilaterais com base em mentiras e falsidades”, afirmou o presidente panamenho.

Já a ACP, agência reguladora do empreendimento, disse em comunicado que não havia feito nenhuma alteração nas taxas ou direitos para atravessar o canal.

“Com total responsabilidade, a Autoridade do Canal do Panamá, como indicou, está disposta a estabelecer diálogo com autoridades relevantes dos EUA em relação ao trânsito de navios de guerra provenientes do referido país”, respondeu a agência.

Nesta quarta-feira (5) o governo dos EUA disse que o Panamá teria concordado em não cobrar de seus navios pelo trânsito no Canal do Panamá, economizando assim “milhões de dólares por ano”.

O anúncio foi feito após a visita do secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, ao país centro-americano, em meio à pressão do presidente Donald Trump para recuperar o controle da hidrovia.

“O governo do Panamá concordou em não cobrar mais tarifas dos navios do governo dos EUA que transitam pelo Canal do Panamá, economizando milhões de dólares por ano”, disse o Departamento de Estado dos EUA em uma mensagem publicada na rede social X.

No mês passado, Trump acusou o Panamá de cobrar taxas abusivas para usar a passagem comercial, uma das mais movimentadas do mundo. Ele acusa ainda a China de controlar a hidrovia. Nesse sentido, ameaçou tomar o controle do canal, caso tais impasses não fossem resolvidos.

“Se os princípios, tanto morais quanto legais, desse gesto magnânimo de doação não forem seguidos, exigiremos que o Canal do Panamá nos seja devolvido, na íntegra e sem questionamentos”, disse Trump no mês passado.

O que está por trás da investida de Trump ao Canal do Panamá

Desde que foi eleito nos Estados Unidos em 2024, em meio às comemorações dos 35 anos da última invasão norte-americana ao Panamá, Donald Trump voltou a desrespeitar a soberania do país latino com declarações sobre o controle do Canal do Panamá. A passagem marítima liga os oceanos Pacífico e Atlântico pelo meio das Américas. Trata-se de um local estratégico e essencial para o comércio da global.

Segundo Olmedo Beluche, analista político e social panamenho, tais ameaças são parte de uma tentativa de Trump de atualizar a velha Doutrina Monroe para o século XXI. Mas quais seriam os motivos por trás dessa postura? A TVT News conversou com o professor titular de Sociologia da Universidade do Panamá para entender o caso.

“Acredito que este seja o final do processo de globalização neoliberal que vivemos desde os anos 1980 até o presente. Estamos em uma situação que lembra muito o que foi a crise das décadas de 1930, pré Segunda Guerra Mundial (…) Se promoverem uma intervenção militar no Panamá, o Panamá voltaria a ser obrigada a fazer uma luta que fez contra a presença de tropas americanas na década de 1970 e anteriormente”, afirma.

Trump tem utilizado uma série de argumentos para justificar suas pretensões sobre o Canal do Panamá, desde acusações de tarifas abusivas cobradas aos navios norte-americanos até o suposto controle chinês sobre o canal. Os Estados Unidos financiaram e participaram da construção do canal entre 1904 e 1914. Então, o controlaram por um século. Seu controle envolvia presença militar no país latino e ameaças à soberania local. Com a China, a história não é a mesma.

“O Canal do Panamá está sendo operado pela China. Nós não o entregamos à China”, afirmou Trump, em declaração recente. A retórica de Trump reflete não apenas suas políticas protecionistas, mas também a preocupação crescente com a influência chinesa na América Latina. Um ponto central da política de Trump é de ameaçar o gigante asiático com palavras duras e possibilidade da criação de taxas abusivas para tentar prejudicar a economia chinesa.

Desde 2017, quando Panamá estabeleceu relações diplomáticas com a China, o país asiático se tornou um dos principais parceiros comerciais panamenhos. Empresas chinesas administram portos adjacentes ao canal e participam de obras de infraestrutura como a construção do quarto ponte sobre o canal. Apesar disso, segundo Beluche, “o Panamá continua sendo um títere do imperialismo norte-americano, o que se reflete no alinhamento do país com Washington na ONU e na OEA.”

*Com colaboração de Gabriel Valery

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